Título: Pacientes temem ser cobaias de novo remédio
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 25/08/2010, Brasil, p. 10

Compra de medicamento ainda não testado no país contra a doença de Gaucher assusta portadores da enfermidade, que estão preocupados com possíveis efeitos colaterais

Seiscentos e 10 pacientes de gaucher, uma doença rara que pode levar à morte, foram pegos de surpresa com a aquisição de 54.400 frascos do medicamento taliglucerase alfa feita recentemente pelo Ministério da Saúde. O remédio substituirá o imiglucerase, droga utilizada até o momento com boa resposta. O motivo da compra realizada sem licitação no valor de R$ 57,8 milhões é que a única fabricante do medicamento tradicional, a Genzyme, sofreu um problema de contaminação em seus tanques e não poderá, segundo documentos apresentados pela pasta, fornecer as doses que o Brasil precisa. A empresa, porém, afirmou por meio de nota que há disponibilidade imediata do remédio.

No meio do fogo cruzado estão pacientes como T.A.S., portador de Gaucher e dependente do imiglucerase. Tenho medo dos efeitos colaterais, gostaria de saber se essa nova droga vai mesmo controlar a doença. Precisamos de informações, afirma o rapaz de 27 anos. O temor vem do fato de o taliglucerase alfa ter registro para uso emergencial e temporário apenas na França.

No Brasil, o Ministério da Saúde conseguiu que a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicasse uma autorização semelhante, com base em um estudo de fase III (com humanos) no qual participaram 31 pessoas que sofrem da doença. Além disso, o governo argumenta que o medicamento é utilizado com sucesso há três anos em Israel e na África do Sul. O remédio é fruto de uma parceria entre a Pfizer e a israelense Protalix.

O ministério está tranquilo com a decisão tomada numa crise mundial em que não temos o produto mundialmente fornecido, diz José Miguel do Nascimento Junior, diretor de Assistência Farmacêutica do Ministério da Saúde. Ele diz estranhar o fato de a Genzyme, depois de publicada a compra com a outra empresa, dizer que pode fornecer o medicamento.

Antes, eles haviam informado que só poderiam entregar 30%, critica. Para Maria Cecília Oliveira, presidente da Associação dos Familiares, Amigos e Portadores de Doenças Graves, seria melhor comprar a parcela disponível do remédio tradicional e completar o resto da demanda com a droga miglustate, aprovada pela Anvisa desde 2005.

O paciente será feito de cobaia, com um medicamento sem aprovação, e o ministério ainda vai pagar por isso?, questiona.

Genética A doença de Gaucher é uma enfermidade genética relacionada com o metabolismo dos lipídios.

As principais características são um aumento do fígado e do baço, anemia, diminuição do número de plaquetas e problemas ósseos.