Título: Novo modelo gera expectativa e dúvidas
Autor: Borges, André ; Bitencourt, Rafael
Fonte: Valor Econômico, 12/07/2011, Brasil, p. A4

De São Paulo

O anúncio do novo modelo de licitação para o trem de alta velocidade (TAV) Rio-São Paulo reacendeu a expectativa no mercado de que o projeto será viabilizado, mas levantou dúvidas entre os investidores interessados.

Segundo Vicente Abate, presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), o modelo, considerado inédito, parece interessante ao deixar a responsabilidade da elaboração do projeto com os detentores da tecnologia do trem-bala. "As construtoras não quiseram assumir a responsabilidade pelo projeto. Com esse novo modelo de licitação, serão contratadas com o projeto executivo definido, o que dará mais segurança em relação aos custos", diz ele.

Uma das dúvidas de Abate é se as construtoras também serão responsáveis pela concessão ou serão apenas contratadas. No caso de serem contratadas, a questão é saber quem pagará esse investimento. "Não conheço nenhum projeto no mundo com esse formato", diz ele.

Para Carlos Eduardo Jorge, diretor-executivo da Associação Paulista dos Empresários de Obras Públicas (Apeop), a nova proposta do governo para a licitação parece melhor que a anterior para as construtoras, já que dá maior segurança. "A dúvida ainda é saber se as construtoras integrarão o consórcio ou se serão contratadas pela concessionária", diz.

A exigência de um projeto executivo antes da contratação das obras é razoável, avalia Paulo Benites, representante do consórcio liderados pelos coreanos. "As empresas vão ter um trabalho maior, mas agora cada consórcio precisa avaliar se vale a pena ir a fundo nos estudos para participar", diz ele. A independência em relação às construtoras também é avaliada como positiva por Benites. "As construtoras perderam o poder de definição do projeto."

A insegurança dos consórcios em relação ao investimento necessário para colocar o trem de alta velocidade (TAV) Rio-São Paulo de pé, e às garantias de retorno do capital, resultaram ontem numa licitação vazia. Das 9h às 14h, apenas "curiosos" enviados pelas empresas interessadas passaram pelo saguão da BM&FBovespa, em São Paulo, perguntando se alguém havia entregado uma proposta.

Apareceram representantes de coreanos, franceses, japoneses, entre outros, que apenas se identificaram como "observadores". A resposta das recepcionistas era evasiva. Não podiam dar informação e a entrada era permitida apenas para quem fosse participar do leilão.

A ausência de concorrentes para o projeto de R$ 33 bilhões já era prevista pelos consórcios. Segundo Benites, do grupo coreano, que pediu adiamento do leilão à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) na semana passada, não houve tempo para fechar o consórcio.

"Depois do primeiro adiamento, no fim de 2010, entendemos que era interessante nos associarmos a grandes empresas brasileiras de construção, mas não conseguimos acertar esse novo formato do consórcio dentro do prazo dado pelo governo", diz.

Benites afirma que o consórcio TAV Brasil, composto inicialmente por Hyundai Heavy Industries, LG e Samsung, está sendo reformulado. "Não necessariamente vamos ter um grupo apenas coreano na tecnologia", diz ele.

Segundo Masao Suzuki, vice-presidente da Mitsui Brasileira, prazo não era o problema do grupo japonês. "Se fosse prazo, teríamos pedido o adiamento, mas não pedimos. Decidimos não participar por um conjunto de problemas", diz o executivo. Suzuki não quis detalhar as questões que tiraram o consórcio japonês do leilão, mas afirma que o projeto era inviável.

Para os investidores chineses, havia muita incerteza sobre a demanda de passageiros, o que dificultava saber qual a receita a ser obtida no empreendimento. Segundo um representante do consórcio, que não quis ser identificado, falta um projeto básico confiável para que as empresas apresentem suas propostas.

Em comunicado, a Alstom, detentora da tecnologia francesa de trem-bala, informou que continua interessada no projeto. De acordo com a nota, a companhia não apresentou proposta por entender que "não era possível, nas condições atuais, apresentar uma oferta sólida sob os pontos de vista econômico e técnico, e assim decidiram não seguir adiante".