Título: No congresso dos enrolados
Autor: Rothenburg, Denise; Abreu, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 25/08/2010, Política, p. 3

Da Lei da Ficha Limpa a contas rejeitadas, levantamento do Correio mostra que 47 deputados e senadores têm problemas com a candidatura

No último esforço concentrado da Câmara, um grupo de deputadas cercou a colega Maria do Rosário (PT-RS) em sinal de solidariedade.

A deputada é a única candidata à reeleição pelo PT gaúcho que teve o registro da candidatura indeferido pela Justiça Eleitoral.

Eu saí da campanha para a prefeitura de Porto Alegre com dívidas e não tenho patrimônio para cobrir.

O partido assumiu e está pagando tudo parceladamente. Mas, ainda assim, o tribunal disse que minhas contas da campanha anterior estavam irregulares e não me deu o registro, explicava.

Maria do Rosário é um dos 47 deputados e senadores que enfrentam problemas para conseguir emplacar suas candidaturas na justiça eleitoral. Os motivos são diversos. Vão desde aqueles que foram prefeitos e tiveram contas rejeitadas até os que foram barrados pela Lei da Ficha Limpa, aprovada no fim de 2009 pelo Congresso. Na bancada do PP de São Paulo, por exemplo, composta por seis deputados, quatro constam com impugnação Aline Correa, Paulo Maluf, Vadão Gomes e Beto Mansur.

No Paraná, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), candidato ao Senado, está com notícia de inelegibilidade em razão da Ficha Limpa. Ele foi condenado a ressarcir o município de Maringá, de onde foi prefeito de 1989 a 1992, pela diferença entre o valor de mercado de dois compactadores de lixo e o que foi recebido pelo município em novembro de 1991, quando vendeu os equipamentos.

Barros diz que os compactadores não tinham serventia.

Levantamento do Correio mostra que 21 parlamentares, sendo 20 deputados e um senador, tiveram a candidatura indeferida; 17 foram autorizados a concorrer, mas terão de enfrentar recursos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE); e outros nove estão impugnados, mas aguardam o julgamento do registroOs deputados têm dito em conversas reservadas que, hoje em dia, quem foi prefeito dificilmente escapará incólume de responder algum processo ou correr o risco de ter a candidatura sujeita a receber um cartão vermelho na Justiça Eleitoral. Beto Mansur, por exemplo, foi prefeito de Santos.

Em família Já o deputado Pedro Wilson (PT-GO) teve a candidatura ao Senado autorizada pelo Tribunal Regional Eleitoral de Goiás, mas aguarda o TSE julgar recurso apresentado pelo Ministério Público contra seu registro. Ele conta que, graças a uma diferença contratual de menos de R$ 20 mil com uma ONG, teve a prestação de contas questionada ao deixar a prefeitura de Goiânia. Quando você deixa o poder, não tem mais acesso aos dados. Essa prestação de contas é de um documento de 2005 que foi todo cancelado. Não foi feita nenhuma obra e nem pago nenhum centavo, qual é a improbidade?, reclama.

Alguns deputados que estão sujeitos a impugnação colocam os filhos como candidatos para tentar manter a linhagem familiar no Congresso. É o caso, por exemplo, de João Pizzolatti (PP-SC). O registro de sua candidatura foi indeferido, mas seu filho, João Pizzolatti Júnior (PP-SC) obteve sinal verde. Na cédula, o pai aparece apenas como Pizzolatti e o filho como João Pizzolatti. O ex-prefeito do Magé (RJ) Charles Cozzolino (PTB) renunciou à candidatura, mas a família estará representada por Renato Cozzolino (PR).

O primo do ex-prefeito teve a candidatura deferida.

Réu no processo do mensalão, o ex-deputado Pedro Henry (PP-MT) foi barrado com base na Lei da Ficha Limpa. Não por ser acusado de envolvimento com o caso, mas por ter sido condenado em 2006 por compra de votos. Tenho uma liminar do STF, de 2007, que suspende a condenação. A mesma liminar serviu para uma outra candidata, que teve o registro deferido, mas para mim, não, reclamou.

O deputado Jofran Frejat (PRDF), vice de Joaquim Roriz (PSC) na disputa pelo GDF, também aparece na lista de indeferidos.

O motivo teria sido a impugnação da chapa. Como o titular foi impugnado, naturalmente a chapa não pode ser registrada, mas não há nada de ficha suja contra mim, explicou.

» Colaborou Josie Jeronimo

O preço de um castelo

O Castelo Monaliza, símbolo de um dos mais famosos escândalos políticos dos últimos tempos, volta à cena depois de quase um ano e meio. Ele aparece na declaração de bens do candidato à reeleição a deputado estadual Leonardo Moreira (PSDB), filho do idealizador e construtor, deputado federal Edmar Moreira (PR). Ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE), Leonardo declara que é dono de parte do imóvel, avaliado, no documento, em apenas R$ 1,176 milhão. Tal cifra, no entanto, corresponde somente a 2,94% do valor de mercado da megaconstrução, erguida em São João Nepomuceno, na Zona da Mata, que pode chegar a R$ 40 milhões, segundo corretores da região. De acordo com registros da Junta Comercial de Minas, o parlamentar mineiro tem 49% das ações do imóvel, registrado como empresa hoteleira.

Uma evidência de que o valor do imóvel foi subestimado é a tentativa de venda, no ano passado, logo após o escândalo, pelo valor de R$ 25 milhões.

Na verdade, a propriedade, que parece saída de um conto de fadas, está registrada como Hotel Castelo Monaliza Ltda., com o CNPJ 07905357/0001-68. Segundo registros, além de Leonardo Moreira, que tem 49% das ações, o irmão, o delegado da Polícia Civil de São Paulo, Júlio Moreira, tem o mesmo número de cotas, o que totaliza o valor de R$ 2,352 milhões da construção, considerando a declaração feita pelo deputado à Justiça Eleitoral. Os 2% restantes estão registrados em nome de um ex-cabo eleitoral dos Moreira, Reginaldo de Carvalho, que trabalhou para a família na eleição de 2006. Carvalho garante hoje desconhecer a existência de sua participação no castelo, que seria de R$ 48 mil, com base nos mesmos dados.

No total, o imóvel teria o valor de R$ 2,4 milhões.

A corretora Jussara Fagundes, da Corretores e Associados, de Curitiba, e responsável pela venda do imóvel, se recusou a informar o valor exigido na transação. Não estou autorizada a passar qualquer informação sobre o castelo Monaliza sem uma carta de intenções de compra, afirmou.

Questionado sobre o valor do castelo, o deputado Leonardo Moreira limitou-se a dizer: O que eu tenho a informar está declarado à Receita Federal do nosso país e à Justiça Eleitoral do nosso estado.