Título: Expansão do crédito pode exigir novas medidas do BC
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 30/03/2011, Opinião, p. A14
O que se previa e temia acabou acontecendo: depois de dois meses de retração, o crédito voltou a crescer em fevereiro e começo de março e saiu do trilho considerado razoável pelo Banco Central (BC) em sua batalha para reconduzir a inflação de volta para o centro da meta.
Em apresentação feita ao Senado, na semana passada, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, afirmou que não era desejável que o crédito crescesse mais do que 10% a 15% neste ano, deixando em aberto que novas medidas poderiam ser adotadas, caso esse limite fosse ultrapassado.
Os dados de fevereiro claramente desafiam a ameaça subentendida por todos. O crédito cresceu 1,3% no mês passado, acumulando 21% em doze meses, e atingiu R$ 1,738 trilhão. Em janeiro, a expansão em 12 meses estava em 20,3%. O saldo dos empréstimos para pessoas físicas aumentou 1,3%, puxado pelo financiamento de veículos (2,7%) e crédito pessoal (1,2%).
Segundo cálculos feitos pelo mercado, as concessões de crédito para pessoas físicas cresceram 4,1% em fevereiro, em termos dessazonalizados e deflacionados, e mais 3,5% nos primeiros 17 dias de março, depois de terem diminuído 1,6% em dezembro e 3,9% em janeiro.
O BC atribuiu o aumento do crédito à comparação com janeiro, quando as operações foram contidas pelas medidas macroprudenciais do início de dezembro -- basicamente a maior exigência de capital para os financiamentos de longo prazo para pessoas físicas e o aumento do compulsório sobre os depósitos bancários. Houve, no entanto, o relaxamento dos bancos, uma vez que o prazo médio do crédito concedido a pessoas físicas voltou a subir em fevereiro para 563 dias, depois de ter encolhido para 559 dias em janeiro.
Além disso, o mercado de trabalho a quase pleno emprego e o aumento da renda média dos trabalhadores certamente deram coragem ao tomador de crédito para encarar os juros que, depois das medidas macroprudenciais, subiram de 39,1% em novembro para 43,8% em janeiro e fevereiro e 46,1% em março.
O desemprego aumentou para 6,4% em fevereiro em comparação com 6,1% em janeiro nas seis principais regiões metropolitanas do país, de acordo com levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mas ainda está em níveis historicamente baixos. Em janeiro de 2010, por exemplo, estava em 7,2%. O rendimento médio do trabalhador teve um aumento real de 4,2% em doze meses.
Outro sinal de vitalidade econômica é a arrecadação de tributos federais, que foi recorde em fevereiro, com a marca de R$ 64,1 bilhões, e avanço de 9,8% reais em doze meses. Em vista desse resultado, a Receita Federal até ampliou de 12% para 15% a expectativa de expansão da arrecadação deste ano. A Receita Federal atribuiu a reavaliação à maior lucratividade das empresas, aumento da produção e da comercialização de bens e serviços e à expansão da massa salarial.
Outras fontes indicam o desaquecimento das vendas de varejo, da produção industrial, o aumento da inadimplência e menor confiança do empresário. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) acaba de divulgar que o setor trabalhou abaixo da capacidade em fevereiro, pelo terceiro mês consecutivo. Mas a produção industrial aumentou.
Tombini tem dito que está difícil analisar o quadro internacional. O cenário doméstico está igualmente complexo. Na verdade, as informações a respeito do ritmo da economia têm sido contraditórias nos últimos meses. O que é inegável é que o crédito voltou a crescer e a inflação está acima do desejável. A desaceleração do crédito faz parte da estratégia do BC para segurar a economia e, com isso, levar a inflação de volta para o centro da meta.
O BC pode adotar novas medidas macroprudenciais para conter o crédito, como insinuou Tombini em sua apresentação ao Senado. O nome pode parecer novo, mas os instrumentos utilizados são velhos conhecidos do mercado brasileiro -- compulsórios, impostos e reforço de capital - e demais mercados emergentes, como complemento às ações de política monetária, cujo principal instrumento é a taxa de juro. Ontem mesmo foi instituído o IOF de 6% para empréstimos externos contratados por bancos e empresas com prazo de até 360 dias. Até então, as captações com prazo de até 90 dias pagavam IOF de 5,38%.
As medidas macroprudenciais caíram nas graças também das economias avançadas, que tiveram que ser mais criativas agora, quando as taxas de juros estão perto de zero.