Título: Mercado demonstra confiança na nova estratégia revelada pelo BC
Autor: Oliveira , Ribamar
Fonte: Valor Econômico, 29/04/2011, Finanças, p. C10
A clareza com que o Banco Central (BC) indicou sua estratégia de calibragem do ciclo de aperto monetário, "suficientemente prolongado" para promover a convergência da inflação para o centro da meta em 2012, surpreendeu positivamente o mercado financeiro e poderá frear a deterioração das expectativas inflacionárias que vêm sistematicamente, há semanas, marcando pontos contra a autoridade monetária. A curva de juros refletiu imediatamente a percepção do mercado de que o BC não "jogou a toalha" no combate à inflação e que manterá o ciclo ainda que em velocidade mais branda. Os juros com prazos mais curtos subiram no pregão da BM&F e os mais longos recuaram, indicando confiança na estratégia do BC que, na ata do Copom divulgada ontem, atenuou o destaque dado às medidas macroprudenciais e trouxe à cena a taxa de juro.
Na ata, o Copom também emitiu alertas ao governo. De um lado, indicou a necessidade de cumprimento da meta fiscal para que a política monetária faça sua parte. De outro lado, cutucou os bancos públicos, considerando "oportuna" a moderação de subsídios de crédito.
"A ata elimina dúvidas sobre a disposição do BC e sinaliza que o Copom vai fazer o ajuste necessário. Além disso, a dúvida se usaria a taxa de juros no processo de aperto monetário foi dissipada. A ata mostra que o juro será usado. O mercado foi surpreendido porque esperava-se tom semelhante a outros documentos da instituição que indicaram pausa no ajuste", pondera Jankiel Santos, economista-chefe do Banco Espírito Santo.
Marianna Costa, economista-chefe da Link Investimentos,
diz que a estratégia apresentada pelo BC faz sentido com as medidas já tomadas e a alta do juro. "Prolongamento do ciclo sugere mais juro à frente. Pelo menos mais duas altas de 0,25 ponto. Apesar de acharmos que a probabilidade de uma terceira alta de 0,25 exista, trabalhamos com projeção de ciclo encerrado com Selic a 12,50% ao ano. A ata ainda mostra que o cenário de inflação do BC parece mais tranquilo do que o de mercado, mas a indicação é de trajetória muito similar. De inflação atingindo um pico em meados do ano para arrefecer em seguida. A diferença de visão está na magnitude do arrefecimento. Mas a ata deixa claro que o ajuste será feito, apenas seguirá ritmo mais lento."
Luis Otávio de Souza Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil, considera a ata muito parecida com a anterior, mas ressalta que os pontos divergentes alteram completamente a visão que o mercado tem do BC. "O tom mudou. Talvez porque as macroprudenciais não estejam atendendo às expectativas do BC ou talvez porque o próprio BC tenha dificuldade de mensurar os seus efeitos. O fato é que ao retirar o peso das macroprudenciais e reafirmar a política tradicional [uso de taxa de juro], o BC dá mais conforto ao mercado."
O economista-chefe do ABC Brasil reconhece que aumentou a incerteza quanto ao próprio ciclo de aperto monetário, mas aumentou a certeza quanto à efetividade desse ciclo. "A curva de juro passou a mostrar que diminuiu a probabilidade de o Copom errar. Agora certamente a discussão será sobre o tamanho do ciclo. Mas será interrompida a discussão sobre a retomada da alta. Se fosse cristalizada a ideia de mais uma alta da Selic em junho e retomada do ciclo no fim do ano, cresceria a expectativa de que o Copom precisaria elevar o juro muito mais para alcançar o seu objetivo. Isso é importantíssimo porque facilita a recuperação das expectativas", pondera Leal.
Eduardo Velho, economista-chefe da Prosper Corretora, discorda que o discurso pró-alongamento dos juros conseguirá reverter as expectativas de inflação. "Avaliamos que a alta de 0,79% do IPCA de março e possivelmente na vizinhança de 0,85% no índice de fechamento de abril (ainda não divulgado) estariam apontando uma deterioração (desvio) média de 0,20 a 0,30 pontos percentuais em relação às estimativas de dois meses atrás por exemplo. Esse movimento não apenas sustenta, mas realimenta a elevação das expectativas de inflação e a percepção na sociedade que a política monetária estaria mais leniente com a inflação ao custo de não sacrificar crescimento", afirma o economista.
Velho entende que uma alta da Selic de 0,50 ponto já não seria suficiente para reverter as expectativas inflacionárias de curto prazo, com impacto concentrado no aumento do custo da dívida pública. "Perdeu-se em parte o timing do ajuste monetário que deveria ter prosseguido no segundo semestre do ano passado, ou pelo menos, iniciado o novo ciclo mais apertado", afirma.
Zeina Latif, economista-chefe do Grupo RBS para América Latina, não foi surpreendida pela ata, lembrando que o placar da última reunião do Copom revelou dissenso entre os seus membros. Cinco diretores do BC votaram a favor da alta de 0,25 ponto e dois diretores pela alta de 0,50 ponto. "Gostei do documento. Mas como houve dissenso é difícil prever o quanto a ata reflete o pensamento do colegiado", afirma a economista para quem a ata revelou um Banco Central com menos certezas. "Prefiro um BC mais consciente das incertezas que o cenário apresenta e também dos riscos que cercam esse cenário."
Zeina comenta que a ata deixou para trás uma postura muito convicta do BC estampada no Relatório de Inflação divulgado no final de março. "As certezas do Relatório incomodaram o mercado por sinalizar desaceleração do ajuste da Selic de 0,50 para 0,25 ponto seguida de pausa. Na ata, porém, o Copom mostra que há incertezas no cenário sim, mas que ele prefere ir mais devagar na continuidade do ciclo."
O departamento econômico do Santander considera que o Copom, a partir dos sinais dados na ata, elevará a Selic em mais 0,25 ponto em junho, interromperá o ciclo nas reuniões de julho e agosto e, então, reiniciará o ciclo de aperto monetário no quarto trimestre.
O Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco reafirmou sua projeção de mais duas altas da taxa Selic de 0,25 ponto percentual cada uma. Em relatório, Octávio de Barros, diretor da instituição, comenta que a ata não trouxe alterações expressivas em relação à avaliação acerca da inflação e da atividade. Ele pondera que o cenário do BC continua apoiado na consolidação fiscal e na moderação do crédito, sendo que os riscos ainda residem nos aumentos salariais e na trajetória futura dos preços das commodities.