Título: Militares dos EUA podem ter papel importante
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 08/02/2011, Internacional, p. A11

O laço mais forte entre os EUA e o Egito é entre as forças armadas dos dois países, um relacionamento que pode ser fundamental para um novo governo no Cairo.

Desde que a crise no Egito começou, uma das mais frequentes e diretas linhas de comunicação entre Washington e Cairo aconteceu nas quatro conversas do secretário de Defesa dos EUA, Robert Gates, com seu colega egípcio, o marechal Mohamed Tantawi.

Uma autoridade americana disse que Gates pode estar na melhor posição para pedir ao Exército egípcio que derrube Hosni Mubarak do poder, se for necessário. Como chefe do Pentágono e conselheiro de confiança do presidente Barack Obama, suas palavras são influentes entre militares egípcios. E, por ser civil, não está amarrado às restrições de ficar fora da política atribuídas a autoridades uniformizadas.

As conversas entre os dois têm sido mantidas sob sete chaves. Antes da crise, Gates e Tantawi não eram próximos, mas ambos haviam por muito tempo servido em postos importantes de segurança nacional. Em 1991, na época da Guerra do Golfo, Gates era vice-conselheiro nacional de segurança dos EUA e Tantawi se tornou o ministro da Defesa do Egito.

Por ora, as Forças Armadas não tomaram ações decisivas para manter Mubarak no poder nem para dar apoio aos protestos. Um experiente diplomata ocidental disse que essa ambiguidade está causando "sinais de preocupação" dentro das Forças Armadas de que sua reputação perante o público possa ser maculada.

Oficiais na ativa e de reserva observam que as Forças Armadas egípcias preservaram sua reputação em grande parte porque sempre ficaram fora da política interna. Alguns de seus líderes repudiam a ideia de sair disso, disseram os oficiais.

Os EUA têm razoável influência sobre as forças armadas egípcias, principalmente através de uma ajuda anual de US$ 1,3 bilhão, que é usada para comprar armas americanas. O almirante Michael Mullen, chefe do Estado Maior das Forças Armadas dos EUA, observou semana passada que militares americanos e egípcios passaram mais de 30 anos trabalhando e treinando juntos e estabeleceram um "forte" relacionamento.

Mullen já falou duas vezes com seu equivalente, o general de divisão Sami Enan, e elogiou o profissionalismo das forças armadas egípcias. Autoridades americanas disseram que o elogio de Mullen, combinado com insinuações da Casa Branca de que a ajuda militar poderia ser colocada em reavaliação, teve o objetivo de pressionar os militares egípcios a não reprimirem os protestos.

Na sua maioria, os oficiais americanos não têm relacionamento próximo com os egípcios da mesma maneira que têm com colegas dos países europeus aliados, disse o almirante da reserva William Fallon, ex-chefe do Comando Central das Forças Armadas. "Não é essa imagem que algumas pessoas têm, de que como damos a eles uns bilhões de dólares em equipamentos eles vão fazer tudo o que queremos porque podemos cortar a ajuda", disse Fallon.

Há dúvidas quanto a Tantawi. Em mensagens do Departamento de Estado dos EUA publicadas pelo site WikiLeaks, Tantawi foi retratado como sendo muito leal a Mubarak e um líder fraco, sob cujo comando as forças armadas se deterioraram.

Especialistas de fora que aconselham o governo dizem que Mubarak só deve aceitar renunciar quando seus conselheiros militares e de segurança insistirem que o faça.

Tantawi foi à praça Tahrir sexta-feira para inspecionar suas forças, algo que muitos viram como uma tentativa de associar os militares aos manifestantes antigoverno. Sua neutralidade e a das Forças Armadas pode ser testada nos próximos dias, particularmente se os manifestantes decidirem marchar para o palácio presidencial em Heliópolis, um bairro na periferia do Cairo onde há várias bases militares. (Colaborou Charles Levinson)