Título: Fuga para títulos de curto prazo
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 20/08/2010, Economia, p. 14

Incerteza eleitoral e dúvidas em relação a juros e ao cenário externo levam o investidor a correr para papéis públicos corrigidos pela Selic. Garrido, do Tesouro, garante que movimento do mercado já era previsto e não atrapalha o governo

As incertezas em relação ao futuro da taxa de juro, das condições da economia externa e até mesmo de quem será o próximo presidente do país levaram o mercado a se desfazer dos títulos prefixados da dívida pública brasileira e obrigaram o Tesouro Nacional a recomprar um grande volume desses papéis no mês passado.

Segundo os dados oficiais, a fatia da dívida atrelada a esses títulos caiu de 33,85% para 32,83%, enquanto os indexados à taxa básica de juros (Selic), de curto prazo, aumentaram de 31,57% para 32,27% e os lastreados em índices de inflação passaram de 27,71% para 28,19%.

A dificuldade em emitir novos papéis prefixados representa um mau negócio para o governo, já que eles são mais vantajosos para a administração da dívida. O movimento reduziu o endividamento em 0,68%, para R$ 1,6 trilhão. A dívida interna, que representa 94,24% do total, caiu 0,49%, para R$ 1,5 trilhão.

Em julho, o lançamento de títulos no mercado doméstico chegou a R$ 42,3 bilhões enquanto a recompra somou R$ 61,7 bilhões. Do total resgatado, 93,54%, ou R$ 57,7 bilhões, são prefixados. A União também emitiu esses ativos no período, mas em volume menor, R$ 33,2 bilhões. Em contrapartida, lançou mais do que resgatou papéis federais indexados à taxa Selic e aos índices de preços (que medem a inflação), ocasionando emissão líquida de R$ 3,2 bilhões e R$ 1,6 bilhão desses ativos, respectivamente.

Resistência De acordo com o economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating, Alex Agostini, esse tipo de movimento do mercado é natural quando há um ou mais fatores conjunturais atuais. ¿Ocorre quando há perspectiva de alta na Selic, incerteza de como vai reagir o cenário externo ou quando se está próximo das eleições. Tudo isso se traduz em risco e hoje temos esses três fatores¿, detalhou.

Para Agostini, o ideal é o Tesouro rolar toda a dívida prefixada, mas destaca a resistência dos agentes, que exigem juros mais altos (como retorno) ou prazos mais curtos, contrariando a estratégia de alongamento da dívida e redução de seu custo. ¿Para dar certo sempre, no entanto, esse planejamento tem que ser aceito pelo mercado e nem sempre é assim¿, observou.

Segundo o coordenador-geral de operações da dívida pública, Fernando Garrido, a concentração de resgates de prefixados em julho estava prevista e não atrapalha a administração do endividamento do governo. ¿Julho foi muito positivo, pois tivemos uma forte demanda, além de redução do custo da dívida¿, afirmou. Puxado pela menor inflação do mês passado ¿ 0,01% de variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ¿, o custo de manter o endividamento público teve um leve recuo, de 10,90% para 10,89%.

A participação dos estrangeiros na dívida interna do país aumentou no mês passado, de 9,35% para 9,54%, batendo um novo recorde e chegando a R$ 141,2 bilhões. Além da solidez da economia, os altos juros continuam atraindo esse tipo de investidor. ¿A leitura (dos aplicadores) é de que diante do baixo risco oferecido pelo país, a rentabilidade dos títulos é atrativa¿, avaliou Garrido.

Recorde entre pessoas físicas O lançamento de títulos pelo programa Tesouro Direto ¿ venda de papéis do governo a pessoas físicas ¿ bateu recorde em julho ao somar R$ 267,83 milhões. Atualmente, o estoque de papéis deste tipo nas mãos dos investidores é de R$ 3,9 bilhões, volume dividido entre mais de 197 mil participantes. Somente no mês passado, 3.387 investidores se cadastraram no Tesouro Direto e os títulos mais procurados foram os prefixados, preferidos por garantir, de antemão, quanto será o retorno pago ao comprador. Para o coordenador de operações da dívida brasileira, Fernando Garrido, o volume de participação do programa no total da dívida tende a crescer, uma vez que é ¿bastante interessante em relação à rentabilidade e totalmente seguro ao investidor¿. (GC)