Título: Trem-bala expõe dilemas da unidade tucana
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2011, Política, p. A11

De Brasília A oposição na Câmara dos Deputados não conseguiu unificar um discurso contrário ao projeto que cria o trem-bala, cujo texto-base foi aprovado anteontem. O sinal mais vistoso disso ocorreu no PSDB, que refletiu no plenário da Casa as divergências partidárias internas entre alckmistas, serristas e aecistas. O governo derrubou quase todos os destaques da oposição. Só passou o que o obriga o Ministério da Fazenda a enviar uma espécie de prestação de contas semestral do TAV para o Congresso analisar.

Oriundos do Estado mais beneficiado com o trem-bala - haverá estações nas duas principais cidades, São Paulo e Campinas - os tucanos paulistas defenderam o projeto em plenário, embora com ressalvas. Mesma posição adotada pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que já sugeriu algumas alterações à presidente Dilma Rousseff. Nesse sentido, fizeram suas intervenções na discussão preocupados tanto em levar adiante a obstrução na sessão quanto em se defender das críticas dos governistas de que não queriam que o trem-bala fosse tirado do papel.

"Queremos deixar muito claro que somos favoráveis ao projeto. Entendemos que é uma tecnologia que o Brasil precisa, pode e deve ser absorvida, mas não na forma como se apresenta no projeto nem no formato como o atual governo pretende usar o investimento", disse o líder do partido, Duarte Nogueira (SP).

Sua preocupação era quanto à engenharia financeira do projeto. No texto aprovado, o BNDES financia até R$ 20 bilhões ao consórcio vencedor e a União garante mais R$ 5 bilhões de subsídios para o caso de a receita bruta do trem-bala for inferior á presente na proposta do vencedor da licitação ou à projetada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

Entretanto, também demonstrava preocupação com as acusações de que a oposição não queria sua implementação. "A base governista quer passar a mensagem de que somos contrários ao trem-bala. Não somos contrários. Defendemos o projeto, defendemos a absorção da tecnologia que é importante para o transporte de massa do nosso país. No entanto, estamos apresentado questionamentos sobre a forma como o governo quer fazer."

O deputado Vanderlei Macris (PSDB-SP) também seguiu nessa linha: "Já tenho posição favorável a essa proposta há muito tempo. Nunca houve dificuldade de parte de São Paulo em facilitar as atividades do governo para que essa obra pudesse ser realizada. Mas a forma como está sendo conduzida não é justa." Suas principais críticas, contudo, apontavam para o fato de, a despeito do adiamento do leilão do trem-bala anunciado pelo governo, o texto do relator da medida provisória prever a criação da Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade (Etav).

No entanto, os deputados tucanos de Minas Gerais - por onde não estão previstos os trilhos do trem-bala - posicionaram-se com mais força contra o projeto. O receio, já manifestado internamente pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG), é de que haja um desequilíbrio nos investimentos federais em transportes em favor de São Paulo. "Não temos as condições necessárias para discutir a construção de um trem de alta velocidade, como se o Brasil estivesse à beira de ingressar no rol das grandes potências mundiais. Não temos infraestrutura aeroportuária, rodoviária, portuária ou ferroviária que permita que os brasileiros possam se locomover com dignidade por entre os muitos caminhos do nosso país", disse o líder da minoria, Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG).

Para o presidente do PSDB-MG, deputado Marcus Pestana, "a discussão verdadeira que está posta é a questão de prioridades orçamentárias". "Há uma distorção, uma vez que se tergiversa sobre uma vertente fundamental da discussão orçamentária, que manifesta a escolha de prioridades". De acordo com ele, "a questão essencial é que há recursos públicos, em regime de escassez, no momento de estrangulamento fiscal, que envolvem o subsídio potencial de até R$ 28 bilhões."

Um dos mais deputados mais fiéis ao candidato a presidente pelo PSDB em 2010, José Serra, o deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA) posicionou-se à maneira do tucano na campanha eleitoral: radicalmente contrário. "Acho que o governo brasileiro tem que rever sua decisão, porque esse projeto é um desserviço, um acinte à inteligência do brasileiro", disse. E completou: "Vocês que estão nesse trânsito insuportável em São Paulo, Salvador, Belo Horizonte, Fortaleza, Recife admitem colocar R$ 34,6 bilhões do seu bolso, de tributos suados do povo brasileiro, num projeto absolutamente inconsistente do ponto de vista da sua economia, da geração do custo e benefício?"