Título: Renda em alta causa preocupação
Autor: Villaverde,João
Fonte: Valor Econômico, 20/07/2011, Brasil, p. A4

O aumento de 4% no rendimento médio real dos trabalhadores em junho na comparação com mesmo mês de 2010 foi puxado por setores beneficiados com a melhora na distribuição de renda e o consequente aquecimento da economia. Na categoria outros serviços - que agrupa hotéis, transporte, limpeza urbana e serviços pessoais - o crescimento foi de 9,8%, igual ao registrado no rendimento de serviços domésticos.Segundo Fábio Romão, da LCA Consultores, a escassez de mão de obra explica o crescimento expressivo da renda nesse último setor, já que trabalhadores migraram para outras atividades, como serviços e comércio, com o objetivo de ter carteira assinada. "Enquanto o estoque de ocupados cresceu 3,5% em 2010 sobre 2009, o número total de pessoas que trabalham em serviços domésticos encolheu 2,4% no mesmo período", observa.

Já a expansão acima da média na renda dos trabalhadores de outros serviços é resultado do crescimento sustentável da economia entre os anos de 2004 e 2008, além da política de ganhos reais do salário mínimo e do controle da inflação, avalia. "A preservação do poder real de compra e a manutenção do crescimento da renda podem estar sustentando o crescimento nesse ramo de serviços". Romão nota que, apesar de ser composto por vários segmentos, o que tem maior peso nesse setor são os serviços pessoais, mais demandados com o aumento da renda.

Na outra ponta, o rendimento real dos empregados em serviços prestados a empresa, aluguéis, atividades imobiliárias e intermediação financeira caiu 3,5% em junho, frente mesmo mês do ano passado. Na construção civil, o crescimento foi de apenas 1,4%.

Para Romão, o primeiro setor, por ser relacionado a empresas, pode estar sentindo com mais força a desaceleração na atividade econômica atualmente em curso. O pequeno aumento no segundo, por sua vez, ocorre sobre alta base de comparação, já que em junho de 2010 a renda real da construção civil havia crescido 7,5% frente mesmo mês do ano anterior. Em igual período, o rendimento real médio havia subido 3,4%.

Rafael Bacciotti, da Tendências Consultoria, lembra que, nos 12 meses até maio, a massa salarial no setor de construção civil havia crescido 10%, frente expansão de 7,9% da massa salarial total. "O mercado imobiliário ainda está aquecido. Há uma resistência desses setores ao arrefecimento, e dessa forma a ocupação vem crescendo e a renda também", diz.

Os dois analistas concordam que o ritmo de avanço da renda continua forte e traz preocupações ao controle da inflação. "Ainda temos um cenário de risco, com a renda e a massa salarial crescendo em patamar elevado", diz Baccotti.

Para Romão, outros indicadores já dão sinais de desaceleração do mercado de trabalho, como o crescimento da população ocupada. Ela avançou 2,3% sobre mesmo mês de 2010, após aumento de 2,5% em maio na mesma base de comparação. A LCA esperava alta interanual de 2,7% em junho. Frente maio de 2011, o número de ocupados em junho caiu 0,18%. "Esse é um sinal de que a ocupação está perdendo fôlego, mas de qualquer modo, ainda há um grande poder de barganha dos trabalhadores."

Para o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Sérgio Mendonça a criação de postos de trabalho e a redução do desemprego não são mais os maiores desafios do mercado de trabalho. Na sua opinião, o país precisa dar prioridade a melhorias na qualidade dos empregos já existentes e nos salários pagos.

Segundo ele, 90% dos postos de trabalho criados no Brasil atualmente são formais. Contudo, essas vagas pagam até dois salários mínimos (R$ 1.090). Para melhorar a remuneração, ele diz que é fundamental que o país desenvolva setores econômicos que, tradicionalmente, remuneram bem, como a indústria, o setor financeiro e o de saúde. (Com Agência Brasil)