Título: Aperto na oferta de etanol deve voltar em 2012
Autor: Batista, Fabiana
Fonte: Valor Econômico, 30/05/2011, Agronegócios, p. B12

De São Paulo

O cenário de escassez de etanol visto neste ano pode se repetir em 2012. Isso porque, na melhor das hipóteses, a oferta que virá das usinas será a mesma do ano passado. Além disso, o tamanho da demanda pelo combustível ainda é uma incógnita.

A União da Indústria da Cana-de-açúcar (Unica) já admite revisar para baixo suas estimativas de produção para o setor. A razão é que a quantidade de açúcar na cana-de-açúcar, o chamado ATR, está muito abaixo do esperado. No acumulado desde o início da moagem atual (safra 2011/12), a concentração do açúcar na cana foi de 108,77 quilos por tonelada, 8,51 quilos a menos do que o observado em igual intervalo da safra passada.

A consultoria Datagro já revisou para baixo sua estimativa. Em vez de 561,32 milhões de toneladas de cana projetados em abril, o Centro-Sul deve processar 554,1 milhões de toneladas, conforme a nova previsão. A quantidade de açúcar (ATR) na cana também foi reduzida de 142,16 quilos por tonelada para 140,5 quilos. A Datagro encolheu ainda a estimativa para a produção de etanol, de 25 bilhões de litros para 24,1 bilhão de litros.Se a quebra de safra, que começou em abril, for mais acentuada do que o previsto, o setor terá dificuldades para direcionar mais caldo da cana para produzir etanol. O motivo, explica Plínio Nastari, presidente da Datagro, é que 90% a 95% da exportação de açúcar já estão vendidas por meio de contratos antecipados.

A demanda por etanol também pode contribuir para o quadro de aperto. Especialistas consideram que os atuais preços do álcool (que recuaram após fortes picos em abril) estimulam o consumo.

Além disso, a demanda externa pode surpreender. Neste momento, por exemplo, começa a ser abrir uma "janela" de oportunidade de exportação de etanol aos Estados Unidos, variável até agora fora das previsões do mercado.

"Vamos ter problemas com etanol. Não será possível abastecer o mercado sem uma medida para diminuir o consumo, como redução da mistura [de etanol na gasolina]", diz Julio Maria Borges, da JOB Consultoria.

Preços mais altos ao consumidor também poderiam conter o consumo. Mas neste momento, diz Plínio Nastari, as distribuidoras de etanol trabalham sob uma certa pressão governamental para segurar a inflação.

Projeção feita pela FG Agro, consultoria econômica com sede em Ribeirão Preto (SP), indica que os preços do etanol deveriam estar 9% maiores do que os atuais. Os cálculos visam saber qual seria o preço médio ideal de etanol no ano para equilibrar a oferta disponível com a demanda projetada.

Considerando os preços futuros (de maio de 2011 a abril de 2012) do etanol hidratado posto em Paulínia (indicador Esalq/BM&F), o valor médio hoje é de R$ 1,155 mil por m3. O "ponto de equilíbrio" seria R$ 1,26 mil por m3, segundo Luiz Gustavo Torrano Corrêa, sócio da FG Agro.

Ele pondera que alguma correção já vem acontecendo. Há dez dias, por exemplo, a mesma média estava menor, em R$ 1,089 mil por m3. "O mercado precisa perceber e antecipar que a oferta será menor do que a demanda. Se o preço ficar "errado", aumenta a chance de não ter etanol suficiente para atravessar a entressafra", diz Corrêa.

Mas Antônio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da Unica, vê um cenário de equilíbrio. Os preços estratosféricos de etanol no mês de abril fizeram com que o consumo se resumisse a 500 milhões de litros, ante a média mensal de 1,3 bilhão de litros registrada no ano passado, quando os preços estavam baixos. Agora em maio, diz Pádua, a demanda por hidratado deve subir para 1 bilhão de litros. "Já ganhamos fôlego com esses dois meses de consumo baixo", diz. Resta assim uma oferta de 15 bilhões de litros para os próximos dez meses de safra.

No que diz respeito ao mercado externo, o setor ainda não trabalha com a possibilidade de haver exportações de etanol combustível. A Datagro, por exemplo, prevê embarques de 1,82 bilhão de litros nesta safra, o volume todo para fins industriais.

No entanto, diz Tarcilo Rodrigues, da comercializadora de etanol Bioagência, começa a valer a pena exportar o biocombustível aos EUA, que por mais de um ano ficou "fechado" ao Brasil. Isso porque vigora neste ano a política de pagamento de prêmio às misturadoras do país que usarem o chamado "combustível avançado" (emite 50% menos gases de efeito estufa que a gasolina), categoria na qual apenas o etanol de cana se encaixa até hoje.

Atualmente, esse prêmio é de cerca de US$ 0,70 por galão sobre a cotação do etanol de milho nos EUA, calcula Rodrigues. Isso representa remuneração de cerca de US$ 700 por m3 posto no porto de Santos (SP). Em reais e retirado da usina paulista, esse valor fica ao redor de R$ 1,029 mil por m3.

Apesar de avaliar que o mercado de etanol vai se autorregular, Plínio Nastari reconhece que os estoques serão novamente apertados, apesar de maiores. A consultoria prevê estoque efetivo (estoque e produção da safra seguinte) de 770 milhões de litros em 30 de abril de 2012, ante os 432 milhões do fim de abril deste ano. O ideal seria entre 800 milhões e 900 milhões de litros.