Título: Piauí colhe os frutos da bonança
Autor: Pires, Luciano
Fonte: Correio Braziliense, 15/08/2010, Economia, p. 14

Estado reflete a virada econômica ao atrair 286 indústrias e acumular avanço de 100,47% em oito anos

Enviado especial

Teresina A nova geração de piauienses, muitos filhos de pequenos lavradores que nunca frequentaram uma escola, consolidou-se com trabalhadores da indústria, comércio e serviços locais. Atraídas pela política de incentivos tributários, 286 indústrias se instalaram ou estão em processo de implantação no estado só nos últimos oito anos. Os investimentos ultrapassaram os R$ 6 bilhões, puxados principalmente por empresas de grande porte, como Suzano e Vale. Os problemas estruturais, como a falta de saneamento básico na maior parte da capital do estado, são evidentes. Mas não o suficiente para desanimar grandes redes nacionais, como a bandeira de hipermercados Extra, que inaugurou a primeira unidade em Teresina há menos de um mês.

Nas ruas, os jegues cederam lugar às bicicletas e às motos. A geração de empregos, somada aos programas de transferência de renda, ajudou a construir um novo mercado consumidor com potencial ainda pouco explorado. Não foi por acaso que o Produto Interno Bruto (PIB) do estado apresentou variação positiva de 100,47% entre 2003 a 2010. A companhia aérea Azul, por exemplo, tem planos de operação de voos para a capital piauiense a partir do mês que vem: um alívio para os que sofrem com a falta de trajetos diretos para a cidade.

De acordo com dados da Secretaria de Fazenda do Piauí, a arrecadação do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) alcançou R$ 896,5 milhões no primeiro semestre de 2010, 22,6% a mais que no mesmo período do ano passado. O órgão argumenta que isso é uma prova do aumento do número de empresas contribuintes. Já a arrecadação do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) cresceu 16% no mesmo período, um sinal de que a população está comprando mais carros.

Papelão A chegada de novas empresas teve papel decisivo no crescimento da Nordeste Papelão, especializada na montagem e na impressão de embalagens feitas com papel ondulado. Há três anos, época que João Ribeiro Lima, 42 anos, assumiu a empresa, a demanda era de aproximadamente 30 mil caixas de papelão por mês. Hoje, é de 150 mil e continua crescendo mês a mês. Diante do cenário positivo, o empresário procurou o Banco Nacional do Nordeste (BNB) com objetivo de capitalizar a sua fábrica. Não quero só montar. Criarei a primeira fábrica de papelão do Piauí, promete. Ricardo Essinger, presidente em exercício da Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (Fiepe), avalia que o acesso ao crédito é fundamental para garantir a continuidade dos projetos públicos e privados. Segundo ele, o retorno é garantido.

Lima, por enquanto, sem acesso ao recursos, só consegue atender pequenos clientes, entre eles, os produtores de cajuína e ovos de codorna. A produtora de bicicletas Houston, por exemplo, precisa comprar embalagens de uma fábrica em Fortaleza. E a empresa precisará também cada vez mais de bicicletas, já que sua capacidade instalada aumentará 23% até 2011 (leia entrevista na página 16). O tema é de grande interesse do filho de agricultores Marcos Abdneis, 24 anos, já que conseguiu, na fábrica, seu primeiro emprego com carteira assinada há oito meses. Nenhum dos meus três irmãos seguiu o trabalho no campo: um está na indústria e os outros dois trabalham em uma borracharia e em um supermercado, conta. Filho de pais analfabetos, Abdneis parou no ensino médio, infelizmente um perfil que reflete a vida de muitos outros colegas, como o das amigas Valéria Soares, 20 e Naiana dos Santos, 27, que hoje recorrem às pedaladas diárias para ir e voltar ao trabalho.