Título: Bolsa perde mais de 6 mil investidores somente neste ano
Autor: Monteiro, Luciana; Perez, Antonio
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2011, Eu e investimentos, p. D3

De São Paulo Enquanto a bolsa pretende atingir a marca de 5 milhões de investidores pessoas físicas até 2015, o que se vê nos últimos meses é justamente o contrário: uma redução no total de contas. Os números mostram que, em março, não foi diferente: o número de contas de pessoas físicas encerrou o mês em 597.014, ante 600.341 em fevereiro. No trimestre, já deixaram a bolsa 6.498 investidores. O movimento de queda vem ocorrendo desde outubro do ano passado, quando a BM&FBovespa atingiu o recorde de 630.895 contas de investidores individuais. Essa realidade contrasta com uma série de iniciativas realizadas pela bolsa a fim de fomentar o mercado acionário junto aos pequenos investidores. Ontem, por exemplo, o Valor mostrou que a Link Investimentos e a Souza Barros, com o apoio financeiro da BM&FBovespa, estão fazendo anúncios em cinemas em salas de São Paulo, Rio e Porto Alegre.

Além disso, desde fevereiro, há a vinculação de comerciais de TV e rádio estrelados pelo rei Pelé. Antes restrita a Belo Horizonte, Curitiba e Campinas, a campanha, enfim, chegou a São Paulo, mas nem assim o número de investidores cresceu. As propagandas ocorrem nos intervalos do Jornal da Globo e de outros programas jornalísticos.

As pessoas não vão investir em ações apenas porque veem propaganda com o Pelé, por mais carismático que ele seja, ressalta Paulo Levy, diretor executivo da Icap Brasil e responsável pelo MyCap, o home broker da corretora. "Acho que se a bolsa se concentrasse na educação do investidor, algo que deixou mais para as corretoras, o resultado seria melhor", afirma Levy.

Ele ressalta que as pessoas físicas vão à bolsa geralmente quando há uma clara tendência de valorização do Índice Bovespa, o termômetro do mercado acionário. Como o Ibovespa praticamente não sai do lugar há cerca de um ano e meio, apenas os investidores mais sofisticados se interessam por ações. "Sem uma tendência clara de alta do Ibovespa e os juros altos, o investidor comum acaba não tendo estímulo para entrar na bolsa", diz Levy.

A escassez de ofertas públicas de nomes conhecidos e populares ajuda a explicar esse movimento, avaliam os especialistas do setor. O período mais recente de crescimento do número de investidores, no segundo semestre do ano passado, coincidiu, por exemplo, com as ofertas do Banco do Brasil e da Petrobras.

Quando não há o lançamento de ações de companhias bem populares, o total de contas não cresce. "Mas isso vai contra justamente à visão de longo prazo da bolsa, pois esses são investidores que compram um papel para vendê-lo no dia seguinte, na estreia da ação", diz Rafael Giovani, gerente comercial e de relacionamento com o cliente da UM Investimentos. "Sem um processo educacional, a pessoa física só deve voltar à bolsa quando o Ibovespa começar a decolar."

Os dados de março mostram também que a pessoa física realizou menos negócios no mês, reduzindo, assim, a média diária e o volume financeiro transacionado via home broker - sistema de compra e venda de ações via internet. Com isso, a participação do home broker no número de negócios do segmento Bovespa foi de 24,95%, em comparação aos 26,23% em fevereiro.

O balanço da bolsa divulgado ontem mostra que, no mês passado, o número total de negócios por meio do home broker foi de 5,150 milhões, para 5,717 milhões em fevereiro. Já a média diária saiu de 285.872 no segundo mês do ano para 245.282 em março. E o volume foi reduzido para R$ 41,39 bilhões, ante R$ 45,03 bilhões em fevereiro.

Mesmo o número de clubes de investimento, durante muito tempo apontados como o atalho do pequeno investidor à bolsa, também cai neste ano. Foram fechados pelo menos 39 clubes somente neste primeiro trimestre. De acordo com os dados da bolsa, o ano passado terminou com 3.054 clubes. Em março, apesar da criação de 38, o total de carteiras somava 3.015.

Diante da falta de uma tendência clara de mercado, os investidores têm preferido tentar um ganho extra com o aluguel de ações. Em março, o número de operações com empréstimos de papéis atingiu o recorde de 121.239. O total superou os 107.063 registrados em fevereiro e que ocupava a colocação de primeiro lugar. O volume financeiro com aluguel atingiu a marca histórica de R$ 66,31 bilhões ante o recorde de R$ 59,05 bilhões em janeiro de 2011. Em fevereiro, o volume foi de R$ 48,37 bilhões.

A forte oscilação da bolsa no mês passado fez com que os aplicadores buscassem o mercado futuro para tentar proteger seus investimentos. Em março, foram negociados 1,746 milhão de minicontratos - versão reduzida ao contratos padrão - ante 1,700 milhão em fevereiro. Os mínis de Ibovespa futuro foram os mais transacionados: 1,609 milhão de minicontratos para 1,583 milhão.

A alta do ouro no mercado internacional animou os investidores a aplicar no metal por aqui. O mercado disponível de ouro (250 gramas) negociou, em março, 2.185 contratos, ante 766 em fevereiro. O volume financeiro cresceu 192%, totalizando R$ 43,01 milhões no mês passado, para R$ 14,70 milhões em fevereiro.

O esforço da bolsa em atrair mais pessoas físicas passa também pelo fomento do mercado de fundos de ações com cotas negociadas em bolsa, os ETFs (sigla para Exchange Traded Funds). Segundo o balanço de março, os ETFs tiveram 25.858 negócios, uma queda de 23,5% em relação aos 33.804 de fevereiro. O volume financeiro registrado em março pelos sete fundos de índices negociados na bolsa também caiu: somou R$ 816,25 milhões, ante R$ 876,25 milhões de fevereiro.