Título: O Projeto 85/95
Autor: Giambiagi, Fabio
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2011, Opinião, p. A11

O noticiário tem mencionado a possibilidade de aprovação do "projeto 85/95" que, na prática, acaba com o fator previdenciário. O texto é uma contrarreforma. Ele visa elevar para a unidade o fator previdenciário nos casos em que a soma de idade e tempo de contribuição (TC) for de 85 anos para as mulheres e 95 para os homens, situações nas quais o fator hoje é de aproximadamente 0,72 para aquelas e 0,85 para estes.

A tabela foi elaborada a partir de premissas baseadas nos dados disponíveis: 33% de participação feminina no fluxo de novas concessões de aposentadorias por tempo de contribuição; sobrevida após a aposentadoria de 29 anos para as mulheres e 24 para os homens; 39% (pois 1/0,72=1,39) de aumento das aposentadorias futuras das mulheres e 19% (dado o fator de 0,85) para os homens; e impacto do salário mínimo (SM) incidente sobre 40% da folha do INSS. Adicionalmente, consideram-se as taxas de variação da população com idade de 60 anos ou mais da projeção populacional do IBGE; um crescimento do PIB de 4% ao ano até 2020 e médias anuais de 3,5% e 3,0% nas duas décadas seguintes; e um aumento do salário mínimo baseado na regra da variação do PIB defasada de 2 anos valendo até o final da década, com redução para 2% nos 4 anos posteriores e 1% a partir de então.

Contemplam-se dois cenários, ambos sem a aprovação de uma reforma que restrinja o acesso a aposentadorias por tempo de contribuição e com projeções até 2040, quando os efeitos da aprovação do projeto se completariam. No primeiro, mantém-se as regras atuais e, devido ao salário mínimo e hipóteses adotadas, há uma pressão crescente das despesas do INSS no PIB. No segundo, a essa pressão somam-se os efeitos da aprovação do "projeto 85/95", pela substituição de benefícios por TC que tinham um certo valor, por outro 18% ou 39% maior - dependendo do gênero - em 1/24 ou 1/29 avos durante 24 e 29 anos para homens e mulheres, respectivamente.

O impacto inicial é modesto, pelo fato de que os novos aposentados constituem uma parcela pequena do conjunto de aposentados, mas o efeito cumulativo se torna maior a medida em que o seu contingente é renovado ao longo de uma geração. A conta envolve uma série de simplificações, mas o cálculo parece uma estimativa razoável do impacto da aprovação do projeto.

Os números mostram que:

1) no período de três décadas, a população de idosos aumentaria a uma taxa anual de 3,4%, enquanto que o PIB aumentaria, por hipótese, a uma média de 3,5% e o salário mínimo a 2,1% ao ano;

2) por conta dessa combinação de taxas, no cenário de status quo a despesa do INSS aumentaria de 6,8 % do PIB em 2011, para 8,3% do PIB em 2040; e

3) o projeto elevaria a despesa do INSS de 2040 em 0,5% do PIB adicionais, até 8,8% do PIB.

O Brasil tem pela frente o desafio fiscal maiúsculo de encarar o envelhecimento demográfico da população e o que o projeto faz é agravar esse quadro. Nesse caso, nossos filhos pagarão a conta. É isso que pretendemos deixar como legado para as futuras gerações?

Fabio Giambiagi, economista, co-organizador do livro "Economia Brasileira Contemporânea: 1945/2004" (Editora Campus), escreve mensalmente às segundas-feiras.