Título: Risco da inoperância política é a imobilidade administrativa
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Fonte: Valor Econômico, 13/07/2011, Opinião, p. 10

Esclarecedora, sob todos os pontos de vista, a entrevista da ministra Miriam Belchior, do Planejamento, ao Valor, publicada na edição de segunda-feira. Ao contrário da percepção política mais ou menos generalizada, diz a ministra que o governo da presidente Dilma Rousseff está em movimento, começa a trabalhar nas primeiras horas do dia, só encerra o expediente tarde da noite e que os resultados desse esforço serão visíveis em 2014, ao fim dos quatro anos de mandato.

"Temos quatro anos de governo, não é uma corrida de 100 metros", disse Miriam Belchior. A ministra do Planejamento também é adepta da máxima segundo a qual o primeiro ano de mandato é para preparar e lançar as bases do governo, no segundo se executa o que foi planejado e no terceiro - ela não disse, mas deixou implícito - o governante começa a preparar o terreno para as eleições do ano seguinte. Nisso, o PT em nada difere dos partidos que o antecederam no Planalto.

A ministra Miriam Belchior tem razão ao dizer que seis meses é muito pouco tempo para se cobrar resultados de um governo. Mas nem tanto quando esse governo é de continuidade do anterior, como fizeram questão de deixar bem claro, durante a campanha eleitoral, a então candidata Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um mandatário cuja popularidade singular elegeu presidente da República uma técnica, até então, desconhecida da população.

Não bastasse o fato de se tratar de um governo de continuidade, na campanha a candidata assumiu compromissos claros cujo atendimento a presidente poderia cumprir nos primeiros dias de governo. Alguns desses compromissos foram para as calendas, como é o caso da irmã enjeitada de todas as reformas - a reforma política, que, se avançar, será aos trancos e barrancos e por iniciativa do próprio Congresso. Outros saíram da agenda pela porta dos fundos.

Para ficar num exemplo menor: na campanha eleitoral de 2010, a candidata reiteradas vezes prometeu que, se eleita, criaria um ministério específico para os assuntos relativos a micro e pequenas empresas.

Trata-se de tarefa difícil justificar a criação de uma nova pasta em um governo que já conta com 37 ministérios. Mas o mínimo esperado de Dilma era uma política para as microempresas.

Pois bem, a presidente assumiu o governo e uma única vez o tal ministério esteve em pauta: quando o governo cogitou da possibilidade de nomear para a função o senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), cuja principal qualificação para o cargo era ter como suplente o então presidente do PT, José Eduardo Dutra, que assim assumiria a vaga e garantiria mais um voto petista no Senado da República.

É sortida a lista de promessas de campanha de Dilma Rousseff que não se transformaram em decisões políticas, com a posse da presidente em 1º de janeiro.

Existe a expectativa de que algumas dessas promessas comecem a se transformar em realidade nos próximos dias, como a desoneração da folha de salários das empresas. Mas ninguém sabe como o governo vai liderar em temas como a regulamentação da Emenda Constitucional nº 29 (que trata do financiamento da saúde) ou então a reforma tributária.

Governos precisam ser claros em seus objetivos políticos. A punição, caso isso não exista, é a imobilidade administrativa. Passados mais de 15 dias depois da anunciada possível fusão do grupo francês Carrefour com o Pão de Açúcar, com a generosa contribuição de pelo menos R$ 4 bilhões do BNDES, não é clara a posição do governo sobre o assunto.

E o trem-bala, afinal, aonde quer chegar o governo com um projeto que compromete os cofres públicos em no mínimo R$ 34 bilhões, segundo o preço do governo, e que nenhuma empreiteira topa bancar por menos de R$ 55 bilhões?

É preciso ficar claro que a coordenação política de um governo é diferente da articulação parlamentar, para a qual a presidente designou recentemente a ex-senadora e ex-ministra da Pesca, Ideli Salvatti. É bem mais que isso, precisa ditar o rumo, os objetivos que o governo quer alcançar. O risco da inoperância política, sem dúvida nenhuma, é a paralisia administrativa.