Título: Santos entra em campo
Autor: Sabadini, Tatiana
Fonte: Correio Braziliense, 09/08/2010, Mundo, p. 14

Nas primeiras horas depois de tomar posse, presidente costura encontro com Chávez para amanhã e anuncia viagemao Brasilem setembro.Às Farc, diz que aceita dialogar, mas exige a libertação dos reféns

No primeiro dia de trabalho como presidente da Colômbia, JuanManuel Santos enfrentou duas questões que devem marcar seu governo: diplomacia e segurança. O mandatário começa a recuperar as boas relações com os vizinhos, especialmente aVenezuela e o Equador, depois da crise herdada de ÁlvaroUribe. Além disso, respondeu com a autoridade de um governante fortalecido ao pedido de diálogo feito pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). A primeira viagem oficial ao exterior está marcada: Santos desembarca no Brasil em 1º de setembro para se encontrarcomo colega Luiz Inácio Lula da Silva. E já amanhã ele deve receber em Bogotá o venezuelano Hugo Chávez, que rompeu relações no fim de julho, depois de ter sido acusado por Uribe de dar abrigo às Farc.

No discurso de posse, o presidente colombiano enfatizou que a palavra guerra não existeemseu dicionário. Umdos meus propósitos será reconstruir as relações comVenezuela e Equador, restabelecer a confiança e privilegiar a diplomacia. Assim como não reconheço os inimigos na política nacional, não faço o mesmo com nenhum governo estrangeiro, afirmou. A reaproximação com a América do Sul éumde seus objetivos, não apenas por causa do aspecto econômico, mas para reforçar o combate às Farc nas fronteiras.

O primeiro passo de reconciliação foi dado ontem, quando a chancelerMaría Ángela Holguín reuniu-se com o colega equatoriano, Ricardo Patiño.

As relações diplomáticas entre os dois países tinham sido rompidas em 2008, depois de uma operação militar que matou o comandante guerrilheiro Raúl Reyes em um acampamento do lado equatoriano da fronteira. O episódio rendeu condenação internacional e um processo na Justiça do Equador contraSantos, queera na época ministro da Defesa da Colômbia.

Para o presidente Lula, que ajudou a facilitar o diálogo entre Bogotá e Caracas, os dois países estão dispostos a resolver a crise rapidamente e restabelecer as relações econômicas e diplomáticas.

Todo mundo quer conversar, até porque todo mundo perdeu com a confusão, com o conflito, com o atrito, disse Lula à rede britânica BBC, depois de assistir à cerimônia de posse. De vez em quando, as pessoas ficam cansadas de brigar. Chávez havia aproveitado seu programa dominical de rádio e televisão, o Alô Presidente, para expressar apoio a Santos e manifestar a intenção de reunir-se com ele nos próximos três a cinco dias: Estou disposto a virar a página e olhar para o futuro.

Estou cheio de fé, esperança e vontade de trabalhar com o novo presidente da Colômbia.

Em um gesto de reconciliação, Chávez pediu queasFarc liberte unilateralmente os refénsemseu poder. A guerrilha deveria manifestar-se pela paz, mas de forma contundente. Por exemplo, com a libertação de todos os sequestrados. Por que mantêlos assim?, indagou o presidente daVenezuela.

Resposta à guerrilha Aolongo de quatroanoscomoministrodaDefesa, Santos acumulou resultados expressivos contra as Farc. Em2002, a primeira posse de ÁlvaroUribe foimarcada por uma chuva de foguetes artesanais lançados pelos rebeldes na direção do palácioa maioria caiu sobre uma área próxima, matando 25 indigentes que ocupavam casas abandonadas.

Àquela altura, a guerilha tinhaumcontigentedaordem de 20 mil combatentes, hoje reduzido a um terço. Com46 anos de existência, as Farc sofreram desde 2008 sucessivos golpes, com a morte de três dos setemembros de seu secretariado (altocomando), entre eles seu fundador,olendárioManuelMarulanda vítima de enfarte aos 78 anos. Operações cirúrgicas do Exército libertaram quase duas dezenas de reféns, entre eles a ex-candidata presidencial IngridBettancourt.

Dias antes de Santos tomar posse, o sucessor de Marulanda, Alfonso Cano, enviou por vídeo uma mensagem propondo conversações. Aos grupos armados que hoje falam outra vezemdiálogo e negociação, digo que o governo está aberto a qualquer conversação.Mas enquanto não libertarem os sequestrados e continuarem a cometer atos terroristas, continuaremos a nos enfrentar, advertiu.

Fronteira atropelada

Grupos de ex-paramilitares de direita colombianos cruzaram a fronteira com o Equador e começaram a controlar povoados no país vizinho, para ampliar suas atividades de narcotráfico. A presença na região do grupo chamado de Águias Negras foi divulgada ontem pelo diretor de Inteligência da Polícia do Equador, Fabián Solano. A organização foi formada entre 2003 e 2006 por excombatentes das Autodefesas Unidas da Colômbia, que podem ter ligação com as Farc.

Sem agrément Hugo Chávez rejeitou ontem o novo embaixador designado pelo presidente Barack Obama para representar os Estados Unidos na Venezuela.

O indicado, Larry Palmer, teria feito questionamentos sobre as Forças Armadas venezuelanas. O embaixador não pode vir. (É) o mesmo que se inabilitou rompendo todas as regras da diplomacia. O melhor que o governo dos EUA pode fazer é buscar outro candidato, recomendou o presidente durante seu programa dominical de rádio e TV.