Título: Potências contestam Japão e alertam para desastre nuclear
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Fonte: Valor Econômico, 17/03/2011, Internacional, p. A12

Agências internacionais

Analistas e autoridades das potências nucleares e da ONU acham que a situação na central nuclear de Fukushima, no Japão, está fora de controle e que eventos catastróficos no país não podem ser descartados. Essa avaliação contrasta com um tom moderado adotado, pelo menos publicamente, pelas autoridades japonesas.

Guenther Oettinger, chefe da comissão de Energia da União Europeia (UE), disse que "a unidade está efetivamente fora de controle". Oettinger, que falava a uma comissão do Parlamento Europeu afirmou que "nas próximas horas podem ocorrer mais eventos catastróficos que poderão colocar em risco a vida de pessoas na ilha". Ele afirmou ainda que as declarações da operadora da unidade afetada e do governo do Japão começam a divergir. "Estamos falando de um "apocalipse" e eu acho que essa palavra é particularmente bem escolhida."

"Acreditamos que há níveis de radiação extremamente altos, o que poderia prejudicar a capacidade de tomar medidas corretivas", disse Gregory Jaczko, presidente da agência de regulação nuclear dos EUA, em depoimento ao Congresso americano.

"A situação pode se aproximar da de Tchernobil [usina russa que registrou o pior desastre nuclear da história, em 1986]", disse Victor Gilinsky, ex-diretor da agência nuclear americana.

"Infelizmente, os seis reatores [da central] correm o risco [de derreter]", disse Sergei Kiriyenko, diretor da agência nuclear da Rússia.

Para o diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA, o órgão fiscalizador nuclear da ONU), Yukiya Amano, a situação da usina nuclear danificada é "muito séria". Ele disse que se prepara para viajar ao país para avaliar a situação.

Em um sinal de desespero, a polícia japonesa usou jatos d"água, normalmente empregados contra motins e manifestações, para tentar resfriar o combustível nuclear em um dos reatores. Helicópteros foram deslocados também para despejar água sobre o reator.

Logo no início do dia, outro incêndio atingiu a usina de Fukushima, danificada pelo terremoto de sexta-feira, e que nas últimas horas emitiu níveis baixos de radiação para Tóquio, causando medo na capital e alerta na comunidade internacional.

O governo do Japão disse que os níveis de radiação fora do terreno da usina permanecem estáveis, mas, em um sinal de estar sobrecarregado, apelou às empresas privadas para ajudarem a entregar suprimentos às dezenas de milhares de pessoas que foram retiradas do entorno do complexo.

"As pessoas não estariam em perigo imediato se saíssem de casa com esses níveis. Quero que as pessoas entendam isso", disse o chefe de gabinete do governo, Yukio Edano, referindo-se à população que vive além da zona de exclusão de 30 km em torno da usina. No interior desse raio, cerca de 140 mil moradores foram orientados a ficar em casa. O Pentágono mandou militares americanos ficarem a 80 km da usina.

Os trabalhadores estão tentando retirar destroços e construir uma estrada para que os carros de bombeiros possam chegar ao reator número 4 do complexo de Daiichi, em Fukushima, 240 quilômetros ao norte de Tóquio.

Na província de Ibaraki, perto de Fukushima, a radiação registada ontem rondava os 5 microsievert (msv) por hora, nível cem vezes superior ao normal. Segundo a AIEA, uma pessoa é exposta normalmente a uma radiação da natureza de cerca de 2,4 msv por ano.

Em Tóquio, os níveis subiram 20 vezes acima do habitual e foram detectadas pequenas quantidades de substâncias radioativas perigosas, como césio.

"Isso tudo é um grande pesadelo em câmera lenta", disse o físico Thomas Neff, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês).