Título: Derrota faz Dilma corrigir estratégia política
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 30/05/2011, Política, p. A5

De Brasília

A derrota na votação do Código Florestal na Câmara levou o governo a admitir que errou na coordenação política e na relação com a base aliada no Congresso. Os líderes não comandaram os deputados, os ministros não deixaram claras suas posições, as opiniões da presidente Dilma Rousseff não chegaram ao plenário da Câmara. O desastre levou o Palácio do Planalto a repensar sua atuação: a presidente, que até o dia 23 de maio tinha recebido apenas dez parlamentares, almoçou na quinta-feira com a bancada de senadores do PT e nesta semana vai reunir-se com senadores pemedebistas.

A princípio, a pauta da conversa com os senadores - Dilma receberá toda as bancadas que apoiam o governo - será a tramitação do Código Florestal na Casa. Mas não será uma estratégia passageira, decidida em momento de crise. O governo avalia que precisa mudar a forma como se relaciona com seus aliados. "A derrota no Código é o resultado dessa desorganização. Perdemos até no discurso: os verdadeiros derrotados foram os ambientalistas, não nós. Mas ninguém acredita nisso", lamentou um assessor graduado do governo.

Apesar disso, o diagnóstico de que tudo estava errado não foi imediato. No dia seguinte ao da votação, o ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, ligou irritado para o vice-presidente, Michel Temer. Em uma conversa muito dura, transmitiu um recado claro de Dilma: "A presidente quer saber se o PMDB é ou não governo". Temer não se intimidou com o questionamento e também reagiu irritado: "O PMDB é governo. Mas você sabe que a votação do Código não é um assunto de governo e oposição."

A relação direta entre os dois começa a ser restabelecida lentamente. Já havia um descontentamento por parte do PMDB com o fato de, após conduzir as primeiras negociações sobre o Código Florestal, Temer ter sido alijado das negociações finais. Mas na quinta-feira, durante café da manhã com os pemedebistas dissidentes, o vice pediu um voto de confiança em Palocci e conseguiu, por enquanto, demover os correligionários de apoiar uma CPI para investigar o chefe da Casa Civil.

A relação com o PMDB pode ser tensa, mas poucos acreditam em um rompimento do partido com o governo. Basicamente, porque isso seria uma tática suicida para a legenda e a decretação de um racha interno. "Sempre haverá uma parte do PMDB apoiando o governo Dilma. Quem quiser briga, acabará isolado na legenda", acredita uma ex-autoridade que acompanhou de perto as articulações para trazer o PMDB para a chapa presidencial de Dilma.

Não está claro, ainda, se a nova postura do governo na relação com os aliados significará uma mudança de atitude de Palocci. Nas conversas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o PT e outros senadores aliados houve muita reclamação sobre o chefe da Casa Civil, considerado por boa parte dos queixosos como alguém inacessível ou pouco afeito ao diálogo com o Congresso.

Um experiente analista da cena política brasiliense acredita que Palocci tornou-se alvo de ataques por passar a imagem - ou não ter forças para desmistificar a versão corrente - de ser extremamente poderoso, quase um fiador do governo Dilma. "Como é quase impossível derrubar-se um presidente, fica mais fácil bater em ministros poderosos. Mas é preciso lembrar que quem tem voto é o presidente, não um ministro", afirmou uma fonte credenciada. "Enquanto as pessoas acharem que ele é poderoso, Palocci continuará na berlinda", completou.

Aliados do ministro refutam a tese de que Palocci assumiu uma posição de supremacia: "O poder que ele eventualmente tem é o poder dado pela presidente Dilma Rousseff." Argumentam, por exemplo que a Casa Civil atual está muito mais "desidratada". Saíram de sua atribuição o gerenciamento de grandes programas, como o PAC e o Minha Casa, Minha Vida, permanecendo, na essência, apenas a análise jurídica dos projetos coordenados pelo governo e o assessoramento direto à presidente.

O poder de Dilma não está ameaçado nem mesmo com a recente incursão de Lula a Brasília. O ex-presidente conversou com senadores de todos os partidos - há quem considere isso um exagero, preferindo que a atuação dele ficasse restrita ao PT -, jantou com Dilma e Palocci e foi o principal artífice da mudança de estratégia política do governo.

Essa não é a primeira vez que Lula ajuda a pupila. Quando o governo negociava com as centrais sindicais o reajuste do salário mínimo, Lula chamou as centrais de "oportunistas", em entrevista em Dacar, onde participava do Fórum Social Mundial. "Ele tem uma relação com a Dilma de pai e filho. A vinda dele à Brasília foi para mostrar que a presidente não está sozinha e repetir o bordão: mexeu com a Dilma, mexeu comigo", disse um amigo do ex-presidente.