Título: A meta de inflação de 2013
Autor: Giambiagi, Fabio
Fonte: Valor Econômico, 01/06/2011, Opinião, p. A11

Considerando que estamos nos aproximando do meio do ano, passa a ser pertinente iniciar o debate acerca da definição da taxa de inflação de 2013, a ser tomada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) este mês.

O sucesso do sistema de metas de inflação é inquestionável. Basta dizer que, nos 6 anos transcorridos até agora nos quais a meta de inflação foi desde o início estabelecida em 4,5% (2005/2010), a inflação conforme o IPCA, foi de 4,9%. Em um país com grande propensão a acomodar as pressões relaxando as normas do que quer que seja, tal aderência dos fatos a um compromisso é um feito do qual todos os brasileiros podem se orgulhar: o nosso Banco Central (BC), no período, foi bom, mesmo!

Por outro lado, o valor da meta dos últimos anos passa a muitos economistas - entre os quais me incluo - um certo ar de tarefa inconclusa, uma vez que a meta é algo elevada comparativamente ao padrão que prevalece na grande maioria dos países, tenham eles metas de inflação ou não.

Citem-se dois casos, apenas como exemplos: a) os EUA, país desenvolvido e sem regime de metas, teve uma inflação anual média ao consumidor, nos últimos 20 anos, de 2,6 % ao ano; e b) o Chile, economia emergente e com regime de metas de inflação, já no período mais recente dos últimos 10 anos, teve uma inflação média ao consumidor de 3,1%. Nesse mesmo período dos últimos 10 anos, para citar outros casos, as taxas médias de inflação ao consumidor foram de 1,6% na Alemanha; 2,3% na China; e 3,2% na Coreia do Sul. Pode-se afirmar que uma meta de 4,5% deixa o Brasil em situação embaraçosa?

Não: isso seria ridículo, pois há vários países cujas economias vão bem e apresentam taxas maiores do que as nossas. Porém, objetivamente, a meta é superior à média dos países com metas de inflação e também à média do universo de economias emergentes desse grupo específico. Mesmo reconhecendo - como se depreende da simples observação das informações referentes aos diversos países - que a inflação das economias emergentes é ligeiramente superior à dos países avançados, não necessariamente haveria razões para que o Brasil destoasse do conjunto das economias emergentes que têm regimes de metas.

Um elemento importante a lembrar na discussão é o risco de "erro de viés" em que o país pode incorrer, em função das pressões políticas, ao implementar a perseguição a uma determinada meta. Explico: se a meta é 4,5% e a inflação num determinado ano é 5,5%, por exemplo, o governo sempre pode se explicar sem maiores problemas de forma convincente diante do mercado, sinalizando com o retorno da inflação à meta no ano posterior, como de fato já chegou a ocorrer no Brasil.

Entretanto, se a inflação fica muito abaixo da meta, o presidente da República - qualquer que seja - fica com a amarga sensação de ter pago um custo político à toa, por ter praticado um juro desnecessariamente alto, com riscos de que o Banco Central seja crucificado por ter sido "mais realista do que o rei". Isso pode introduzir um viés típico: uma inflação um pouco maior do que a meta não gera muitos problemas, mas ficar abaixo da meta é politicamente penoso, a inflação efetiva pode ser, em média, algo maior do que a meta. Diga-se de passagem, o fato de a inflação média do período de 6 anos em que a meta foi de 4,5% ter sido de 4,9% é de certa forma revelador disso. Se assim for, ter uma meta pode significar que, na verdade, na média, nos anos seguintes a inflação pode ser algo maior que tal alvo. Essa é uma das boas razões - além da nossa ser maior que a dos demais países que têm "inflation target" - para reduzir nossa meta.

Acrescente-se a isso que em 2011, especificamente, no começo do ano surgiram dúvidas que pareciam dissipadas acerca do compromisso das autoridades com o regime e que o governo promete - ainda enfrentando certa desconfiança - que em 2012 a inflação retornará à meta. Ora, se a inflação em 12 meses está se aproximando de 7% e o governo confia plenamente em "entregar" uma taxa de 4,5% em dezembro do ano que vem, não há razões para abortar esse movimento, "congelando", no caso, a taxa, em 4,5%.

Uma meta de 4,5%, conquanto justificável durante uma fase de transição - que pode durar alguns anos, como de fato tem ocorrido - não parece adequada, à luz dos indicadores internacionais, se for fixada em caráter permanente.

Com base nas considerações acima expostas, uma boa política para ser aprovada este mês poderia ser adotar uma meta de inflação de 4% para os 4 anos do período 2013/2016. Ao apontar para uma taxa menor do que a atual, isso 1) reforçaria o comprometimento com a meta de 2012; e 2) daria uma sinalização de continuidade para os anos posteriores. Quem for presidente em 2015 definiria então que taxa perseguir a partir de 2017, diminuindo a meta ou mantendo-a "sine die". A curto prazo, porém, creio que diminuir a meta por um período de 4 anos é a opção mais razoável a ser seguida.

Fabio Giambiagi, economista, co-organizador do livro "Economia Brasileira Contemporânea: 1945/2004" (Editora Campus), escreve mensalmente às segundas-feiras. E-mail: fgiambia@terra.com.br.