Título: Europa recua de acordo e Brasil deve apoiar turco para o FMI
Autor: Lyra, Paulo de Tarso ; Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 20/05/2011, Internacional, p. A12

De Brasília e Genebra O Brasil deve apoiar o nome do turco Kemal Dervis - ex-ministro da Fazenda da Turquia e ex-vice-presidente do Banco Mundial - para substituir o ex-diretor-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI) Dominique Strauss-Khan. O apoio ganha mais força após a revelação de um acordo fechado pelo próprio Khan - antes de envolver-se em um escândalo sexual que o levou a afastar-se do cargo - de que ele seria o último europeu a dirigir a entidade. Pelo entendimento informal, o próximo nome teria de ser escolhido pelos países emergentes. Apesar de estar cercada pelo mundo desenvolvido, a Turquia é considerada mais próxima dos países em desenvolvimento.

Diretor-executivo do FMI para o Brasil e mais oito países, o economista brasileiro Paulo Nogueira Batista Júnior confirmou ao Valor o entendimento de que o ciclo de diretores-gerais europeus do Fundo seria encerrado após o mandato. "Havia, sim, esse compromisso verbal", declarou.

Essas negociações dificultam o empenho dos europeus em emplacar a francesa Christine Lagarde, atual ministra das Finanças da França, como sucessora de Kahn no FMI. Mas eles insistem que o momento é diferente, principalmente diante da profunda crise econômica que atravessam países importantes do continente. E apelam para o fato de os europeus, juntos, terem 30% dos votos do FMI contra apenas 17% dos Estados Unidos.

Para o governo brasileiro, a saída mais palatável é apoiar Kemal Dervis. Além de ser um economista com reconhecida capacidade técnica, ele representa os países emergentes. Brasil e Turquia também estreitaram ainda mais as relações após buscarem, em conjunto, negociar uma saída para o conflito nuclear iraniano.

Uma fonte do governo afirmou que o Brasil, apesar de se considerar um "importante ator global" não vai pleitear um nome próprio para dirigir o FMI. Citado como cotado à indicação do governo brasileiro para assumir o cargo - especialmente diante do prestígio internacional alcançado ao longo dos anos - o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga está cansado de repetir que não foi sondado, nem convidado e não poderia aceitar uma missão como essa. O governo também não o indicaria, mas o mercado insiste em comentar a possibilidade. "Não há a menor hipótese de ele ser apoiado por um governo petista", reconheceu um interlocutor da presidente Dilma Rousseff.

Apesar da opção preferencial pelo turco, o governo, por enquanto, mantém a cautela. A renúncia de Kahn já era esperada, mas ela foi oficializada apenas ontem. Além disso, ainda pairam dúvidas se o FMI antecipará de fato as eleições para substituir Khan - o mandato dele terminaria, oficialmente, em setembro de 2012 - ou se optará por manter um interino na vaga até o ano que vem. Para o governo brasileiro, essa hipótese parece bem remota, já que seria temerário deixar um interino no FMI por mais um ano em período de crise profunda nas economias europeias.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, que foi escolhido pela presidente Dilma Rousseff para conduzir as negociações brasileiras para a sucessão no FMI, fez ontem um breve comentário sobre a renúncia de Strauss-Kahn. "Estamos discutindo procedimentos e critérios para que os emergentes participem ativamente [do processo sucessório no Fundo]", disse ele, ao chegar à sede do Ministério da Fazenda, em Brasília.

Mantega destacou que o governo, neste momento, não está discutindo nomes. Logo após o comunicado oficial de Strauss-Kahn desistindo de manter-se no cargo, assessores de Mantega informaram que o ministro convocaria uma entrevista para falar com mais profundidade sobre as mudanças na condução do FMI. Horas depois, já no início da tarde, a orientação foi alterada. Mantega desistiu de conversar novamente com a imprensa. (colaborou Luciana Otoni)