Título: Mantega crava PIB de 6,5%
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 10/08/2010, Economia, p. 15

CONJUNTURA

Fazenda aposta em números diferentes do mercado, com terceiro trimestre menos aquecido e IPCA mais próximo do centro da meta

Depois de sustentar praticamente sozinho durante o primeiro semestre a avaliação de que não havia superaquecimento na economia brasileira e de ver confirmadas suas projeções de arrefecimento da atividade, o Ministério da Fazenda deve reforçar a previsão de que o crescimento do país não chegará aos 7%, conforme estima a maior parte do mercado e o Banco Central. A informação consta da nova edição do Boletim Economia Brasileira em Perspectiva, que deve ser publicado hoje e promete aumentar a visibilidade das previsões da equipe de Guido Mantega. Em sua sétima edição, o documento trará a expectativa de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano de 6,5%, baseada na projeção de um terceiro trimestre menos aquecido.

O relatório também deve sugerir que a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) pode ficar abaixo de 5%, percentual mais próximo do centro da meta de 4,5%, estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

A Fazenda não pretende rivalizar com o Banco Central, e apesar do documento servir como contraponto, em parte corrobora previsões da autoridade monetária. Em relação ao crédito, por exemplo, a previsão da equipe de Mantega é de que o crescimento (1)chegue a 20% este ano, impulsionado pela concessão de créditos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e outras instituições públicas. Pela previsão do BC, o crédito deve chegar a representar 48% do PIB e os bancos públicos devem aumentar suas carteiras em 20%, enquanto os privados nacionais devem expandir 24%.

O mercado já começa a rever suas projeções e parte dele tende a acompanhar a previsão da Fazenda de um crescimento abaixo dos 7%. De acordo com o Boletim Focus, divulgado ontem, as 100 instituições consultadas semanalmente pelo BC reduziram a previsão de avanço da economia de 7,2% para 7,1%, depois de quatro semanas de manutenção.

Refazendo as contas Para o economista-chefe do Banco Schahin, Silvio Campos Neto, o ajuste pode ter sido impulsionado pela revisão dos agentes de mercado em relação ao segundo trimestre da economia, mas acredita na possibilidade de o crescimento não chegar aos 7%, em função de um vigor menor da atividade no terceiro trimestre. É um cenário provável. Teremos que crescer até 0,5% no segundo trimestre e valores um pouco acima disso, mas sem chegar a 1%, nos próximos trimestres, avaliou.

O economista projeta crescimento de 6,9% para o ano e estima que o terceiro trimestre será menos atípico do que os anteriores, quando a economia se recuperou de forma espetacular nos três primeiros meses puxada por estímulos fiscais e produtivos e se acomodou violentamente no período seguinte. O terceiro trimestre deve contar uma verdade mais exata para os próximos períodos da economia e também para os anos seguintes, disse.

Desaceleração A avaliação do economista-chefe do banco ABC Brasil, Luis Otávio de Souza Leal, no entanto, é de que atualmente não há dados que indiquem um crescimento mais próximo de 6,5%. Nesse cenário incerto, os números podem me contradizer, mas se você olha hoje para o mercado de trabalho, continua forte, assim como a renda e os volumes de crédito. A inadimplência não aparece. Minha dúvida é de onde viria essa desaceleração, ponderou.

De acordo com o economista, ainda são aguardados para o segundo semestre os dissídios coletivos de categorias numerosas, como os metalúrgicos, os bancários e os comerciários, fator que deve incrementar a produção do fim de ano. Nem do BC agora deve vir um freio tão forte, já que ele mesmo anda sinalizando que pode terminar o ciclo de aumento de juros. De onde viria a força para uma redução tão forte na atividade?, questionou.

Além da projeção para o PIB, o mercado reduziu também, segundo o Focus, a estimativa para o IPCA deste ano de 5,27% para 5,19%, quinta redução seguida da previsão para o indicador.

1 - China crescerá de 10% a 11% no ano A economia da China terá um segundo semestre forte e estável, caminhando para a meta de crescimento em todo o ano de 10% a 11%, disse um importante economista do governo. A previsão de Zhang Yutai, diretor do Centro de Pesquisa Econômica, um instituto do Gabinete, é mais otimista que a de muitos economistas independentes e também de alguns analistas do governo, que estão na faixa de 9% a 10%.

PRÉVIA DO ÍNDICE DOS ALUGUÉIS TRIPLICA O Índice Geral de Preços Mercado (IGP-M) triplicou na primeira prévia de agosto, comparado ao mesmo período de julho. A taxa ficou em 0,42%, ante 0,14%, segundo a Fundação Getulio Vargas (FGV). O IGP-M é usado como referência para o reajuste de contratos de aluguel e de tarifas de energia. Dos três indicadores que compõem a taxa global, apenas o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA), que apura os preços no atacado e é responsável por 60% do IGP-M, subiu e chegou a 0,75%, ante a variação de 0,19% na primeira prévia de julho. Segundo a FGV, o resultado foi influenciado pela alta dos preços do minério de ferro (de -0,63% para 16,92%), da soja em grão (de 1,45% para 6,58%) e do fumo em folha (de 4,78% para 0,06%). O Índice de Preços ao Consumidor (IPC) registrou queda de 0,40%, após a deflação de 0,31% da primeira apuração do mês passado.

Ipea diz que BC errou

Trajetória descendente do índice de inflação e preocupação com o futuro das contas externas. Esses temas constam da análise do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre a economia brasileira na Carta de Conjuntura de junho. Para o coordenador do documento, economista Roberto Messenberg, a inflação para este ano não terá tendência ascendente, devendo ficar entre 4% e 5%, dentro da meta estipulada pelo governo, de 4,5%. Por conta disso, ele considerou precipitada a decisão do Banco Central (BC) de aumentar a taxa básica de juros da economia.

Acho que eles (o BC) erraram lá atrás, quando divulgaram um relatório de inflação que era francamente contrário às atas que vinham emitindo ao longo do ano passado. Isso sancionou as expectativas de alta da inflação na economia e os obrigou a tomar medidas nesse sentido, com uma elevação brutal da taxa de juros, quando, na verdade, o cenário anterior traçado por eles estava mais correto, de que o mercado estava com expectativas exageradas e que haveria uma convergência na frente, afirmou.

Para Messenberg, a maior preocupação no cenário futuro não é o descontrole nas contas públicas, como pregam alguns economistas, pois ele acredita que é necessária a participação efetiva do Estado como indutor da economia, possibilitando, entre outras coisas, destravar os gargalos que prejudicam o crescimento. O economista chamou a atenção para o descompasso na balança internacional, com o descolamento das exportações em relação às importações, principalmente de produtos como bens de consumo.

O sinal amarelo são as taxas de crescimento do deficit comercial, de aumento das importações em relação às exportações. As importações têm se acelerado de maneira contundente. Isso é preocupante, porque pode sinalizar a necessidade crescente de recursos para o fechamento do balanço de pagamentos na economia, quando justamente o investimento direto está escasseando, disse ele.

O economista elogiou a atuação do governo federal durante a crise econômica, por meio do grande aporte de financiamento às empresas via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do apoio ao sistema financeiro por meio do BC.