Título: Palocci aposta em divisão no governo e nos partidos da base
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 06/06/2011, Política, p. A10

De Brasília Depois de passar o fim de semana em São Paulo, o ministro Antonio Palocci volta hoje a Brasília com compromissos marcados na agenda até o fim da semana, inclusive um com senadores, para tratar do Código Florestal. Embora procure aparentar tranquilidade, Palocci sabe que está fragilizado no cargo e conta com a divisão existente no governo e nos partidos da base aliada para se manter na Casa Civil. A presidente da República, Dilma Rousseff, também tem dúvidas sobre a demissão de seu ministro, cuja evolução patrimonial está sob suspeição: foi multiplicada por 20 em apenas quatro anos, entre 2006 e 2010, período em que Palocci era deputado federal e chefiou a vitoriosa campanha eleitoral de Dilma. O argumento é que não é possível condenar alguém sem provas, com base apenas em indícios. Essa é a mesma opinião manifestada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a líderes do PT, na volta de uma viagem que fez a Cuba.

Em princípio chegou a ser noticiado que Lula iria ontem a Brasília discutir a situação de Palocci com Dilma. A viagem não se confirmou. Na avaliação de petistas, a interferência aberta de Lula somente agravaria as suspeitas de tutela levantadas quando o ex-presidente esteve em Brasília, há duas semanas, no pico da crise política, provocada pelas acusações a Palocci e a derrota sofrida pelo governo na votação do Código Florestal. Lula tem o mesmo ponto de vista de Dilma em relação a provas e tem repetido aos petistas que não se deve "abandonar" um companheiro.

Nesse aspecto será fundamental o pronunciamento do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, o que Palocci espera que aconteça até o fim da semana. Gurgel pediu novas informações ao ministro mas não marcou data para apresentar seu parecer sobre as suspeitas de prática do crime de tráfico de influência. Palocci só sairá espontaneamente, afirmam seus assessores, se o parecer lhe for desfavorável. Do contrário, deixará para a presidente a decisão de demiti-lo.

Mas tanto Dilma quanto o ex-presidente avaliam a extensão da crise em função da governabilidade. Ao manter intacta sua agenda para esta semana, Palocci aposta numa das soluções em análise: ele ficaria menor politicamente na Casa Civil, voltado mais para dentro do governo, como aconteceu em 2004 quando o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, foi atingido por denúncias de que um auxiliar direto, Waldomiro Diniz, pedira propina a um bicheiro. Na ocasião foi criado o que corresponde hoje ao Ministério das Relações Institucionais. Mas para que essa nova modelagem funcione o governo precisa efetivamente dar "caneta" (poder para liberar emendas e nomear) para o ministro Luiz Sérgio.

Palocci conversou com Dilma após a entrevista que concedeu na sexta-feira ao "Jornal Nacional", uma exigência de setores do PT e do próprio governo. Segundo os aliados do chefe da Casa Civil, a presidente disse que gostara da manifestação pública de Palocci, especialmente quando ele ressaltou que não há uma crise de governo, mas um problema pessoal dele, ministro Antonio Palocci. Mas uma grande parte dos líderes da base aliada do governo considera falso esse argumento, segundo apurou o Valor: se a crise é pessoal, o problema é de todo o governo (que se desgastou e se fragilizou no Congresso).

Antes de afastar Palocci, se fizer essa opção, a presidente também quer se assegurar de que resolverá o problema da sustentação política do governo, um dos problemas da crise. A cúpula do PT se manifesta favorável à permanência do ministro. O presidente do partido, Rui Falcão, disse ontem que estava "sinceramente convencido" de que Palocci não cometera crime algum. Mas pelo menos duas correntes da sigla querem a cabeça do ministro: Mensagem e Tendência. A suposta substituição de Palocci pela diretora da Petrobras Maria das Graças Foster teria levado o grupo do ex-ministro José Dirceu a avaliar que, ruim com Palocci, pior será com um estranho. A cúpula do PMDB também tem se pronunciado a favor da manutenção de Palocci, mas defende a mudança do modelo de coordenação política, na qual quer ter mais peso e influência.

Na entrevista ao "Jornal Nacional", Palocci insistiu que não fez tráfico de influência por meio da empresa de consultoria que manteve paralelamente ao seu mandato como deputado federal. "Minha empresa jamais atuou junto a órgãos públicos, ou diretamente prestando consultoria para órgãos públicos ou representando empresas privadas nos órgãos públicos", frisou. "O que eu fazia era uma consultoria para empresas privadas".

O ministro também negou que as contas de sua empresa pudessem estar misturadas a doações eleitorais. "Não existe nenhum centavo que se refira a política", afirmou ele, categoricamente. Palocci procurou dar um tom político às denúncias quanto ao seu patrimônio e enfatizou que se trata de uma questão dirigida a ele, "com forte intensidade, com forte conteúdo político".

Por estar sob pressão política, Palocci disse não achar correto revelar quem eram seus clientes. "Acho que não tenho o direito de fazer a divulgação de terceiros". Ele se limitou a citar setores de atuação desses clientes: vários segmentos de indústria, serviços financeiros, mercado de capitais, bancos e empresas, fundos de mercado de capitais e serviços em geral. "É um conjunto de empresas que pouco tem a ver, por exemplo, com obras públicas, com investimentos públicos. São empresas que vivem da iniciativa privada e que consideraram útil o fato de eu ter sido Ministro da Fazenda, de ter acumulado uma experiência na área econômica, de conhecer a área econômica".

Palocci não forneceu números exatos sobre o faturamento de sua consultoria. Para explicar quantias publicadas pela "Folha de S.Paulo" (a receita teria sido de R$ 20 milhões em 2010, sendo R$ 10 milhões só em novembro e dezembro), o ministro lembrou que encerrou as atividades da empresa antes de assumir o ministério. Por isso, afirmou, pagamentos relativos a serviços prestados anteriormente teriam se concentrado nos dois últimos meses de 2010. (Colaborou Fernando Travaglini)