Título: BIS alerta para risco de emergentes caírem em armadilhas de crédito
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 27/06/2011, Finanças, p. C12

De Roma

O Banco Internacional de Compensações (BIS) alerta que emergentes com boom imobiliário e de crédito podem estar caindo na armadilha e "cavando" desequilíbrios semelhantes aos que penalizam economias desenvolvidas em crise.

O banco dos bancos centrais exemplifica que o Brasil, China e Índia tiveram alta média do crédito acima de 20% entre 2006 e 2010, "superior ou igual aquela ocorrida na Irlanda e Espanha" - países que viram a bolha imobiliária explodir e causar profundos estragos em suas economias.

"Nos emergentes, onde os bancos centrais tentam ainda estabelecer sua credibilidade, as tensões inflacionárias se acentuam e as autoridades se confrontam com a acumulação de riscos ligados aos boom do crédito e imobiliário", diz o banco em seu relatório anual.

O BIS nota que os emergentes conseguiram escapar do pior da crise e têm um crescimento muito mais rápido. Mas aponta sinais de nova acumulação de desequilíbrios "inteiramente comparáveis" àqueles constatados nas economias desenvolvidas no período anterior a crise.

Nota ainda que os preços imobiliários e o endividamento privado progridem num ritmo "desenfreado" em certos casos. E que o nível inicial desses indicadores era pouco elevado, mas esse era também o caso para algumas economias avançadas, como Irlanda e Espanha, no começo dos anos 2000.

Além disso, o boom nos emergentes tem sido alimentado por importantes entradas de capitais externos, o que trás outros desafios para o Banco Central.

"As autoridades no mundo emergente devem estar conscientes de que as lições da crise financeira não se aplicam apenas aos países avançados", adverte.

O BIS nota que nos países no coração da crise, esses desequilíbrios incluem o endividamento persistente do setor privado - famílias, mas também setor financeiro e empresas. O rápido crescimento da dívida e dos ativos provocou uma "hipertrofia" dos setores de imóveis residenciais e das finanças nos desenvolvidos. O boom imobiliário e de crédito modificou a composição setorial da produção. O peso relativo da construção aumentou em todos os países onde o preço dos imóveis subiu. A demanda por empréstimos estimulou o crescimento do setor financeiro. Os ativos de bancos passaram do equivalente a 10 vezes o PIB em 2002, nível já elevado, a mais de 20 vezes na véspera da crise de 2007.

A expansão desses dois setores, a partir de um certo ponto, passou a tomar recursos do resto da economia e coincidiu com menor expansão da produtividade de outros setores. "O boom mascarava também uma grande vulnerabilidade estrutural das finanças públicas que, na falta de medidas de correção, poderia ser o deflagrador da nova crise", diz o BIS.

Agora, o setor financeiro e a construção deverão sofrer uma contração, e outros setores serão motores da expansão econômica. O ajuste "será doloroso", afetando o crescimento global e as receitas públicas.

O BIS considera "indispensável" que os países ataquem o superenvididamento privado e público e os coloquem a níveis "mais viáveis", reduzam os saldos de contas correntes, moderem os fluxos financeiros brutos de grande amplitude resultante da atividade internacional e preservem a estabilidade de preços no médio prazo. Considera essencial, ao mesmo tempo, estimular a poupança privada e "medidas energéticas" para reduzir os déficits.

"Não nos enganemos: as turbulências que agitam os mercados em torno das crises financeiras grega, irlandesa e portuguesa parecerão bem inofensivas, retrospectivamente, comparadas aos estragos que causariam uma perda de confiança de investidores na dívida soberana de um grande país", alerta.

Estima que os países terão que dispor de "liquidez de precaução", a exemplo das companhias de seguro. Os Estados deverão montar fundos de reservas, bem além da acumulação de excedentes orçamentários em fase de boom, para financiar déficits criados nas recessões.

"Se as economias emergentes tirarem o que pode ser a principal lição - vale mais prevenir do que remediar -, eles conseguirão talvez evitar pagar o preço", conclui o BIS.