Título: Renda extra
Autor: Guimarães, Luiz Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 23/05/2011, Especial Fundos de Investimentos, p. F1

Para o Valor, de São Paulo A indústria de fundos de investimento colhe neste início de 2011 os frutos do crescimento econômico experimentado no ano passado. Após o boom no consumo estimulado pelo crédito de 2010, o brasileiro percebeu que a hora é de investir. Esse sentimento é compartilhado por grandes investidores institucionais. Mas, no caso destes, trata-se de uma migração de ativos: após firme namoro com os CDBs, estão de volta aos fundos.

Para combater a inflação gerada pelo consumo, o governo apertou o crédito e a política monetária. O novo ciclo de alta dos juros despertou o interesse em poupar, e os fundos têm se mostrado alternativa mais atraente do que os seus principais rivais do período anterior, os CDBs e a caderneta de poupança. O patrimônio líquido da indústria atingiu R$ 1,77 trilhão em abril, com salto de 18,79% sobre igual mês do ano passado, de acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). A captação líquida de R$ 51,3 bilhões acumulada nos quatro primeiros meses foi recorde histórico da série iniciada em 2002.

Para o vice-presidente da Anbima, Demosthenes M. Pinho Neto, a expansão da indústria ainda é reflexo da consolidação da estabilidade monetária e a retomada do crescimento econômico do país. "Além disso, a indústria de fundos conta com excelente arcabouço regulatório, concentra esforços no desenvolvimento e adoção de melhores práticas, por meio da regulação voluntária privada, e possui gestores reconhecidos internacionalmente", diz ele.

A indústria, porém, ainda depende do vaivém dos investidores de grande porte. O avanço deste ano foi capitaneado por investimentos do poder público, que tende a aplicar mais no início do ano, e do segmento "corporate", aplicadores que utilizam os fundos na gestão de seus fluxos de caixa.

O desempenho dos fundos também persiste vinculado às conjunturas interna e externa, afirma o sócio-diretor da Quest Investimentos, Walter Maciel. A oscilação nos volumes captados reflete os humores dos grandes investidores, locais ou estrangeiros. De acordo com Maciel, a maior parte da captação de R$ 42,5 bilhões ocorrida no primeiro trimestre veio da volta aos fundos do dinheiro que havia sido sacado a partir de 2009 por fundações estatais e governos municipais. Daquele total, R$ 34,5 bilhões foram aplicações feitas por investidores considerados governamentais. Eles decidiram não renovar parte dos CDBs comprados desde 2009 para aproveitar as taxas elevadas oferecidas pelos bancos com o propósito de aumentar a captação de recursos e obter funding para atender à demanda por crédito. Mas em 2011 o cenário mudou e os grandes investidores migraram dos CDBs para os fundos.

A maior parte das novas aplicações foi conservadora. Destinou-se aos fundos de renda fixa clássicos, os mais rentáveis do ano. Segundo dados da Anbima, com rentabilidade de 3,9% nos primeiros quatro meses de 2010, eles são os líderes do ranking das melhores carteiras, seguidos muito de perto pela categoria multimercados, juros e moedas.

A conjuntura internacional voltou a misturar elementos muito complexos, como dúvidas em relação à expansão americana, recaídas na crise da periferia da Europa e crescimento econômico menor na China e com inflação. "Trata-se de um cenário típico para se fazer uma boa diversificação nos fundos", recomenda o superintendente-executivo da Santander Asset Management, Eduardo Castro.

Apesar do crescimento recorde das captações, os profissionais não devem se acomodar, no entender do chefe regional da HSBC Global Asset Management da América Latina, Pedro Bastos. Ele defende o lançamento de produtos criativos, destinados a "quebrar o carma do século passado", representado pela excessiva vinculação das carteiras ao CDI, desde que resguardem os postulados de transparência, responsabilidade e governança. O diretor da asset do Credit Suisse Hedging-Griffo, Luís Stuhlberger, diz que a desvinculação do CDI é um trabalho de aculturamento de longo prazo. As resistências são enormes porque o CDI contraria um postulado básico dos manuais de investimento. "Em nenhum lugar do mundo, há um ativo que proporcione, ao mesmo tempo, segurança, rentabilidade e liquidez. No Brasil, há", diz.

Na visão do diretor da Bradesco Asset Management (BRAM), Joaquim Levy, enquanto os juros permanecerem altos, a indexação ao CDI vai perdurar. E os juros estão hoje em elevação num momento em que se requer a criação de fundos de renda variável para angariar os recursos necessários ao financiamento das grandes obras de infraestrutura planejadas para os próximos anos.

Para o horizonte de curto prazo, não há muito jeito. Para Marcelo Mello, vice-presidente de investimentos da SulAmérica, a indústria de fundos tende a continuar a crescer este ano nas carteiras mais conservadoras, as de renda fixa e referenciadas no CDI.