Título: Eles já sabem tudo de cor e salteado
Autor: Iunes, Ivan
Fonte: Correio Braziliense, 17/08/2010, Política, p. 2

Dilma, Serra e Marina não se cansam de repetir em discursos as mesmas frases e informações. São histórias de humildade, competência e superação

Ivan Iunes e Tiago Pariz

Dilma é mulher, mãe e a candidata do presidente Lula. Merece, por isso, ser presidente da República. Serra odeia ti-ti-ti e tro-ló-ló, tem origem humilde, pais modestos. Não precisa de Lula para governar e, por isso, merece presidir o Brasil. Marina demorou 16 anos para aprender a ler e a escrever, saiu do interior da Amazônia, ficou como indigente numa fila de hospital público. É negra, pobre, sofreu. Merece ser presidente.

Os três candidatos à Presidência da República, desde a pré-campanha, não se cansam de repetir essas informações. São frases exaustivamente pinçadas em entrevistas, em discursos, no contato com o eleitor. Em 40 dias oficiais de campanha, Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV) se repetem, dizem sempre a mesma coisa, têm como estratégia colar nos eleitores o discurso da humildade, da competência e da superação. É quase impossível esbarrar em um deles e não ouvir as mesmas histórias da mãe Dilma, do modesto Serra e da analfabeta até os 16 anos Marina Silva.

Dilma tem uma coleção de frases, histórias e dados que ela gosta de repetir em suas andanças. A maioria gira em torno das mulheres e da condição de mãe. A história campeã de repetições é a da menina Vitória, que Dilma encontrou num aeroporto. A criança quis saber da candidata se mulher pode ser presidente da República. O curioso é que a ex-ministra da Casa Civil sempre se embaralha e conta o nome da criança no começo do causo, diminuindo o tom do final.

A mensagem sempre vem casada com histórias de mãe, uma das imagens preferidas de Dilma. Ela costuma lembrar que as mulheres são 52% do eleitorado, enquanto os outros 48% são nossos filhos. E emenda com a frase de efeito: O presidente Lula me deixou um legado, que é cuidar do povo brasileiro. Eu vou ser a mãe do povo.

Dilma tem algumas promessas e dados na ponta da língua, como os 24 milhões de pessoas que saíram da pobreza e os 31 milhões que ascenderam à classe média. E em quase todos os seus discursos proferidos, da pré-campanha até agora, existe a cobrança pela valorização do professorado.

Na garupa Quem acompanha com razoável rotina a segunda tentativa de José Serra de chegar ao Palácio do Planalto certamente constata que o candidato está um tanto popular nestas eleições. Há frases do tucano muito recorrentes, mas o que mais chama a atenção são as expressões ti-ti-ti e tro-ló-ló, bengalas sempre à mão. A primeira é utilizada para negar informações de crise com algum aliado. A última serve quase como sinônimo para conversa fiada.

Serra tenta colar a todo custo no eleitorado a imagem de que é um candidato de origem humilde. A intenção é aproximar a biografia à do presidente Lula. O tucano já citou pelo menos três vezes o baixo poder aquisitivo dos pais, sempre com as câmeras de TV focalizadas nas falas. Concorrer à Presidência é algo que me emociona. Vim de uma família de pais modestos. Entrei para a universidade e depois me envolvi na política. Isso me custou 14 anos de exílio.

Quando a intenção do tucano é criticar a adversária Dilma Rousseff, as frases tentam atribuir a ela uma incapacidade política sem a ajuda de Lula. Para isso, o cardápio de expressões é extenso, mas dá sinais de esgotamento. Primeiro, a referência era à imobilidade: A Dilma precisa começar a andar com as pernas dela. Durante a semana passada, a metáfora foi outra: O próximo presidente vai ter de governar e não pode ir na garupa.

O número 60 cidades Total de cidades que terão urnas com identificação de eleitores por impressões digitais

Origem humilde

Há uma semana, na bancada do Jornal Nacional, da Globo, Marina aproveitou a maior audiência de um telejornal brasileiro para reforçar aos eleitores seus problemas de saúde e sua condição de analfabeta até os 16 anos. É assim desde o início: por onde a candidata passa, o eleitor fica sabendo da origem humilde, do episódio em que foi considerada indigente na fila do hospital. Marina já chegou a contar que teve cinco dentes arrancados, contra sua vontade, aos 17 anos.

Lula, tão Silva quanto Marina, também é uma referência constante nos discursos da candidata. Eu vou ser sua sucessora e vou continuar como uma Silva comprometida com a história do povo sofrido, disse em Teresina (PI), em 18 de julho. Companheiros de partido de Marina reforçam sempre as mesmas histórias da candidata, suas origens e dificuldades. Isso está, inclusive, nas 30 razões para votar em Marina, presentes no site oficial da candidata. Conhecer a pobreza, ter sido alfabetizada aos 16 anos e ser mulher são algumas dessas razões. (VS, II e TP)

Sempre igual

Repertório de frases de efeito é o mesmo na campanha e resume as estratégias para a imagem de cada candidato