Título: Consenso racha e foco está no Copom
Autor: Campos, Eduardo
Fonte: Valor Econômico, 28/02/2011, Finanças, p. C2

Com o fim do consenso dentro do mercado, a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) vira destaque na agenda da semana, que também reserva a produção industrial, o Produto Interno Bruto (PIB) de 2010 e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechado para o mês de fevereiro.

No fim da semana passada, a curva de juros futuros passou por significativa mudança, com a divulgação de informações não oficiais dando conta do que pensam "governo" e "economistas do governo" sobre qual deveria ser a postura do Banco Central (BC) no seu segundo encontro do ano.

O efeito prático dessa "batalha" de informações foi fim de um consenso de que o colegiado seguiria ajustando a Selic em passos de meio ponto percentual.

A curva futura ganhou prêmio conforme mostram os gráficos abaixo e fechou a semana dando peso praticamente igual tanto para o meio quanto para o ajuste de 0,75 ponto percentual. Vale lembrar que a Selic está em 11,25% ao ano.

Semana também reserva PIB de 2010 e IPCA de fevereiro

Sem entrar no mérito de que tal mudança de percepção do mercado faltando poucos dias para a reunião denota problemas de comunicação e gerenciamento de expectativas por parte da autoridade monetária, cada lado tem bons argumentos para defender a sua posição. Entre os partidários do meio ponto, o próprio quesito comunicação joga contra decisão diferente, pois o BC não sinalizou mudança de postura.

Fora isso, não houve alteração de cenário entre uma reunião e outra que justificasse um aumento no ritmo de ajuste. Para esse grupo, a evolução de cenário, de fato, dá suporte ao gradualismo, pois os últimos indicadores de atividade apresentam arrefecimento e as medidas tomadas para conter o crédito mostram algum efeito.

"A elevação de juros que o Copom deverá promover na próxima semana, de 50 pontos-base., faz parte de uma ação coordenada de política econômica - que inclui uma forte redução no crescimento das despesas públicas e medidas macroprudenciais - para trazer a inflação para o centro da meta ao longo de 2012", disse a equipe do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicas do Bradesco, liderada pelo diretor Octavio de Barros.

Para a economista-chefe da Icap Brasil, Inês Filipa, a situação do BC não é nada confortável, e conta com um agravante que é a crise internacional.

Na visão da economista, ancorar as expectativas no momento não é viável, mas com a divulgação futura de indicadores correntes de inflação menos pressionados, as expectativas podem ser revisadas.

"A condução da política monetária deve ser realizada com cautela, focando a convergência da inflação em 2012, mas com um prazo de ação maior, permitindo assim ao BC avaliar melhor o impacto da alta dos juros desde o ano passado", notou Inês, indicando que a alta de 0,75 ponto é factível, mas que mantém sua visão de meio ponto de ajuste.

Quem defende o gradualismo, olha a crise da no Oriente Médio e norte da África e seu impacto sobre o petróleo como um fator de risco ao crescimento mundial, mais um ponto a favorecer uma ação cautelosa da autoridade monetária.

Já os partidários de um ajuste de 0,75 ponto não enxergam o cenário dessa mesma forma. Os argumentos apresentados sempre giram em torno da inflação e da forte deterioração de expectativas.

Esse grupo também vê o arrefecimento nos dados de atividade como algo incipiente, ou seja, há chance de repique no varejo, indústria e mesmo na concessão de crédito.

Mas, conforme lembrou o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, o efeito prático entre uma alta de 0,5 ponto ou 0,75 ponto não é muito diferente. A questão, como sempre, é de sinalização.

Para Agostini, que defende o ajuste maior na Selic, a credibilidade do regime de metas recai sobre como a autoridade monetária consegue gerenciar as expectativas de inflação. E os dados mostram uma desancoragem nas tanto nas previsões de curto e médio prazos como nas de longo prazo.

Um gestor de renda fixa que preferiu não se identificar disse que, se o BC não mudar de ideia agora, apenas empurra essa discussão para a reunião de abril. Na visão desse especialista, o BC tem que escolher de uma vez por todas entre inflação e crescimento. Não dá mais para fazer um "pouso suave" da economia, ou seja, se o avanço do PIB ficar entre 4% e 5% a inflação não voltará a orbitar o centro da meta.

O gestor lembra que a inflação é um grande resumo das inúmeras transações que ocorrem ao longo de toda a sociedade. "A inflação é o principal mecanismo de ajuste da economia e o BC parece colocar essa informação em segundo plano", conclui.

Eduardo Campos é repórter

E-mail eduardo.campos@valor.com.br