Título: Área de atração
Autor: Magalhães, Heloisa ; Santos, Chico
Fonte: Valor Econômico, 31/03/2011, Especial, p. G1

Do Rio

Caiu como um pote de ouro no compartimento do ego brasileiro a declaração do presidente americano, Barack Obama, tanto em Brasília como no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, de que "o futuro já chegou" para o Brasil. O presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, puxou o pote para dentro de casa: "Se o Brasil é esse país que o presidente Obama está dizendo, o Rio é hoje o melhor lugar para se investir nesse país", afirma, ressaltando que a cidade e o Estado vivem um momento praticamente inédito de conjugação de fatores positivos para a atração de investimentos.

"Desde o primeiro dia do meu governo (janeiro de 2007) eu tinha o objetivo de "vender" o Rio de janeiro no exterior para atrair novos investimentos e fazer com que o Estado saísse da estagnação econômica em que estava. Era sair da toca mesmo, mostrar que o Rio não era unicamente um destino turístico, mas também empresarial", explica o governador Sérgio Cabral Filho, cujo governo é visto como um divisor de águas entre a decadência da várias décadas e os sinais cada vez mais fortes de renascimento.

É essa imagem que Cabral tenta mais uma vez vender hoje, em Washington, na abertura de seminário "Rio de Janeiro: desenvolvimento e atração de novos investimentos" organizado pela Câmara de Comércio Americana, Valor Econômico e "Washington Post". O sucesso no esforço para atrair o jogo final da Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 serve de moldura para a composição do ambiente.

Neste cenário, segundo a versão 2011-2013 do "Decisão Rio", levantamento periódico feito pela Firjan das intenções firmes de investimentos, empresas e governos preparam-se para despejar R$ 181,4 bilhões (US$ 102 bilhões) em projetos industriais, turísticos, de infraestrutura e de serviços no Estado.

"Para mim, o que o governador Cabral trouxe foi o redesenho do Estado e da administração pública do Rio que não existia. Cabral fez concurso para fiscal de renda, organizou o Inea (órgão ambiental do Estado) e a segurança foi inteiramente revista. Esse tripé, que está em permanente construção, permite ao investidor ter uma interlocução com o poder público absolutamente organizada", ressalta Gouvêa Vieira.

Outro aspecto considerado absolutamente essencial pelo presidente da Firjan para a inversão de expectativas no Rio foi o alinhamento político entre o governo do Estado, governo federal e prefeitura da capital, algo que não vinha ocorrendo ao longo das últimas décadas. Entre outros benefícios, o Estado tornou-se um dos principais destinos dos investimentos federais no país, com obras de infraestrutura em favelas e construção do Arco Rodoviário Metropolitano, bem como as inversões da Petrobras, empresa controlada pelo governo federal.

A Petrobras lidera, com cerca de 60% do total (R$ 107,9 bilhões ou US$ 60,7 bilhões), os investimentos no Rio até 2013, mostrando que a liderança do Estado na indústria do petróleo e gás do Brasil permanecerá firme por várias décadas. Hoje, o Rio responde por mais de 80% da produção da estatal em território brasileiro. Em seguida, vêm os investimentos em infraestrutura (R$ 36,3 bilhões ou US$ 20,4 bilhões) e na indústria de transformação (R$ 29,5 bilhões ou US$ 16,6 bilhões).

A disputa acirrada entre as grandes empresas de tecnologia e serviços do setor, como Schlumberger, Baker Hughes, GE e outras, por um espaço para instalação de centros de pesquisas no Parque Tecnológico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), revela que o mercado elegeu o Rio de Janeiro como a capital da exploração das imensas reservas petrolíferas do pré-sal brasileiro. Os centros de pesquisas reforçam a posição da cidade como um dos principais polos de inovação do país.

