Título: Homenagem a FHC traz elogios de petistas
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 01/07/2011, Política, p. A10
De São Paulo
Depois da carta da presidente Dilma Rousseff ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, cumprimentando-o pelo aniversário de 80 anos e com elogios ao "acadêmico inovador e político habilidoso", ontem foi a vez de o presidente da Câmara dos Deputados, o petista Marco Maia (RS), comparecer à solenidade organizada pelo PSDB em homenagem a FHC e fazer um discurso enaltecendo o papel do ex-presidente para a democratização do país."Podemos ter divergências, às vezes de fundo, de conteúdo. Mas são meras discordância sobre fatos. O importante é que, mesmo nas divergências, somos capazes de reconhecer em Vossa Excelência um homem de bem desse país", afirmou Maia. "Vivemos num país verdadeiramente democrático e Vossa Excelência tem muita responsabilidade nisso. Vossa Excelência é, na essência de sua trajetória, um democrata", disse o petista, que tratou FHC como "amigo".
A carta de Dilma foi lida no início da solenidade pela atriz Fernanda Montenegro, mestre de cerimônias da homenagem, que lotou o auditório Petrônio Portella, do Senado Federal. Ex-ministros de seu governo, aliados da oposição, ministros de Dilma e petistas compareceram. Em seu discurso, o ex-presidente disse ter ficado "muito feliz" com a carta da presidente, tornada pública dias antes. "Eu senti não um gesto político, mas o gesto em dizer: "olha, nós somos brasileiros, em alguns pontos nós temos que nos entender." Não vale a pena um só destruir o outro."
Em tom conciliatório, o tucano afirmou que "construir juntos não é aderir" e recomendou a Dilma diálogo com o Congresso Nacional. "Me esforcei muito para mudar muitas coisas pelo Brasil, mas sempre dialoguei com o Congresso, ativamente dialogando com cada um, com todos. Política e democracia ou é de convencimento ou não avança."
Após a solenidade, o presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE), afirmou considerar esse reconhecimento da importância de FHC para o país, pela presidente e por lideranças do PT, "muito importante para o PSDB, que se reencontra". Afirmou que o partido foi surpreendido por esse movimento.
"A gente sentia que havia uma progressão nessa direção [do reconhecimento do papel de FHC]. Mas foi muito maior do que a gente sentia que houvesse. Para a democracia é bom também. É importante quando alguns [petistas] dizem que esses anos não foram perdidos. Foram continuados e foram positivos. E o reconhecimento de Fernando Henrique no sentido de que ele sempre foi um ator democrático é muito importante."
A homenagem a FHC levou ao Senado o vice-presidente Michel Temer (PMDB), que não participou da solenidade, mas esteve na recepção ao ex-presidente no gabinete do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). O ex-presidente Fernando Collor (PTB-AL), hoje senador, e lideranças nacionais do PMDB e de outros partidos também estiveram no encontro com Sarney, que antecedeu a solenidade. "Foi um encontro social. O país está ganhando ares mais civilizados", comentou o pemedebista Geddel Vieira Lima, vice-presidente da área jurídica da Caixa Econômica Federal e ex-aliado de FHC.
O ministro Nelson Jobim (Defesa) - amigo de FHC e indicado pelo ex-presidente para o Supremo Tribunal Federal (STF) - fez discurso enaltecendo a forma como o ex-presidente tratava sua equipe. "Nunca levantou a voz e nunca criou tensão entre os que o assessoravam (...). Você mostrou que a relação de poder não se confunde com a pretensão, com o autoritarismo", afirmou Jobim. Citando Nelson Rodrigues, disse que, "de uns tempos para cá, os idiotas perderam a modéstia".
Coube ao ex-governador José Serra, amigo de FHC e de sua mulher, Ruth Cardoso, morta em 2008, fazer o relato mais detalhado da trajetória política e acadêmica do ex-presidente. Lembrou a importância de sua gestão para a formação de uma rede de proteção social no país, para a estabilidade econômica, a modernização do Estado e a responsabilidade fiscal e disse que o Plano Real só foi implantado pela "obstinação e persistência" de FHC.
Serra foi o único a dar estocadas no PT. Criticou aqueles que tentaram "reescrever a história" e disse que FHC nunca "condescendeu com o mal feito para privilegiar aliados nem passou a mão na cabeça de aloprados". Também "jamais buscou dividir o Brasil" e foi exemplo de "decoro" e "coragem". O ex-governador terminou com uma declaração de amor a FHC. "Te amamos", afirmou.
No pronunciamento, FHC afirmou que o país avançou muito em relação àquele "país pobre, doente, analfabeto, mergulhado num abismo social de diferenças de classe". Disse que os brasileiros têm acesso à educação e à saúde pública, mas que é preciso qualidade e não somente quantidade. Ele considerou desafio o país ter uma "sociedade mais decente", em que o desenvolvimento sustentável beneficie todas as pessoas. O ex-presidente terminou seu discurso de forma emotiva. "Amo vocês profundamente e sinto ser amado. Estou feliz."
A solenidade terminou com vídeo do cantor e compositor Chico Buarque cantando jingle composto para campanha de FHC de 1985.