Título: Gestão de centavos para avançar na classe C
Autor: Koike, Beth
Fonte: Valor Econômico, 24/05/2011, Empresas/Serviços, p. B4

De São Paulo

O mercado de planos de saúde encerrou o ano passado com aumento de clientes de 8,7% - maior variação já registrada pelo setor nos últimos dez anos. O bom desempenho foi puxado pela classe C que entrou no mercado de trabalho e representa uma parcela significativa dos 2,8 milhões de novos empregos criados no país em 2010. Mas, diferentemente de outros setores que estão lucrando com a classe popular ao apostar em escala, no mercado de plano de saúde não basta só oferecer um preço menor para um grande volume de clientes. A rentabilidade depende de um forte controle de custos, com uma ampla rede verticalizada.

As operadoras de saúde que atuam com público de baixa renda têm um risco maior, uma vez que o sinistro independe da classe social do beneficiário ou do valor que se paga pelo convênio médico. Trocando em miúdos: qualquer um está sujeito a internações em UTI, tratamentos de câncer ou outros procedimentos médicos que encarecem a conta hospitalar. Com isso, se o valor das mensalidades do plano de saúde for baixo e surgir uma ocorrência de custo alto, as contas da operadora podem fechar no vermelho no fim do mês.

Para não correr esse risco, as operadoras que atuam nesse segmento investem em rede verticalizada de hospitais, cujo custo é cerca de 30% inferior em relação aos hospitais não ligados a convênios médicos, e também em programas de prevenção para pacientes de doenças crônicas que representam aproximadamente 70% das despesas de uma carteira de plano de saúde.

Na Hapvida, operadora de saúde de Fortaleza, praticamente todos os serviços, desde o atendimento médico até o projeto arquitetônico dos hospitais, são realizados por empresas próprias do grupo cearense.

"Tentamos eliminar ao máximo o custo das intermediações. Por isso, temos desde atendimento médico até outros tipos de serviços como engenharia e plataformas tecnológicas próprias", disse Jorge Pinheiro, presidente da Hapvida. Um exemplo é o call center da operadora que proporciona uma economia de R$ 0,23 no custo final do plano de saúde da Hapvida.

A operadora também é dona de 20 hospitais, 12 prontos-atendimentos, 10 laboratórios e lavanderias, além das empresas de tecnologia, de engenharia e arquitetura. "Nossa empresa de tecnologia, a Haptec, desenvolveu softwares para biometria. Aqui, no Nordeste poucas pessoas têm planos de saúde e são comuns as fraudes de pessoas sem convênio usando a carteirinha de quem tem plano de saúde", explicou Pinheiro.

A Hapvida fechou o ano passado com uma carteira de 1 milhão de clientes e faturamento de R$ 754 milhões - receita proveniente das três operadoras de planos de saúde do grupo (Hapvida, Santa Clara a e Santa Saúde) além de outras empresas do grupo.

A paulista Intermédica, maior operadora voltada para a classe C, também aposta forte em gestão de doentes crônicos e uma rede de atendimento verticalizada com 93 centros clínicos, oito hospitais, nove prontos-socorros, entre outros. A Intermédica acompanha 46 mil portadores de doenças crônicas e consegue economizar até R$ 4 milhões, por mês.

O próprio fundador da Intermédica, Paulo Barbanti, faz uma gestão rígida de controle de custos de sua carteira de clientes. Tanto é que nessa nova fase de expansão da operadora e possível IPO (oferta inicial de ações) que está sendo tocados por Glauco Abdalla, sócio da Galeazzi, consultoria conhecida por reduzir despesas, não haverá um enxugamento de custos. A Intermédica registrou faturamento de R$ 1,5 bilhão no ano passado e tem mais de 2 milhões de vidas.

Uma das principais apostas de Barbanti, que agora está na presidência do conselho, é um programa de prevenção, cujo público-al vo, nessa primeira fase do programa, são as gestantes, que poderão ganhar prêmios se fizerem o pré-natal completo. A operadora se antecipou à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que lançou um projeto que pode vir a premiar beneficiários que adotarem programas de prevenção.

As operadoras que não atuam exclusivamente com a classe popular também criaram novos produtos para abocanhar uma fatia desse mercado, mas têm ciência das margens apertadas. "É um desafio trabalhar com esse público que tem uma grande demanda, mas oferece margem menor", disse Claudio Brabo, diretor comercial da Golden Cross, que tem 860 mil vidas.

Uma demonstração de que atuar no segmento de classe popular é uma combinação um pouco mais complexa é a quebra da Samcil, que chegou a ter mais de 700 mil beneficiários e atuava com o público de baixa renda.

Vale destacar que ter escala também é item relevante para o setor. O intenso processo de fusões e aquisições entre operadoras é uma demonstração de que ter volume conta muitos pontos no jogo. "Temos pouco mais de 1 mil operadoras de planos de saúde no mercado, sendo que 181 delas estão sob intervenção da ANS. Isso acontece porque cerca de 70% do total tem até 20 mil beneficiários. São poucos clientes e fica difícil diluir os riscos de alto custos", disse Luiz Augusto Carneiro, superintendente-executivo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS)

Atualmente, 45 milhões de pessoas têm planos de saúde. Desse montante, quase 60% são convênios médicos concedidos como benefício pelas empresas para seus funcionários. Por isso, quanto maior o número de carteiras de trabalho assinadas maior será o setor de planos de saúde. A Unimed-Rio, cooperativa médica que tem como principal cliente o setor de óleo e gás, é um exemplo de que está crescendo com essa demanda, uma vez que um dos pré-requisitos para uma empresa ser fornecedora da Petrobras é oferecer convênio médico para seus empregados.