Título: Dólar abaixo de R$ 1,60 chama BC para o jogo
Autor: Campos, Eduardo
Fonte: Valor Econômico, 30/05/2011, Finanças, p. C2

Todo o fim de mês a mesma história se repete no mercado de câmbio. A pressão de venda aumenta assustadoramente e o Banco Central (BC) corre para suavizar o movimento de baixa do dólar.

A sexta-feira foi exemplo claro disso, com o dólar rompendo a linha de R$ 1,60 e o BC voltando a fazer duas compras por dia no mercado à vista e comunicando sondagem para leilão de swap cambial reverso. Salvo algum evento muito fora a curva, o pregão de hoje e de terça-feira devem repetir o mesmo roteiro.

O diretor de tesouraria do Banco Prosper, Jorge Knauer, resume bem a questão: a taxa de câmbio local perde algumas de suas correlações históricas e o que manda é a vontade dos vendidos em montar posição. "Mais uma vez, vemos aquela pressão especulativa que já conhecemos."

Todo o fim de mês acontece a formação da Ptax (média das cotações ponderada pelo volume) que liquida os contratos que não são rolados de um mês para o outro. Nesse período, comprados (que ganham com a alta do dólar) e vendidos (que ganham com a queda do dólar) medem força visando rentabilizar seus contratos. E pelos últimos dados disponíveis, os vendidos estão bem dispostos a ganhar a briga mais uma vez.

Fim de mês traz pressão especulativa no câmbio

No pregão da última quinta-feira, o estrangeiro vendeu US$ 2,889 bilhões em contratos de dólar no mercado futuro, elevando o montante vendido para US$ 10,613 bilhões. Cabe lembrar que no dia 5 de maio essa posição era de apenas US$ 2,96 bilhões.

Além do arranjo em dólar futuro, o não residente tem posição vendida de US$ 8,165 bilhões em cupom cambial (DDI - juro em dólar). Com isso se chega a um estoque vendido de US$ 18,778 bilhões, o maior desde o fim de abril.

O mercado futuro é um jogo de soma zero, ou seja, se alguém vende dólar outro compra. Quem atua como contraparte do estrangeiro são os bancos, que apresentam estoque comprado de US$ 12,868 bilhões, sendo US$ 7,590 bilhões em dólar futuro e US$ 5,278 bilhões em cupom cambial.

Esse estoque comprado dos bancos é o maior do mês.

Vale lembrar que os bancos dispõem de outras formas de exposição cambial, como mercado à vista (onde estão vendidos em US$ 7,817 bilhões), derivativos e contratos de balcão. Portanto, não é possível saber a posição líquida das instituições. Outros agentes com relevante posição comprada na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) são as outras instituições jurídicas financeiras, com US$ 4,925 bilhões em contratos de dólar futuro.

No pregão de sexta-feira, além do fator Ptax, a venda de moeda americana também encontrou respaldo no câmbio externo. O euro teve firme ajuste de alta, chegando a testar a linha de US$ 1,43. E o Dollar Index, que mede o desempenho da divisa americana ante uma cesta de moedas, caiu para linha dos 74,9 pontos, menor leitura em duas semanas.

Por aqui, o dólar comercial encerrou o dia com baixa de 0,98%, maior perda diária desde 7 de abril, negociado a R$ 1,601. Na mínima do dia, a moeda foi a R$ 1,598.

O volume estimado para o interbancário não foi dos mais expressivos, somando US$ 1,3 bilhão. O parco movimento não foi exclusividade do dólar. Bolsa e juros também movimentaram pouco dinheiro, parte disso reflexo do feriado que deixa o mercado americano fechado nesta segunda-feira.

Na BM&F, o dólar para junho apontava queda de 1,36%, para R$ 1,595 na venda, antes do ajuste final. Esse hiato (gap) de preço entre à vista e futuro deve ser fechado agora pela manhã, ou seja, o R$ 1,60 do dólar comercial não deve sobrevir à abertura.

O contrato para julho, que cresce em liquidez, se desvalorizou 1,22%, a R$ 1,6075.

Depois de sete pregões fazendo apenas uma compra por dia, o BC voltou com as atuações duplas. Uma pela manhã e outra no fim da tarde. Além disso, a autoridade monetária anunciou que vai consultar a demanda para fazer leilão de swap reverso. Até aí tudo bem, o BC vem mesmo rolando os swaps conforme eles vencem. O que chamou atenção foi o horário da comunicação, 15h30. Geralmente esses alertas saem após o fechamento.

Tal postura deixou clara impressão de que dólar abaixo de R$ 1,60 tira o BC de sua "zona de conforto".

Nesta semana, atenção ao Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre, que sai na sexta-feira. Antes disso, os investidores conhecem o IGP-M de maio, que sai agora pela manhã. E no decorrer do período sai a nota de política monetária e operações de crédito, o resultado primário e a relação dívida/PIB. No campo externo, as atenções se voltam aos dados sobre o mercado de trabalho americano.

Eduardo Campos é repórter

E-mail eduardo.campos@valor.com.br