Título: Situação da Grécia piora, mas o socorro ainda tarda
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 16/06/2011, Opinião, p. A14

O mundo todo está com os olhos voltados para a Grécia. O país é belíssimo, tem uma das histórias mais ricas da humanidade, mas sangra à vista de todos, como um atropelado no meio de uma estrada que ninguém sabe como socorrer.

A situação indefinida da Grécia prejudica não apenas o país, assolado nos últimos meses por uma justificada inquietação popular, mas também prolonga a crise europeia e abala outros membros frágeis da zona do euro, com repercussões no resto do mundo.

Há pouco mais de um ano, em maio de 2010, a Grécia recebeu o primeiro pacote de ajuda da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional (FMI), de ¿ 110 bilhões em por três anos, com a esperança que o país ajustasse sua economia e, fortalecido, reabrisse as portas do mercado voluntário internacional para seus títulos neste ano.

Não foi bem isso o que aconteceu. A Grécia exibe a maior dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) da zona do euro, 139,3%, de acordo com dados do FMI. O déficit público é um dos maiores, 5,3% do PIB. Com números tão ruins, as chances de o país ser bem recebido no mercado de títulos da dívida diminui ainda mais.

A expectativa de um calote grego aumenta a cada dia e isso vem se refletindo na avaliação das agências de rating que, embora tenham perdido a autoridade por causa das graves falhas em apontar os riscos na crise internacional, continuam sendo levadas em conta pelos investidores. A mais recente ação foi da Standard & Poor"s (S&P), que rebaixou a dívida grega para um patamar inferior ao de países como o Paquistão e Granada.

Assim, em pouco tempo, a comunidade da zona do euro viu-se na contingência de ter que preparar mais um pacote de ajuda de mais ¿ 100 bilhões para a Grécia, apostando novamente que o problema grego é de liquidez, e não de solvência.

Foi quando a Alemanha resolveu ousar, apresentando uma nova saída para o problema grego. Compartilhando o sentimento dos mercados de que o calote grego está a caminho, a Alemanha sugeriu uma moratória de sete anos para a Grécia pagar a seus credores. Como no Plano Brady para o Brasil na década de 80, o plano alemão implica a adesão voluntária de todos os bancos credores da Grécia ao reescalonamento da dívida e tenta evitar uma quebra desordenada.

A proposta não foi bem recebida por outros membros da União Europeia e já recebeu reações negativas do próprio BCE, da França e da Itália. O maior temor do BCE é que a reestruturação forçada da dívida grega causará inevitavelmente a revisão do rating da Grécia, com reflexos negativos nos outros países frágeis da zona do euro, Irlanda e Portugal, e no sistema financeiro da região.

O presidente do banco central italiano, Mario Draghi, que deve suceder Trichet no comando do BCE, é um dos que optaram pela linha dura. Em recente debate no Parlamento Europeu, lembrou que a Itália enfrentou problema semelhante na década de 90 e conseguiu reestruturar sua dívida. Hoje, a Itália tem uma dívida pública elevada, de 119,6% do PIB, mas um déficit público baixo, de 2,8%, e bom acesso aos mercados. Países nórdicos também fizeram ajustes fortes na década anterior.

Mas em todos os casos e também no da Itália, as condições eram bem diferentes: o cenário global era totalmente distinto e esses países podiam desvalorizar suas moedas para melhorar sua competitividade. Como membro da zona do euro, porém, a Grécia não conta com a desvalorização cambial.

Para o articulista do Financial Times Wolfgang Munchau, o default é a opção mais provável para Atenas. O que os opositores da proposta alemã não entendem é que a Grécia precisa de fôlego maior para ajustar sua economia. O PIB grego deve cair 3,8% neste ano e o desemprego no país é de 14,6%, não tão elevado quanto na Espanha (19%), mas bem alto. Tudo isso dificulta o ajuste da economia.

O governo grego está enfrentando grande resistência popular para aprovar no Congresso um plano de austeridade com corte de ¿ 28,4 bilhões no orçamento, que pretende reduzir o déficit orçamentário. O presidente grego já cogita reformular o gabinete para obter apoio dos partidos de oposição.

A situação é delicada, mas fica mais delicada ainda à medida que o tempo vai passando, o que parece que as autoridades da zona do euro não percebem. A turbulência tão temida por Trichet e seus colegas já varre a zona do euro.