Título: Bancada do PT quer mais autonomia
Autor: Cunto, Raphael Di ; Taquari, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 20/06/2011, Política, p. A11

De Sumaré (SP) e São Paulo

O apelo feito pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que o PT respalde integralmente o governo Dilma Rousseff encontrará resistências internas no partido. Na tentativa de não ficar a reboque do governo federal, a bancada do PT na Câmara dos Deputados promete adotar uma postura mais independente na discussão de projetos em tramitação na Casa.

O deputado federal Jilmar Tatto (PT-SP) ressaltou que durante governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a bancada tentava interpretar as vontades do governo para depois se posicionar sobre determinados assuntos. A postura agora vai mudar. "A bancada do PT está unida. Adotamos a posição de não sermos mais governistas do que o próprio governo", disse o parlamentar.

O deputado diz que a bancada pode vir a retirar o apoio às propostas se o governo demonstrar sua inviabilidade, mas não aceitará um recuo isolado que desgaste o partido. "Esperamos que haja uma determinação para toda a base aliada. Afinal, não queremos ficar com o ônus sozinhos", acrescentou.

A mudança de comportamento, no entanto, pode provocar mais fissuras na relação entre o Executivo e os deputados petistas, já desgastada depois de parlamentares disputarem abertamente o cargo do ex-ministro das Relações Institucionais, Luiz Sérgio, antes mesmo de ele sair da Pasta.

Na votação do Código Florestal, o partido saiu derrotado ao defender o texto apoiado pelo Executivo, enquanto outros partidos da base, como o PMDB do vice-presidente Michel Temer, ajudaram a aprovar versão menos restritiva ao agronegócio. Embora tenham ocorrido discussões, o partido não foi punido por votar contra o governo.

Durante debate das Macrorregiões do PT em Sumaré, interior de São Paulo, no sábado, José Dirceu, ex-chefe da Casa Civil no governo Lula, disse que não houve racha na base do governo para votar o Código Florestal porque ela é "múltipla, com diferenças em muitas questões do país".

O ex-ministro, demitido no escândalo do mensalão, ainda criticou a postura adotada pela sigla. "Se muda a política de educação, podemos ser contra. Agora não podemos ficar discutindo se o ministro tem que ser A ou B, se tem que ser desse ou daquele partido. Isso é atribuição da presidenta", pontuou.

O primeiro teste da nova relação entre governo e partido, segundo Tatto, será na votação da emenda 29, que fixa os percentuais e fórmulas que União, Estados e municípios devem gastar com a saúde. Nesta semana, o presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), afirmou que o projeto será votado antes do recesso parlamentar de julho.

A base aliada e o PT defendem a proposta. O texto já está aprovado, mas falta apreciar um destaque do DEM que exclui dele a Contribuição Social sobre a Saúde (CSS), tida como a "nova CPMF". O governo adia a decisão sobre se apoia explicitamente ou não o novo tributo, tendo em vista que o risco de derrota na votação é grande.

Outros temas considerados espinhosos pelo Palácio do Planalto do ponto de vista fiscal e que também devem contar com o apoio do PT e de outros partidos governistas são a PEC 300, que institui um piso nacional para policiais e bombeiros, e a redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais.

A PEC 300, além de criar mais despesas para a União, tem oposição dos governadores, que temem o impacto fiscal em suas contas. Já a redução da jornada de trabalho é uma bandeira antiga das centrais sindicais, que organizam manifestação na Avenida Paulista, em São Paulo, para tratar do assunto no dia 3 de agosto, quando o Congresso retoma os trabalhos depois do recesso parlamentar de julho.

Ex-presidente nacional do PT, o deputado federal Ricardo Berzoini (SP) garante que no governo Lula também existiram posições divergentes entre o presidente e a legenda. "Não podemos abrir mão do nosso papel de partido, que é ter opiniões, formulações", afirmou. "Minha posição é a seguinte. Sempre que o governo pedir eu voto. O PT pode até manifestar descontentamento, dizer: olha, votamos junto com o governo, mas temos posição contrária. O que não pode é ser indisciplinado", completou.