Título: Fux questiona neutralidade da Justiça e é aprovado para o STF por 70 votos a 2
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 10/02/2011, Política, p. A9

O Senado aprovou ontem, por 70 votos contra 2, a nomeação do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luiz Fux para ocupar a cadeira vaga no Supremo Tribunal (STF). Antes de proclamado o resultado, ele foi sabatinado pelos senadores da Comissão de Constituição e Justiça da Casa. Ali, defendeu a judicialização da política e o ativismo judicial, mas evitou tratar de temas polêmicos como o mensalão, a extradição de Cesare Battisti e a Lei Ficha Limpa. "Há questões que, na verdade, não são de judicialização da política. São de lesões a direitos que o parlamentar tem direito subjetivo a questionar", disse, referindo-se à discussão de a quem pertence o mandato dos deputados: se às coligações ou aos partidos.

Questionado sobre o ativismo judicial e a judicialização de políticas, ele disse que há casos "belíssimos" no mundo nesse sentido. "Na África do Sul, o Judiciário determinou que se construíssem casas para pessoas que não tinham habitação. Temos casos parecidos na Venezuela, na Índia". Segundo ele, "isso passa pelo balanceamento de dois valores: o mínimo existencial para o cidadão viver e a reserva do possível de recursos do Estado para essas políticas". Defendeu ainda que em alguns seja dado fim do "mito da neutralidade do juiz".

"O princípio estabelece que o juiz deve dar tratamento equânime às partes. A população carente precisa de um tratamento diferente", afirmou.

Em face do sentimento unânime favorável ao seu nome, tanto na base aliada quanto na oposição, os senadores tentaram agilizar a aprovação. Pela manhã, instalaram rapidamente a CCJ, agora dirigida pelos novos senadores Eunício Oliveira (presidente) e José Pimentel (vice-presidente), do PMDB e do PT, respectivamente, ambos do Ceará, eleitos ontem. E marcaram a sabatina para a tarde. Iniciada a sessão na comissão, tentaram evitar a realização da sabatina, de modo que o plenário da Casa pudesse aprovar em definitivo seu nome.

Houve, porém, oposição quanto a este procedimento, principalmente dos senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Pedro Taques (PDT-MT), que alegaram a inconstitucionalidade da medida. Diante da contestação, o presidente da CCJ recuou e deu prosseguimento à sessão de sabatina.

Foi aí que o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) questionou o sabatinado sobre temas polêmicos do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva: mensalão e extradição de Cesare Battisti, por exemplo. Fux disse que não poderia responder a perguntas sobre processos que estão em andamento. "Não posso me pronunciar sobre determinados casos "sub judice". São respostas que o Supremo dará no momento oportuno", disse, completando que "me preparei para todas as questões, inclusive para dizer aquelas que não posso dizer minha opinião". Após quase quatro horas de sabatina, ele foi aprovado por todos os 23 senadores da CCJ.

Fux tem 58 anos e é carioca. Neto de romenos, seus avós imigraram ao Brasil fugindo da perseguição nazista na Europa. O ministro estudou no tradicional Colégio Dom Pedro II, e em 1972 ingressou no curso de direito da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, onde se formou em 1976. No ano seguinte, começou a lecionar na universidade, onde fez carreira acadêmica. Atualmente, é livre-docente da cadeira de direito processual civil. Aos 27 anos, passou em primeiro lugar no concurso da magistratura no Rio, onde também fez longa carreira, passando pelo Tribunal de Alçada e pelo Tribunal de Justiça. Chegou ao Superior Tribunal de Justiça em 2001, indicado pelo então presidente da República Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Isso ajuda a explicar o consenso em torno do seu nome, já que foi trazido á capital federal por FHC e nomeado ao STF pela petista Dilma Rousseff.

Além disso, em Brasília coordenou a equipe de juristas que elaborou o novo Código de Processo Civil, aprovado em dezembro pelo Senado. O projeto, que aguarda aprovação na Câmara dos Deputados, deve reduzir em pelo menos 50% o tempo de duração de um processo. Nos chamados contenciosos "de massa", esse índice pode chegar a 70%. O caminho para isso foi a simplificação de procedimentos processuais e a redução dos recursos.

Fux também é conhecido por seus talentos fora da magistratura. É faixa preta em jiu-jitsu e toca guitarra. Escreveu mais de 20 livros e, há quatro anos, ganhou o principal prêmio da literatura brasileira, o Jabuti, com o livro "Processo e Constituição - Estudos em Homenagem ao Professor José Carlos Barbosa Moreira". No Supremo, ele ocupará a vaga deixada pelo ministro Eros Grau em agosto de 2010.