Título: Projeto muda vida em comunidade, mas lembranças da violência ainda são visíveis
Autor: Góes, Francisco
Fonte: Valor Econômico, 21/06/2011, Brasil, p. A4

De Medellín e do Rio

Uma placa no prédio do Parque Biblioteca Espanha, no alto da comunidade 1, de Medellín, traduz o sentimento de muitos moradores dessa favela de terem recuperado a rua como um espaço natural de encontro das pessoas. Nela se lê: "Este é um espaço para a convivência, a liberdade e a dignidade do espírito humano." Foi nesse bairro pobre da região nordeste de Medellín que Pablo Escobar, narcotraficante que aterrorizou a Colômbia, recrutou os primeiros membros do seu grupo.As lembranças de violência na comunidade 1 classificada entre as de mais baixa renda de Medellín, ainda são visíveis. Há murais de arte popular com cenas de guerra, e crianças tentam ganhar uns trocados dos visitantes relatando o passado violento da região. Mas o bairro de Santo Domingo, onde fica a comunidade, passou por uma transformação nos últimos seis anos, a partir de investimentos em infraestrutura urbana e serviços sociais.

O metrô que passa em frente à favela foi conectado a um teleférico, semelhante ao que existe em modernas estações de esqui da América do Sul. Em poucos minutos, é possível chegar ao topo da favela em confortáveis cabines, nas quais cabem dez passageiros. No trajeto, é possível ver a rua 107, a principal do bairro, que ganhou cara nova com as intervenções urbanísticas.

"Quando chegamos, havia 18 lojas na rua 107. Hoje são mais de 240", disse María Eugenia Ramos, gerente-geral da Empresa de Desenvolvimento Urbano (EDU) de Medellín. No alto do bairro está a "joia da coroa", o Parque Biblioteca Espanha, construção em três volumes projetada pelo arquiteto colombiano Giancarlo Mazzanti, que lembra as grandes pedras da cordilheira onde o prédio está instalado. A biblioteca foi inaugurada pelos reis da Espanha em 2007.

O projeto de levar a biblioteca e prédios de escolas também modernos para a comunidade apoiou-se na ideia de servir o bairro com qualidade de equipamentos públicos. "O entorno do bairro mudou muito, a segurança da região também melhorou e as crianças que, nos primeiros dias, vinham ao Parque Biblioteca sem tomar banho, descalças e sem se pentear, sem saber fazer fila, também passaram por uma transformação", disse a bibliotecária Narty Vásquez, uma das responsáveis pelo espaço educacional.

No Rio, a prefeitura desenvolve projeto semelhante, em uma tentativa de levar a todas as favelas pacificadas serviços que sejam adequados às pessoas e à geografia das diferentes comunidades. Na favela do Borel, na zona norte da cidade, ocupada há um ano pela polícia, o sentimento também é de recuperação de espaços públicos, que antes eram dominados pela guerra entre facções de traficantes.

"A situação melhorou, mas agora é preciso investir na capacitação dos jovens para que possam trabalhar", disse Francisco dos Santos Silva, presidente da Associação dos Moradores da Indiana, comunidade vizinha ao Borel. (FG).