Título: Commodities pressionam preços ao produtor
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 06/04/2011, Brasil, p. A3

Pressionado pela forte alta das cotações de produtos químicos e têxteis, o Índice de Preços ao Produtor (IPP) de fevereiro subiu 0,6%, acelerando-se em relação ao 0,4% de janeiro. O resultado reflete em grande parte o impacto do aumento do petróleo sobre o setor químico e do algodão sobre o têxtil, evidenciando as elevações de custos provocadas pelo avanço dos preços de commodities.

Divulgado ontem pela primeira vez pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o IPP acumula variação de 1% no primeiro bimestre do ano e de 6,21% em 12 meses. O objetivo do indicador, segundo o instituto, é mostrar a variação dos preços na "porta da fábrica" de 23 setores da indústria de transformação, excluindo o efeito de impostos e fretes.

Os produtos químicos ao produtor estão em alta superior a dois dígitos no acumulado em 12 meses. Nessa base de comparação, a alta atingiu 13,6%, engordada pelo avanço de 3,39% em fevereiro. A diretora técnica da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Fátima Ferreira, diz que o setor enfrentou em 2008 forte queda de preços, devido à crise, tendo apenas uma recuperação desse patamar em 2009 e em 2010. "Agora os analistas apontam para possível novo ciclo de alta em 2011. Isso sim já pode ser relacionado à matéria prima."

A pressão também é forte nos produtos têxteis. Com a elevação de 2,51% em fevereiro, os preços já subiram 25,4% em 12 meses. Muito influenciado pelas commodities, o setor de produtos alimentícios viu as cotações dispararem - em 12 meses, o aumento é de 16,9%. Em fevereiro, porém, houve queda de 0,45%, devolvendo parte da alta dos meses anteriores.

Para a economista Ariadne Vitoriano, da Rosenberg & Associados, o IPP deve contribuir para uma análise mais detalhada da inflação. O índice deixa mais claro os choques que ocorrem no nível do produtor, respaldando avaliações sobre as origens dos movimentos de preços ao consumidor - se é algo relacionado à pressão de custos ou ao aumento da demanda. "Além disso, vai favorecer a projeção do IPCA", diz Ariadne, referindo-se ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que baliza o regime de metas de inflação.

Ela analisou o comportamento dos preços dos insumos na indústria de produtos alimentícios no IPP e de alimentos no domicílio no IPCA. Segundo Ariadne, há uma clara resposta das cotações ao consumidor às oscilações ocorridas no âmbito do produtor com alguma defasagem. "Enquanto no IPP a variação dos preços dessa indústria oscilava em patamar negativo no segundo trimestre de 2010, houve forte queda dos alimentos no IPCA a partir de abril, tendência que se reverteu em junho, quando o IPP já estava em trajetória de alta."

O IPP exibe um comportamento bastante diferente do Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) industrial da Fundação Getulio Vargas (FGV). Nos 12 meses até fevereiro, por exemplo, o IPA-DI industrial subiu 8,65%, razoavelmente acima dos 6,21% do IPP do IBGE. A diferença se explica por um motivo simples, como observa o economista Thiago Curado, da Tendências Consultoria. O IPP retrata apenas o que se passa na indústria de transformação, ao passo que o indicador da FGV também capta a evolução na indústria extrativa, onde está o minério de ferro, cujas cotações registram altas expressivas nos últimos meses.

Se o IPP é comparado com o grupo de indústria de transformação do IPA industrial, o comportamento é bem mais próximo, diz Curado. Em 12 meses até fevereiro, esse indicador da FGV subiu 5,59%, não muito distante dos 6,21% do IPP. No primeiro bimestre, as altas são quase idênticas - 1% no IPP e 1,04% no grupo de indústria de transformação do IPA industrial.

O economista Fabio Romão, da LCA Consultores, elogia a iniciativa do IBGE, por oferecer um indicador gratuito sobre preços ao produtor - a abertura mais detalhada dos indicadores da FGV só é fornecida a clientes. Para ele, o IPP é bastante promissor, embora a série divulgada seja curta e limitada à indústria de transformação. "Mas o IBGE destaca que, no futuro, vai incorporar ao IPP os segmentos de agropecuária, indústria extrativas, construção civil e serviços, uma notícia bastante positiva."

O presidente do IBGE, Eduardo Pereira Nunes, diz que, como o novo indicador tem uma série histórica de apenas 14 meses, ainda vai levar algum tempo até que a instituição tenha o aprendizado de qual será o reflexo no IPCA dos preços ao produtor. Ele acha que o Banco Central vai passar a analisar a diferença de preços e de trajetória entre o IPP e o IPCA. Romão lembra que, no IPCA, além de bens industriais, há outros grupos muito importantes, como serviços e preços administrados.

O coordenador da FGV, Salomão Quadros, diz que uma diferenças entre o IPP e o IPA industrial é que o do IBGE usa a série 2.0 da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), a mais atualizada, enquanto o da FGV usa a versão 1.0. Na 2.0, os setores de alimentos e bebidas estão separados, aparecendo juntos na 1.0. "Mas todos os segmentos estão cobertos." Ele lembra ainda que, além do industrial, a FGV apura o IPA agropecuário.