Título: Brasil-Noruega: parceria frente a desafios do século ::
Autor: Lima , Sérgio E. Moreira
Fonte: Valor Econômico, 29/03/2011, Opinião, p. A14

Noruega e Brasil vêm desenvolvendo parceria inovadora em setores de importância estratégica. Em 2010, a Noruega foi o 7º investidor direto no país, enquanto, em 2006, era apenas o 24º. Somente a União Europeia e os Estados Unidos recebem maior volume de investimentos diretos noruegueses. A Noruega consolidou a posição de principal destino das exportações brasileiras para os países escandinavos. Por sua vez, o Brasil é o terceiro mercado para serviços da Noruega e o segundo parceiro econômico nas Américas.

O governo norueguês acaba de lançar a "Estratégia Brasil", iniciativa de longo prazo que reconhece o país como ator global e sua importância para os interesses da Noruega. O plano confere prioridade à relação bilateral, cobrindo diferentes setores, como econômico, comercial, tecnológico, cultural, educacional e ambiental. A presença de cinco ministros na apresentação da Estratégia, realizada este mês em Oslo, demonstrou a dimensão política do projeto. O chanceler Jonas Gahr Støre está hoje e amanhã no Brasil para apresentá-lo.

Apesar da distância e das diferenças culturais, Brasil e Noruega compartilham ideais e valores democráticos, respeito por direitos fundamentais, compromisso com o multilateralismo, promoção do desenvolvimento e da paz. São parceiros nos organismos internacionais, na reconstrução do Haiti e em projetos de cooperação na África. Os dois países trabalham na promoção de mecanismos inovadores para financiar o desenvolvimento, o alcance dos Objetivos do Milênio e iniciativas para a melhoria das condições globais de saúde. Desde 2003, trocam experiências diplomáticas na solução de conflitos e reconciliação das partes.

Amanhã, no contexto da visita do ministro norueguês ao Brasil, será realizado em Brasília o III Seminário sobre Desenvolvimento e Paz, tendo por base a experiência no Haiti e no Oriente Médio. A Noruega foi o primeiro país a contribuir para o Fundo Amazônia, anunciando disposição de alocar US$ 1 bilhão até 2015.

A Noruega é uma sociedade igualitária comprometida com a justiça social. Sua reduzida população facilitou a erradicação total da pobreza. Possui a segunda mais alta renda per capita e mantém o mais elevado índice de desenvolvimento humano, além de ser o país que mais fornece ajuda internacional em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Detém a quinta marinha mercante do mundo e está entre os cinco maiores exportadores de petróleo e gás. Conta com o terceiro maior Fundo Soberano, dispondo de mais de US$ 500 bilhões para investimentos externos. Em dez anos, após a descoberta de petróleo no Mar do Norte, logrou criar cadeia industrial e tecnológica no setor. No momento em que o Brasil inicia o desenvolvimento do pré-sal, mostra-se útil estreitar a parceria com um país reconhecido pelo êxito na gestão dos recursos minerais e financeiros derivados da exploração do petróleo e do gás natural.

É útil estreitar a parceria com um país reconhecido pelo êxito na gestão dos recursos derivados do petróleo

Atualmente, acham-se instaladas no Brasil mais de cem empresas norueguesas, que contribuem para que o país produza mais energia, embarcações, equipamentos offshore, biocombustíveis, fertilizantes e químicos, metais especiais para a indústria moderna e papel de imprensa. No Estado do Rio de Janeiro, cresce o número de companhias norueguesas que operam nos setores de petróleo, construção naval e logística marítima. As parcerias empresariais se ampliam, a exemplo da fusão entre a Hydro e a Vale, por meio da qual a primeira assumiu os ativos de fabricação de alumínio da companhia brasileira e esta passou a deter 22% das ações da segunda maior empresa norueguesa.

Em 2010, com a retomada do crescimento econômico na Noruega (previsto em 2,5%), o comércio bilateral cresceu 29%, situando-se em US$ 1,42 bilhão - contra US$ 1,1 bilhão registrado em 2009. O Brasil se manteve como principal parceiro comercial da Noruega na América Latina. As exportações brasileiras para a Noruega aumentaram 18%, passando de US$ 611,6 milhões para US$ 722,1 milhões.

O transporte marítimo é um segmento em que a parceria Brasil-Noruega é evidente. Uma em cada quatro embarcações offshore em operação em águas brasileiras é controlada por empresa norueguesa. Recentemente, a Petrobras firmou oito contratos para serviços de ancoragem com companhias norueguesas. Em 2008 e 2009, registrou-se aumento de 30% no movimento de embarcações norueguesas em portos brasileiros, contabilizando-se hoje 1.500 atracações de navios noruegueses em portos do país.

A cooperação em áreas de alta tecnologia é outro aspecto do relacionamento bilateral, a exemplo da parceria entre o centro de pesquisa da Petrobras (Cepes) e instituições de pesquisa norueguesas, como a SINTEF e a Marintek. As perspectivas atuais também se estendem à aquicultura, ao desenvolvimento sustentável e ao monitoramento espacial para evitar desmatamento e poluição marinha. Instituições norueguesas podem colaborar com os esforços brasileiros para formar profissionais especializados e desenvolver pesquisas em áreas de ponta, que tornem a indústria nacional mais competitiva, agregando valor a seus produtos.

Em fevereiro, o ministro da Indústria e do Comércio Trond Giske veio ao Brasil acompanhado por delegação empresarial de 140 membros. Na última década, os contatos políticos de alto nível vêm contribuindo para reforçar a amizade histórica e a cooperação entre os dois povos. Em 2003, o rei Harald realizou visita de Estado ao Brasil, retribuída em 2007 pelo presidente Lula. No ano seguinte, o primeiro ministro Stoltenberg veio ao Brasil. Amanhã, a visita do chanceler Støre dará sequência a esse diálogo e contribuirá para reestruturar o relacionamento em patamar elevado mediante a assinatura de acordo sobre consultas políticas.

A evolução observada nos últimos anos nos é altamente positiva. Vale lembrar o convite feito em 2007 pelo presidente Lula aos empresários noruegueses para investirem no Brasil, gerando empregos e colaborando na expansão de atividades de importância estratégica. Essa parceria ajudará os dois países a concretizar seus projetos de desenvolvimento econômico e social, fortalecendo sua capacidade de enfrentar os desafios globais do século XXI.

Sérgio E. Moreira Lima é embaixador do Brasil na Noruega.