Título: Com US$ 16 bi, gringos dominam câmbio
Autor: Campos, Eduardo
Fonte: Valor Econômico, 01/04/2011, Finanças, p. C2

Mais por insistência do Banco Central (BC) que por demanda, o dólar comercial encerrou o pregão de quinta-feira com leve alta. Ainda assim, a moeda segue rondando mínimas não vistas desde a crise de 2008.

Não satisfeitos com a queda de 1,5% de quarta-feira, os vendidos voltaram a pressionar a cotação da moeda americana, que ontem fez mínima a R$ 1,621, antes de fechar com leve alta de 0,12%, a R$ 1,631 na venda. No mês, a divisa perdeu 1,92%, e agora em 2011 está 2,10% mais barata.

O trabalho do BC para conter esse ímpeto vendedor começou cedo e contou com fato inédito desde 15 de janeiro de 2004. Foram feitas três intervenções no mercado à vista. Duas pela manhã e uma à tarde.

A autoridade monetária também foi ao ataque no mercado futuro, fazendo dois leilões de swap cambial reverso. Na verdade, o primeiro teve todas as propostas rejeitadas. Então, o BC voltou a fazer a oferta. No entanto, a demanda seguiu baixa. Foram tomados apenas 6,6 mil contratos de um total de 30 mil swaps distribuídos em três vencimentos.

Dando uma ideia de quanto o BC atuou nesta semana, até ontem foram 14 intervenções. Em todo o mês de março, foram feitos 42 leilões no mercado, incluindo pronto, termo e swap. E agora em 2011, o montante é de 136 pitacos no câmbio em 61 dias úteis. Salve o regime de câmbio flutuante.

Segundo o diretor de tesouraria do Banco Prosper, Jorge Knauer, se o BC não tivesse vindo para o jogo na quinta-feira, a taxa poderia, tranquilamente, testar a linha de R$ 1,60.

Além das pressões decorrentes dos vendidos em função da formação da Ptax (média das cotações ponderada pelo volume que liquida os contratos futuros), a cena externa também favoreceu a venda de moeda americana. O dólar perdeu para o euro e outros rivais.

De volta ao front doméstico, Knauer chama atenção para o volume de posição vendida dos estrangeiros. Até o dia 30, o estoque vendido estava em US$ 16,6 bilhões, uma das maiores somas já registradas. Sendo US$ 7,67 bilhões em dólar futuro mais US$ 8,93 bilhões em contratos de cupom cambial (DDI - juro em dólar).

De acordo com Knauer, é muito difícil brigar contra uma posição desse tamanho, ainda mais que os leilões do BC não atingem diretamente esse tipo de investidor.

Segundo o especialista, fica a dúvida sobre o que o BC poderá fazer para reverter tamanha aposta pró-real. Por ora, diz Knauer, o BC pode seguir com esse firme modelo de atuação enquanto bola alguma forma de atingir o mercado futuro de forma mais incisiva.

"Tem que fazer o vendido sofrer prejuízo. Se não tiver perda, eles não vão mudar a mão", diz o especialista, lembrando que enquanto nada mudar, os vendidos seguem "aproveitando a festa, mas sempre perto da porta de saída".

Um exemplo de que a "festa poderia acabar" foi observado ainda em março, quando os rumores sobre medidas cambiais estavam fortes. Os números contam bem essa história.

Olhando apenas a posição em dólar futuro, os estrangeiros estavam vendidos em US$ 6,13 bilhões no dia 4 de março. Nesse pré-carnaval começaram os rumores. Desse ponto em diante, as posições foram reduzidas e o estoque vendido caiu a US$ 1,6 bilhão no dia 17. Como nada de concreto acontecia, a aposta pró-real voltou a aumentar e em oito pregões, os não residentes venderam US$ 6,0 bilhões em contratos. Vale lembrar os dólares começaram a ser vendidos na linha de R$ 1,67 e foram até R$ 1,63.

Quem "pagou o almoço", mais uma vez, foram os comprados. Aqui temos os bancos, com US$ 10,2 bilhões, sendo US$ 3,53 bilhões em dólar futuro e US$ 6,66 bilhões em cupom cambial. Cabe ressaltar que não é possível saber a posição total dos bancos, pois eles também atuam no mercado à vista, onde estão vendidos em cerca de US$ 7 bilhões, fora operações de balcão e outras modalidades de contrato cambial. Também na compra estavam "outras pessoas jurídicas financeiras", com US$ 5,12 bilhões em contratos de dólar futuro.

Mudando o foco para o mercado de juros, depois do firme ajuste promovido pelo Relatório de Inflação, o mercado de teve um pregão menos movimentado na quinta-feira. E o formado da curva permaneceu inalterado.

Os contratos curtos mostram a reavaliação de bancos e consultorias quanto ao ciclo de alta de juros. O meio ponto é teto e, agora, o 0,25 ponto de alta na Selic ganha cada vez mais peso.

Já os longos seguem ganhando inclinação, mostrando que o mercado ainda não está plenamente convencido de que a estratégia adotada pelo Banco Central resultará em convergência da inflação à meta de 4,5% ao ano.

Eduardo Campos é repórter