Título: Extinção ameaçada
Autor: Sales, Claudio J. D.
Fonte: Correio Braziliense, 16/08/2010, Opinião, p. 13

Presidente do Instituto Acende Brasil

Oconsumidor de energia deve comemorar, em 31 de dezembro próximo, a extinção da cobrança na conta de luz de um encargo conhecido como RGR. Mas, para que isso ocorra, é importante mostrar aos nossos representantes no Congresso Nacional que estamos todos contando dias, horas, minutos e segundos para o fim do mais antigo imposto específico do setor elétrico. A redução da carga tributária sobre a tarifa de eletricidade não ocorrerá sem a observação atenta e pressão da sociedade.

A contagem regressiva para a extinção da RGR pode ser acompanhada em www.acendebrasil.com.br. A vigilância é necessária porque grupos de pressão já se movimentam para, mais uma vez, perpetuar a cobrança desse encargo.

Criada em 1957 para cobrir indenizações a empresas estatais ou privadas em caso de eventuais reversões à União de concessões de energia elétrica, os montantes arrecadados são depositados num fundo gerido pela Eletrobras.

É fundamental esclarecer que a lei prevê apenas a extinção da cobrança do encargo em 31 de dezembro de 2010. O Fundo da RGR permanecerá à disposição do setor elétrico. Aliás, o objetivo original da RGR deixou de fazer sentido: nas últimas décadas, as concessões receberam tratamento diferente que dispensou a necessidade de recorrer ao fundo para o pagamento de reversões.

Atualmente, a RGR é usada para custear iniciativas como o subsídio para o consumidor de baixa renda, fontes renováveis e o programa de universalização (Luz para Todos), programa cuja meta será cumprida ainda este ano.

Os que tentarão manter a cobrança dirão que a RGR é necessária para arcar com os programas referidos. O argumento não se sustenta. Em primeiro lugar, já há outros encargos na conta de luz que cobrem os mesmos propósitos da RGR, como o Proinfa (subsídio ao Programa de Incentivo a Fontes Alternativas) e a CDE (Conta de Desenvolvimento Energético, que inclui desenvolvimento de fontes alternativas, universalização e subsídio a consumidores de baixa renda). Em segundo lugar, a maior parte das aplicações da RGR se dá na forma de financiamentos que, quando quitados, retornam ao fundo para novas aplicações.

A história tem demonstrado que, além da ameaça de prorrogação o encargo deveria ter sido extinto em 2002, mas foi prorrogado até 2010 pela Lei nº 10.438/02 há ainda o risco permanente de desvio de sua finalidade.

Exemplo recente: no primeiro semestre, o governo federal cogitou publicar medida provisória para aplicar os recursos da RGR numa operação de salvamento da Celg, estatal goiana que nas últimas décadas foi vítima de gestão temerária e hoje enfrenta situação financeira precária.

Segundo estudo da Pricewaterhouse Coopers, a carga de tributos e encargos sobre o setor elétrico brasileiro é de 45%. Ou seja: de cada R$ 100 da conta de luz, R$ 45 são destinados a impostos (como ICMS e PIS/Cofins) e a encargos como RGR, CDE e CCC. E, já que mencionamos a CCC (Conta de Consumo de Combustível), vejamos o que acaba de acontecer com esse encargo para que fique clara a possibilidade de más notícias envolvendo a RGR a partir de ações do governo ou do Congresso.

A CCC encargo recolhido para custear o combustível usado nas termelétricas que atendem aos sistemas isolados na Região Norte do país deveria ser reduzida à medida que tais sistemas isolados fossem integrados ao Sistema Interligado Nacional pela construção de linhas de transmissão. Havia inclusive prazo limite para sua extinção.

Entretanto, no ano passado, por meio da Medida Provisórianº 466, convertida na Lei nº12.111, o governo lhe ampliou o escopo. Resultado: em 2010, a CCC-Isol será de R$ 4,8 bilhões, quase o dobro do montante do ano anterior, de R$ 2,5 bilhões. Você, consumidor, que pagará os R$ 2,3 bilhões adicionais, sabia disso? Pois é...

Na última década, a RGR representou cerca de 1,5% da tarifa. A arrecadação em 2009 foi de R$ 1,6 bilhão e o fim de sua cobrança será raro episódio de diminuição da pesada carga tributária sobre a conta de luz. Diante desse cenário, em 1º de junho foi apresentado no Senado Federal o Requerimento nº 585/2010, solicitando que o ministro de Minas e Energia informe o saldo acumulado no Fundo da RGR e confirme o fim da cobrança nas contas de energia em 2010. O Senado aguarda resposta. Os consumidores também.