Título: Com visita de Obama, país quer se tornar ator global
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 15/03/2011, Brasil, p. A4

A confirmação do Brasil como "ator global", parceiro dos Estados Unidos em nível de igualdade com outros países desenvolvidos é o principal resultado esperado pelo governo brasileiro da visita do presidente americano, Barack Obama, neste fim de semana. Brasil e EUA discutem ainda os quase 20 acordos e memorandos a serem assinados durante a visita, que poderá trazer o esperado apoio dos EUA a um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Entre os acordos negociados, poderão sair novidades importantes na área de defesa e de ciência e tecnologia.

Se as análises das áreas jurídicas dos governos não afetarem as intenções dos negociadores, o encontro entre Obama e a presidente Dilma Rousseff deve resultar num importante acordo de cooperação na área de defesa, com colaboração em inspeções portuárias contra terrorismo e tráfico, entre outras atividades.

Também está em fase final a redação de um acordo para atuação conjunta entre a Agência Espacial Brasileira e a Nasa, que pode resultar em um projeto comum de financiamento e desenvolvimento no setor de satélites.

Dilma e Obama devem, ainda, confirmar o acordo de céus abertos, que eliminará restrições para operação de companhias brasileiras e americanas nos respectivos países. Dos cerca de 20 acordos em discussão, apenas um, porém, já havia sido fechado ontem entre as duas diplomacias: o acordo de cooperação em eventos esportivos, que deve dar segurança jurídica a ações conjuntas, financiamento e investimentos americanos em eventos como a Copa do Mundo e a Olimpíada. Há grande interesse nos dois países em aproveitar a experiência dos EUA em segurança para esse tipo de eventos.

O governo brasileiro, que, até semanas atrás, baixava as expectativas em relação às manifestações de Obama sobre a reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, adotou outro tom após a visita do ministro de Relações Exteriores, Antônio Patriota, a Washington, na semana que antecedeu o Carnaval.

Em conversa com a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, Patriota ouviu elogios à ação do Brasil nas tropas de paz da ONU no Haiti e na condução, como membro não permanente, das discussões recentes do Conselho de Segurança. Hillary tratou o Brasil como "parceiro estratégico global" dos EUA.

Não escapou à diplomacia brasileira o uso do termo "global". Há sinais de que conversas entre o Executivo e o Congresso americano podem resultar em uma manifestação mais firme de Obama em relação aos pleitos brasileiros de assento permanente no Conselho de Segurança, que tem papel fundamental nas intervenções das Nações Unidas. Obama, ao visitar a Índia, anunciou apoio explícito às pretensões do país ao conselho, apesar do histórico indiano de recusa aos tratados de não proliferação nuclear e de acenos recentes ao Irã.

Obama e Dilma poderão, ainda, anunciar o início de negociações para redução, e até eliminação, das exigências de vistos para brasileiros em viagem aos EUA - o tema está entre os acordos em discussão. Também está previsto o anúncio de doações de instituições, como a Fundação Fullbright, para aumentar o intercâmbio em ciência e tecnologia (um dos principais temas da visita, do qual se esperam anúncios de maior peso).

Na área comercial e econômica, sem possibilidade de anúncio de medidas para reduzir tarifas ou sobretaxas existentes - como as aplicadas pelos EUA sobre o etanol e o suco de laranja brasileiros-, os maiores avanços serão nas iniciativas para aproximar as burocracias dos dois países e remover obstáculos técnicos e sanitários às trocas comerciais, além de acordo para simplificar a concessão de patentes.

Há forte expectativa que será possível assinar o tratado de cooperação econômica e comercial para facilitar a discussão e eliminação de barreiras técnicas, administrativas e sanitárias à entrada de mercadorias. O acordo de patentes permitiria ao Instituto Nacional de Patentes brasileiro (Inpi) aderir à "via rápida" de processamento de patentes americanas, pela qual aspectos dos pedidos de patentes recusados nos EUA poderão ser automaticamente descartados nos processos verificados no Brasil, por exemplo. Há previsão de acordos de reconhecimento mútuo de certificados também pelos órgãos de normas técnicas (Inmetro, no Brasil), nos dois governos.

A agenda de viagem de Obama, uma visita de Estado, nível mais alto na diplomacia para um encontro bilateral de mandatários, tem sofrido mudanças de última hora. A chegada do presidente americano, antes prevista para sexta-feira, agora deve ocorrer sábado de manhã. Ele terá encontros com Dilma, com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Cezar Peluso, e com o presidente do Congresso, José Sarney.

Além de uma reunião com as equipes dos dois governos, Dilma e Obama participarão do fórum de altos executivos dos dois países, terão um almoço com participação de cerca de 200 pessoas, no Palácio do Itamaraty, e devem encerrar uma reunião promovida pela Câmara de Comércio Americana e pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), com empresários que discutirão oportunidades de negócio nas área de energia e de outros setores de infraestrutura, especialmente aqueles ligados à Copa do Mundo de 2014 e à Olimpíada de 2016.

Energia e infraestrutura terão lugar importante no comunicado conjunto a ser divulgado pelos dois presidentes, que também dedicarão espaço generoso à defesa dos direitos humanos - tema que deve inspirar outro acordo, para troca de informações na elaboração de resoluções na área.