Título: Gasto público vai ajudar menos o PIB
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 08/02/2011, Brasil, p. A3
Os gastos não financeiros do governo federal e dos Estados e municípios devem mostrar desaceleração significativa neste ano, depois de terem aumentado, em seu conjunto, 8,5% acima da inflação em 2010. No primeiro ano de mandato da presidente Dilma Rousseff e dos governadores, o total dessas despesas vai avançar 3,7% em termos reais, segundo estimativas do economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero.
Para ele, os gastos não financeiros do governo federal vão crescer neste ano 3%, descontada a inflação, num cenário em que a União se empenha para fazer uma economia mais expressiva para os juros da dívida (o superávit primário), sem recorrer a artifícios contábeis. É um ritmo três vezes mais lento que a alta de 9,4% em termos reais de 2010. No caso de Estados e municípios, Montero acredita em aumento de 5%, menos que os 7,4% do ano passado. Governadores que assumem o posto também tendem a fazer um pouco mais de caixa no primeiro ano de mandato.
Montero diz que a política fiscal em 2011 será contracionista do ponto de vista da atividade econômica, uma vez que o conjunto das despesas das três esferas de governo deve crescer a um ritmo inferior ao do PIB, que ele estima em 4,5%, enquanto a arrecadação deve ter crescimento real superior a esse. "Isso faz diferença, porque são gastos equivalentes a quase um terço da economia", afirma Montero. As despesas não financeiras da União em 2010 ficaram próximas a 19% do PIB, enquanto as de Estados e municípios são de aproximadamente 12% do PIB.
Com gastos que avançam menos que o PIB, a política fiscal ajuda a moderar o crescimento da demanda, num momento em que o Banco Central (BC) promove um ciclo de alta dos juros. A questão, segundo Montero, é que mesmo essa desaceleração de gastos das três esferas de governo não deve ser suficiente para o cumprimento da meta de superávit primário de 3% do PIB, com a qual o BC trabalha em seus cenários de inflação.
Montero acredita que o bloqueio de gastos deve ficar na casa de R$ 40 bilhões, o que deve garantir um superávit de 2,5% do PIB. É razoavelmente acima do 1,75% do PIB alcançado em 2010 - numa conta que exclui artifícios contábeis como o impacto da operação de capitalização da Petrobras sobre as receitas do governo -, mas não a ponto de elevar a 3% do PIB a economia para pagar juros. Para isso, o corte teria de ser de R$ 60 bilhões, número que Montero não considera possível de ser atingido.
O economista Felipe Salto, da Tendências Consultoria Integrada, também acha que a política fiscal deve ser contracionista - ele espera crescimento real de 4,2% das despesas da União, um pouco abaixo dos 4,4% projetados para o PIB. "Estamos no momento certo, na hora certa, com os incentivos mais do que evidentes para que se faça ajuste fiscal", afirma ele.
No primeiro ano de governo, depois de uma forte expansão de gastos, é natural uma moderação das despesas. "A única dúvida é o tamanho do ajuste, e essa é uma dúvida crucial, pois fará toda a diferença do ponto de vista da consolidação de uma estratégia que permita restabelecer a credibilidade fiscal perdida." Salto aposta hoje num superávit primário de 2,6% do PIB, sem malabarismos contábeis.
Montero estima uma desaceleração menos intensa dos gastos de Estados e municípios do que da União por acreditar numa expansão mais forte das receitas dos governos regionais. Segundo ele, em 2010, houve frustração nas transferências a Estados e municípios por conta do desempenho mais fraco de tributos como o Imposto de Renda (IR), em parte devido à compensação de perdas ocorridas no ano anterior.
Para 2011, ele trabalha com uma recuperação dessas receitas, justamente as que a União têm que compartilhar com Estados e municípios. Desse modo, haverá um reforço de caixa um pouco mais forte dos governos regionais. Isso dá margem um pouco maior para os gastos, embora o fato de ser o primeiro ano de mandato dos governadores deva levar a alguma moderação fiscal.
Montero calcula a variação das despesas não financeiras dos Estados e municípios com base na arrecadação e no superávit primário dessas esferas de governo. Por diferença, estima a variação das despesas, informação não publicada pelo Banco Central.
O economista Cristiano Oliveira, do Banco J. Safra, tem previsões um pouco mais cautelosas para o comportamento dos gastos do governo federal do que Montero e Salto. Para ele, as despesas não financeiras da União vão crescer 7% acima da inflação, menos que em 2010, mas acima da expansão projetada para o PIB, de 4%. "Acho que a política fiscal será menos expansionista em 2011, mas não contracionista". De qualquer modo, diz ele, os gastos públicos vão impulsionar menos a demanda do que nos dois anos anteriores, quando as despesas não financeiras da União avançaram mais de 9% acima da inflação.