Título: Macroprudenciais deram certo, diz Holland
Autor: Villaverde, João
Fonte: Valor Econômico, 06/06/2011, Brasil, p. A5

De Brasília Todo o esforço das autoridades econômicas deu e está dando certo. A avaliação é do Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, para quem a composição do Produto Interno Bruto (PIB) nos primeiros três meses do ano e a subsequente desaceleração esperada na atividade, ao longo do ano, no sentido de desanuviar a inflação, foram induzidas pela política econômica. O objetivo de "produzir um crescimento onde o ritmo do consumo se acomode em patamares menores e os investimentos sejam estimulados a ponto de crescer entre 2,5 e 3 vezes o PIB", foi alcançado no primeiro trimestre, mas demandará mais esforços. "Não vamos estrangular o consumo de massa no país, isso não faz o menor sentido. O que buscamos é um crescimento mais influenciado pelos investimentos", diz Holland. Para o economista, que é pós-doutor pela Universidade da Califórnia (EUA) e assumiu o cargo em janeiro, o "alarmismo" do mercado quanto à inflação já se dissipa, o que demonstra que as medidas macroprudenciais praticadas pelo Banco Central (BC) desde dezembro surtiram efeito.

São as taxas de juros definidas pelo BC, no entanto, o que mais preocupam o secretário. Entusiasta dos investimentos que foram anunciados pela Foxconn, que pretende produzir tablets no Brasil, Holland avalia que as taxas de juros elevadas podem comprometer os objetivos do governo de sustentar o acelerado ritmo dos investimentos. "O BC elevou as taxas de juros em 1,25 ponto percentual neste ano. Só este aperto, em seis meses, representa toda a taxa de juros praticada nos países da OCDE", afirma Holland, em referência à organização que representa as economias mais desenvolvidas do mundo. Abaixo, os principais trechos da entrevista.

Valor: O crescimento do primeiro trimestre, com investimentos fortes e consumo das famílias em ritmo suave, agradou o governo?

Márcio Holland: O esforço da equipe econômica foi todo neste sentido, de gerar um crescimento econômico sustentável, que é aquele puxado pelos investimentos e que não gera pressão inflacionária. O que está na mente das autoridades econômicas, isto é, do Ministério da Fazenda, do Planejamento e do Banco Central é produzir um crescimento onde o ritmo do consumo se acomode em patamares menores e os investimentos sejam estimulados a ponto de crescerem entre 2,5 e 3 vezes o PIB.

Valor: É possível manter esse ritmo de acomodação do consumo?

Holland: Sem dúvida. Mas é importante perceber que a perda no consumo é relativa, uma vez que ele continuou crescendo, apenas registrou uma variação menor que o conjunto da economia. Não vamos estrangular o consumo de massa no país, isso não faz o menor sentido. O consumo é extremamente importante para a economia brasileira, que depende muito do mercado doméstico. Aliás, com a crise global e o crescimento fraco em quase todo o mundo, ele fica ainda mais importante. O que buscamos é um crescimento mais influenciado pelos investimentos. Queremos um equilíbrio na atividade, para que ela não cresça apenas via consumo.

Valor: Mas com o aperto impulsionado pelo governo - juros, corte de gastos e medidas macroprudenciais -, além do próprio arrefecimento do consumo, é possível ter o investimento crescendo forte ao longo do ano?

Holland: O esforço do governo, hoje, está justamente aí. Queremos e precisamos aumentar a taxa de investimento na economia, especialmente na infraestrutura, que produz um efeito em cadeia poderoso na atividade. O PAC 2 é muito importante nesse sentido, ao melhorar as condições dos portos, o que, condicionado aos esforços recentes na questão dos aeroportos, melhorará muito a mobilidade urbana. Além disso, há um enorme esforço para ampliar, nas empresas, os gastos com inovação tecnológica. O caso da Foxconn está sendo uma espécie de modelo do que queremos fazer em todos os setores. Ou seja, não queremos as empresas apenas juntando peças e montando produtos. Queremos que o Brasil seja capaz de produzir tablets, smartphones etc. Precisamos estimular fortemente a rede doméstica de software. Os incentivos que oferecemos vão todos nessas duas direções: a de não deixar que o investimento forte do primeiro trimestre se esgote, e a de dar cada vez mais qualidade ao investimento produtivo no país.

Valor: O início do ano trouxe também um debate acalorado sobre inflação. Um ritmo de crescimento menos acelerado pode reduzir a pressão inflacionária?

Holland: Quando o Banco Central e a Fazenda começaram a praticar as medidas macroprudenciais e a restrição ao ingresso de capitais do exterior, o mercado recebeu as iniciativas com relativo ceticismo. Queriam que o BC praticasse o tradicional, isto é, que elevasse muito os juros e, com isso, resolvesse tudo. Havia um alarmismo no mercado quanto ao ritmo de crescimento de 2010 e quanto daquilo poderia contaminar 2011, e havia também muito alarmismo com as macroprudenciais. Agora esse alarmismo se dissipa, porque os resultados estão sendo entregues. As expectativas de inflação estão convergindo, semana após semana, para uma inflação próxima a 6% no fim do ano. Vivemos hoje um processo de descompressão de preços. E isso ocorre porque as macroprudenciais tiveram efeito. Quando criticam o governo, dizendo que a inflação continua alta, estão olhando o retrovisor, estão olhando a inflação nos últimos 12 meses. Mas a meta do BC serve para os 12 meses entre janeiro e dezembro. O que importa é entregar, em dezembro, uma inflação dentro da meta do BC.

Valor: Mas mesmo com todas as medidas alternativas, o BC eleva os juros desde janeiro...

Holland: O BC aumentou as taxas de juros em 1,25 ponto percentual em 2011. Só este aperto, em seis meses, representa toda a taxa de juros dos países da OCDE. Então é claro que algum efeito sob a atividade esse aperto já produziu.

Valor: O que lhe preocupa mais?

Holland: O fato de termos, ainda, a maior taxa de juros real do mundo. Uma das maiores contribuições deste governo para o país será gerar políticas que preparem a economia brasileira para viver em uma conjuntura de juros reais em linha com o que é praticado no resto do mundo. Quando isso ocorrer, resolveremos uma série de problemas. Não teremos que gastar cerca de US$ 200 bilhões por ano com encargos da dívida, o custo de carregamento de nossas reservas internacionais será muito menor, o incentivo ao fluxo de capitais será reduzido e, perderemos o viés de valorização da taxa de câmbio.