Título: Levar inflação ao centro da meta exigirá esforço prolongado do BC
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Fonte: Valor Econômico, 25/04/2011, Finanças, p. C2

Claudia Safatle | De Brasília Forçar a inflação a convergir para o centro da meta de 4,5% em 2012 será uma longa batalha. "Essa não é uma corrida de 100 metros", disse um alto funcionário do governo, após a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que aumentou em 0,25 ponto percentual a taxa de juros Selic, de 11,75% ao ano para 12% ao ano.

O desafio exigirá do Banco Central um esforço "prolongado", como deixou claro o comunicado emitido depois do encontro; e demandará, do governo, determinação para cumprir o compromisso fiscal. Os dados fiscais de março devem revelar uma menor expansão do gasto público.

A decisão pela desaceleração do ritmo de aperto monetário, tomada na quarta-feira, não foi unânime. Dois diretores do BC votaram por um aumento de 0,5 ponto na taxa de juros. Mas o entendimento de que será preciso um período suficientemente longo para derrubar a inflação foi consensual.

Se a corrida é mais extensa, os passos serão mais moderados e a cada seis semanas - período entre as reuniões do comitê - a pulsação das economias interna e externa serão minuciosamente checadas, indicam fontes oficiais. Os sinais de desaquecimento do nível de atividade doméstica ainda são frágeis e o cenário internacional vem ganhando contornos diversos com grande rapidez, avaliam.

O comunicado do Copom deixou claro, também, uma questão que estava sendo equivocadamente considerada pelos agentes do mercado, na ótica dessas fontes. O fato de ter adiado para 2012 a busca da meta de inflação de 4,5% não significava que o BC iria dar mais um ou dois aumentos de juros e parar para ver o que acontece, como pensaram alguns analistas de bancos e consultorias, explicaram. "Não foi isso que o Banco Central comunicou e em nenhum momento ele se comprometeu com um determinado orçamento de juros", disse um graduado assessor do governo.

O BC tem chamado a atenção, e o comunicado do Copom reforçou esse aspecto, para a complexidade do cenário internacional. De março, quando da penúltima reunião do comitê, para cá, a agência de classificação de risco Standard & Poor"s rebaixou para "negativa" a perspectiva da nota de crédito dos Estados Unidos, colocando em realce o problema fiscal da economia americana; os sinais de recuperação dos EUA ainda são insuficientes para produzir a aguardada mudança nas condições monetárias do país; e as dúvidas sobre a solvência de alguns países europeus não se dissiparam.

Simultaneamente a isso, o mundo está inflacionado, ressaltam esses assessores. A inflação anual está na casa dos 9% na Rússia, em 8% na Índia, entre 5% e 6% na China. Na Alemanha o preço ao produtor (PPI) acumula aumento de 6,2% e a situação não é muito melhor seja na França ou na Irlanda, citam as fontes.

Após explicitar que essa será uma longa caminhada, onde medidas já foram tomadas e outras ainda serão, a expectativa do Copom é de que haja um freio no processo de deterioração das expectativas inflacionárias.

Em linha com as discussões mais recentes dos principais economistas do mundo, o BC já indicou que considera a taxa de juros o principal, mas não o único, instrumento para lidar com aquecimentos ou desaquecimentos do nível de atividade e pressões inflacionárias. O pós-crise global fomenta o debate sobre a importância da política fiscal na regulação da demanda agregada.

Nesse sentido, em um trabalho divulgado junto com o último Relatório Trimestral de Inflação, intitulado "Multiplicador Fiscal, Produto e Inflação", os técnicos do BC calcularam, pela primeira vez, o multiplicador fiscal, exatamente para ter uma dimensão dos efeitos que o aumento das receitas tributárias ou o corte de gastos públicos produzem sobre a demanda agregada e o hiato do produto e, por consequência, sobre a inflação.

A despeito de todas as incertezas que cercam as estimativas do multiplicador, o estudo do BC

indica que o corte de 1 ponto percentual do PIB na despesa pública no período de um ano representaria uma contração de 0,9 ponto percentual no crescimento da economia, tendo como pressuposto que a política monetária durante esse período seria reativa (não acomodatícia, ou seja, os juros se moveriam). Trata-se, assim, de um efeito bem maior que o sugerido pelo mercado, em pesquisa feita pelo BC.

No caso brasileiro, o estudo sugere que "uma contenção fiscal tende a impactar significativa e rapidamente a inflação, por um período de tempo prolongado" e estima que o efeito máximo do corte de gastos sobre a inflação "ocorreria cerca de seis trimestres após o início da contenção fiscal". O auge do impacto da atual política fiscal sobre a demanda ocorreria, portanto, no primeiro semestre de 2012.