O secretário de Desenvolvimento Econômico do Estado, Julio Bueno separa claramente, do ponto de vista econômico, o governo Cabral em duas fases, representadas pelo primeiro mandato (2007-2010) e pelo segundo, iniciado há menos de três meses. Segundo ele, o primeiro mandato teve como estratégia melhorar o ambiente de negócios, passar credibilidade para os empresários e atacar o problema da segurança pública. "Foi inteiramente cumprida."

A análise de Bueno, feita com outras palavras, coincide inteiramente com a visão empresarial passada pelo presidente da Firjan. Para o segundo mandato, avalia o secretário, "a estratégia é buscar o crescimento econômico". No seu entendimento, os investimentos estão garantidos.

"O que temos a fazer é aproveitar para maximizar a virtudes desse crescimento". Para Bueno, o esforço para injetar conteúdo local nesse processo de crescimento é básico. "É fundamental para que a gente possa fazer com que os arranjos produtivos se encadeiem não só na indústria do petróleo, mas na automobilística, na siderúrgica e em todos os demais setores", enumera.

Para o economista Mauro Osório, um dos mais reconhecidos estudiosos da economia fluminense, "planejamento" é a palavra-chave para que o Rio de Janeiro leve adiante as conquistas já obtidas e consiga transformá-las em bem-estar para sua população, a razão de ser de qualquer política pública.

Planejar, na visão de Osório, é orientar os investimentos de modo a que eles possam fazer aquela maximização de resultados preconizada pelo secretário Bueno, no plano regional, no setorial. Do ponto de vista regional, ele elege duas medidas recentes do governo do Estado: a criação de um comitê gestor para a reconstrução da região serrana, devastada por enchentes ocorridas em janeiro, e de um comitê para propor, em 180 dias, ações voltadas para a integração entre os municípios que formam a região metropolitana da capital. A periferia do Rio ainda é, basicamente, dormitório. Cerca de 70% de todo o emprego está na capital.

Com o Arco Metropolitano, uma via de pista dupla de 145 quilômetros interligando os limites internos da região metropolitana da capital, o economista considera essencial aproveitar o terminal de contêineres do porto de Itaguaí para atrair indústrias em seu entorno.

"Temos que pensar em complexos produtivos", enfatiza Osório, destacando os de petróleo e gás e de entretenimento como os principais no Estado. Na área de petróleo, ele considera essencial que cada vez mais os projetos de engenharia sejam feitos no próprio Estado.

Na petroquímica, dar maior densidade ao polo de Duque de Caxias (Baixada Fluminense), atraindo indústrias de plásticos, geradoras de empregos. Embora seja a maior cidade industrial da periferia do Rio, Caxias tem só 2,9% da população empregada na indústria, segundo dados do IBGE de 2009 compilados por Osório.

A modernização da indústria naval, reativada ao longo dos últimos anos e intimamente ligada ao crescimento da indústria do petróleo e gás é outro ponto fundamental. O economista sugere estimular a recém-inaugurada Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), do grupo alemão Thyssenkrupp, a produzir também para o mercado interno (ela é 100% exportadora), fornecendo chapas de aço para a indústria naval.

Na vertente básica da segurança pública, o desafio para Osório é universalizar os benefícios das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) que estão expulsando o poder paralelo do narcotráfico e das milícias das favelas da capital e da sua periferia. O governador Cabral definiu essa universalização como uma das bandeiras do seu segundo mandato.

Os números mais recentes do IBGE mostram que a virada econômica do Rio já está acontecendo. Quando medidas de 2000 a 2010, as vendas do comércio varejista do Estado do Rio cresceram 45,1%, em comparação a 60,9% da média brasileira. De fevereiro de 2010 a janeiro de 2011, a média do Rio é de 10,6%, praticamente igual à de 10,7% do país.

O mesmo acontece na geração de empregos formais. De 2000 a 2009, o crescimento no Estado ficou muito abaixo da média do país (41,7% contra 57,1%). De março de 2010 a fevereiro deste ano, os números são muito próximos: 7,14% no Estado e 7,45% no país, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).