Título: O retorno do doce rebelde
Autor: Pariz, Tiago
Fonte: Correio Braziliense, 07/08/2010, Política, p. 2

Militante histórico da esquerda e distante dos esquemas de marketing dos rivais na corrida presidencial, Plínio Sampaio, de 80 anos, viveu dia de superstar após o debate

No primeiro intervalo do debate da TV Band, os três principais candidatos à Presidência da República, Dilma Rousseff (PT), Marina Silva (PV) e José Serra (PSDB), arrastaram um batalhão de assessores e colegas de partido para o palco do encontro. O exército ajeitava gravata, mexia nos cabelos, retocava maquiagens, repassava estratégias ao pé do ouvido, entregava documentos. Enquanto isso, Plínio Sampaio (PSOL) tomava café. Duas horas de embate televisivo entre os presidenciáveis tiraram da coxia um personagem na disputa pelo Palácio do Planalto. Exatamente o único a não chegar ao encontro em helicóptero próprio ou levar uma tropa de assessores para uma rodada de perguntas e respostas. A campanha, para a gente, começou na quinta-feira, comemora Plínio.

Amigo de duas eminências pardas desta campanha, o presidente Luiz Inácio da Silva e o ex, Fernando Henrique Cardoso, o socialista já acordou ontem colhendo os frutos da exposição no debate. Foi acordado às 7h por uma rádio do Amapá. Até as 9h, o celular havia tocado mais duas vezes, conversas que se somaram a mais de um dezena de entrevistas concedidas ao longo do dia. Ganhou 4,5 mil seguidores no Twitter. Chegou a ser o nome mais citado na rede social. O caminho até o debate, contudo, teve dois momentos-chave. O primeiro foi a luta contra o câncer no estômago, travada entre 2000 e 2007, e que custou a retirada de dois terços do órgão. Hoje, a única restrição da doença é o repouso necessário depois do almoço. O segundo momento foi o enfrentamento à indisposição de setores do próprio partido, que não escondiam o desejo de embarcar na candidatura de Marina Silva.

Afastado de eleições desde 1990 quando perdeu o pleito para governador de São Paulo pelo PT , promotor público aposentado, Plínio se saiu bem no debate exatamente por explorar o excesso de marketing dos concorrentes. Com ironia fina e tiradas ácidas, o candidato colecionou frases de efeito. Ficou claro aqui que tudo é uma Pollyanna. O bem deve ser feito e o mal, evitado. Isso não quer dizer nada. Outra: Imagino que vocês (eleitores) estão surpresos, né? Achavam que havia só três. Apareceu mais um. E ainda: Agora vocês sabem por que o Serra é chamado de hipocondríaco: só fala de saúde.

Obsessão Exilado político durante os anos de chumbo, Plínio tem fixação por reforma agrária tema que abordou na primeira fala durante o debate. Antes de formular as propostas de Lula para a área durante as eleições de 2002, tinha feito o mesmo para o ex-presidente João Goulart, na década de 1960. A verdade é que a esquerda não tinha candidato para outubro. Serra, Dilma e Marina não têm posicionamento ideológico, só marketing. Quando minha presença foi confirmada, dezenas de entidades me ligaram sugerindo perguntas, pedindo para abordar temas específicos, revela.

Para os colegas de partido ele teve a companhia do deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) no debate , a participação destacada não surpreende. Na intimidade, é conhecido pelo humor refinado e pela ironia dosada. Ganhou de Chico Alencar (PSOL-RJ) a alcunha de doce rebelde. O apelido se justifica em várias situações, como na plenária que confirmou sua escolha como candidato à Presidência, em junho. Alencar decidiu elogiar o companheiro, de 80 anos, e enalteceu sua disposição em disputar uma eleição difícil, já em idade avançada. Pelos serviços já prestados, o senhor tinha todo o direito de se dedicar aos filhos, netos, flores e memória, filosofou. Antes dos aplausos, Plínio não perdeu a deixa: Farei isso quando ficar velho, Chico.

Imagino que vocês (eleitores) estão surpresos, né? Achavam que havia só três. Apareceu mais um

Uma das frases de Plínio que ganharam o público durante o debate da Band

Ficou claro aqui que tudo é uma Pollyanna. O bem deve ser feito e o mal, evitado