Título: Dilma estuda liberar mais verbas
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Fonte: Valor Econômico, 15/06/2011, Política, p. A9

A presidente Dilma Rousseff estuda rever o posicionamento sobre duas das principais demandas do Congresso que geraram insatisfação na base aliada nesses primeiros meses de mandato: o decreto que cancelou parte dos restos orçamentários a pagar e o empenho (promessa de despesa) de recursos provenientes de emendas parlamentares do Orçamento de 2011.A solução que está sendo avaliada pelo Palácio do Planalto passa pelo empenho de pelo menos metade das emendas deste ano e pela prorrogação, até o fim do ano, do prazo para que sejam iniciadas obras de restos a pagar referentes a 2009.

Caso seja efetivado, será a segunda concessão de Dilma feita a parlamentares referente ao assunto. No último dia do seu mandato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva cancelou todos os restos a pagar decorrentes desses três anos. Em 29 de abril - antes, portanto, da crise política - Dilma sucumbiu em parte à pressão e expediu um decreto no qual preservou esses valores para obras que já estavam em andamento e determinou que obras iniciadas até 30 de junho deste ano seriam pagas. O modelo agora em negociação estende esse prazo para o último dia deste ano.

Isso foi tratado anteontem, na primeira reunião que a recém-empossada ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) teve com o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP). Ali, ela ouviu que o motivo maior de problemas no relacionamento entre o Executivo e o Legislativo decorre da insatisfação com esses assuntos.

Ontem, na reunião entre os líderes da base da Câmara, Vaccarezza anunciou que essa era a solução em avaliação no Palácio. No entanto, se por um lado a informação agradou os deputados, por outro a ausência de Ideli foi considerada desrespeitosa, já que ela foi com a presidente e a ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil) a um almoço com os seis senadores do PR.

Para se retratar, ela convocou os líderes da base para uma reunião no Palácio do Planalto à noite para tratar da liberação de verbas para os parlamentares. À saída, falou Vaccarezza, que, ao lado de outros líderes, como o do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), frisou a importância do pagamento das emendas para a atividade política.

"Todos os líderes entendem que é importante que a execução do orçamento da União seja respeitado. Achamos que as emendas não são estorvo, elas fazem parte do compromisso da Câmara e do Senado com a população. As emendas resolvem vários problemas", afirmou Vaccarezza. Ele disse, contudo, que a relação entre a base e o governo não se norteia pelas emendas. "Todos aqui pediram a aceleração do processo de liberação das emendas. Mas isso não significa nenhuma pressão".

Nas conversas com líderes dos partidos da base aliada, Ideli não deu prazos para o preenchimento de cargos no governo federal nem para a liberação de emendas. Segundo participantes das reuniões, a ministra também não deixou claro os valores que devem ser liberados. O suspense irritou parlamentares, inclusive petistas. A ministra tentou justificar que foi nomeada há pouco tempo e que ainda está tomando conhecimento da Pasta.

Ontem, depois de reunir-se com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), Ideli afirmou que os pedidos dos parlamentares serão atendidos "dentro da maior agilidade possível". A ministra disse, ainda, que as nomeações devem ser feitas "dentro dos critérios que a presidente exige, de critérios técnicos, de compatibilidade com a área".

O resultado das conversas com os parlamentares deve ser sentido hoje, quando está previsto o primeiro teste da ministra no Congresso, com a votação da MP 527. O texto cria regras mais flexíveis para as contratações de obras e serviços da Copa e da Olimpíada, o Regime Diferenciado de Contratações (RDC). O tema foi incluído por emenda na MP, que originalmente foi enviada pelo Executivo para criar a Secretaria de Aviação Civil, e gerou divergências entre a base e a oposição ao governo.

Temas espinhosos que a nova coordenação política do governo terá de enfrentar na Câmara foram tratados pelos líderes apenas no encontro da tarde, a que Ideli não compareceu. São eles a conclusão da votação da proposta de emenda constitucional 300, que institui um piso nacional para policiais; e a regulamentação da emenda constitucional 29, que fixa a os percentuais e fórmulas que União, Estados e municípios devem dispender com a saúde.

Nos dois casos, a base quer votar, mas o governo não. A PEC 300, além de criar mais despesas para a União, tem oposição dos governadores, que temem o impacto fiscal em suas contas. No ano passado, inclusive, alguns deles estiveram em Brasília para solicitar a retirada de pauta da proposta. Entretanto, pressionados por policiais em seus Estados, os deputados querem pelo menos levar a voto o texto, que já foi aprovado em primeiro turno em 2010.

Quanto à emenda 29, a pressão decorre dos municípios e, por consequência, de partidos com forte base municipalista, como PMDB e PP. O texto já está aprovado, mas falta apreciar um destaque do Democratas que exclui dele a Contribuição Social sobre a Saúde, tida como a "nova CPMF". O governo adia a decisão se apoia ou não explicitamente o novo tributo, tendo em vista que o risco de derrota é grande.