Título: Cadastro positivo: agora, compartilhar informações
Autor: Loureiro, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 06/05/2011, Opinião, p. A12

Depois de mais de uma década, o cadastro positivo foi finalmente aprovado. Mesmo atrasado em relação às outras economias, o Brasil tem agora uma grande oportunidade para os negócios e consumidores.

A plena operacionalidade do cadastro positivo é fundamentada no compartilhamento de informações positivas, entre todos os setores econômicos que concedem crédito ao consumidor.

Dada sua relevância para os mercados, os impactos do compartilhamento de informações, ou de sua ausência, têm sido largamente estudados por organismos internacionais, acadêmicos e executivos voltados ao aperfeiçoamento contínuo das relações econômico-financeiras.

A literatura que se tornou clássica nesse tema foi a de Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia, e Andrew Weiss, professor da Boston University. Em 1981, realizaram um estudo onde apontavam a assimetria de informações no mercado de crédito como o principal limitador à oferta de recursos. Os autores ponderavam que, em um ambiente de informações imperfeitas, o resultado era a prática de juros elevados, que penalizavam a todos e, principalmente, distanciavam os bons pagadores desse mercado, ampliando o risco e limitando o crédito.

John Barron, professor da Purdue University, e Michael Staten, da Georgetown University, ilustraram que num mercado sem compartilhamento, o contratante de crédito acaba tendo mais informações que o concedente e só primeiro conhece sua disposição em pagar os recursos tomados. Esses professores destacaram que o ganho esperado em uma operação de crédito é função de sua precificação e de sua probabilidade de pagamento. Portanto, é de total interesse dos que ofertam crédito, contar com informações que determinem o comportamento financeiro de seu cliente.

Mais duas referências em crédito, Tullio Japelli (Ph.D. da Università di Salerno) e Marco Pagano (professor da Università di Napoli Federico II) observaram que, numa amostra de 43 países, o tamanho e a qualidade do mercado de crédito estavam intimamente ligados à consistência de seu compartilhamento de informações. Japelli e Pagano concluíram que o compartilhamento de informações tem outros relevantes impactos sobre o mercado de crédito: permite a melhor previsibilidade da inadimplência; favorece a precificação do crédito e amplia seu volume.

No âmbito macroeconômico, os autores notaram que onde há compartilhamento completo de informação, o crédito ao setor privado, na comparação com o Produto Interno Bruto (PIB), é bem superior ao verificado nos países com assimetria, a exemplo do Brasil.

Para Martin Brown (especialista em risco do Banco Central da Suíça) e Christian Zehnder, (professor doutor da Harvard Business School), a assimetria de informações é mais impeditiva ao compartilhamento do que os obstáculos da concorrência entre empresas, mesmo sabendo que muitas encaram suas informações de crédito como ativo. Brown e Zehnder concluíram, com muita competência, que a sobrevivência e a própria competitividade das empresas que concedem crédito, dependem da eficiência de seu processo de troca de informações. Segundo eles, em um mercado com pleno compartilhamento de dados, 98% dos empréstimos concedidos são considerados bons e apenas 2% maus. Os ganhos em termos de qualidade e custo para os concedentes de crédito são positivamente afetados pelo compartilhamento de informações.

Brown e Zehnder apuraram também os efeitos do amplo compartilhamento das informações para o demandante de crédito, o consumidor. A conclusão foi que esse sistema estimula o pagamento pontual dos financiamentos e a disciplina financeira, tornando a reputação um atributo muito valorizado. Como consequência, de acordo com a experiência internacional, o consumidor passa a evitar o superendividamento e a inadimplência, se empenhando em construir uma boa reputação no crédito, para seu próprio benefício. O compartilhamento de informações torna o endividamento mais transparente. É bom lembrar que o crédito deve ser um aliado do consumidor e não a fonte de seus problemas.

Quanto ao impacto no spread bancário e na precificação do crédito, Gastón Gelos, economista do Fundo Monetário Internacional (FMI), examinou dados de 85 países e apontou que há correlação negativa entre o compartilhamento de informações e o spread. Isso acontece porque com mais informações, se precifica melhor o crédito, o que reduz o spread.

Michael Turner, presidente do The Policy and Economic Research Council (Perc), apontou três importantes esferas econômicas que a estrutura de informações de crédito contribui: a) crescimento econômico e estabilidade; b) preço do crédito e c) distribuição de renda. Turner citou a necessidade de se conhecer os riscos individuais, por meio do compartilhamento de informações, para se definir o preço do crédito baseado no risco. Ressaltou ainda que, para aqueles que concedem crédito, o cadastro positivo é a forma de mais baixo custo para se obter informações abrangentes de crédito.

Com seus consistentes estudos e pesquisas, essas referências internacionais orientam, com sucesso, o amadurecimento dos mercados de crédito em várias economias ao redor do mundo. No Brasil, o entendimento não pode ser diferente: é preciso desenvolver o compartilhamento de informações positivas de crédito como alavancador de negócios mais seguros e rentáveis e para a inserção de mais brasileiros no consumo.

Ricardo Loureiro é presidente da Serasa Experian e da Experian América Latina