Título: Nó cambial pode tirar Grécia do euro
Autor: Ribeiro ,Alex
Fonte: Valor Econômico, 18/07/2011, Finanças, p. C1
A Europa caminha para conceder um alívio na dívida pública da Grécia em reunião nesta semana, mas outros problemas gigantescos já se avizinham mais adiante: como tirar o país da armadilha recessiva e corrigir a falta de competitividade de suas exportações sem abandonar a zona do euro - desfecho que representaria um duro golpe na união monetária criada há pouco mais de uma década.Na quinta-feira, líderes europeus se reúnem em Bruxelas para aprovar um plano de alívio da dívida pública grega com a participação do setor privado. Ainda há dúvidas se a Europa será capaz de fechar algo consistente até lá, por isso a Alemanha tentou adiar o encontro para evitar alimentar expectativas e levar a uma eventual frustração dos mercados financeiros.
Há uma semana, os ministros das Finanças da Europa admitiram, pela primeira vez, explorar "caminhos para reduzir o custo do serviço da dívida e maneiras de melhorar a sustentabilidade da dívida pública grega". Ou seja, diminuir, com a ajuda dos credores privados, a carga de juros e principal que a Grécia deve pagar.
"É algo que a Europa pode resolver, porque, no fundo, é uma questão que envolve apenas dinheiro, embora em quantia não insignificante", afirmou ao Valor o economista Uri Dadush, diretor do programa de economia internacional do Carnegie Endowment for Internacional Peace, um centro de estudos de Washington. "Mas isso não resolve o verdadeiro problema grego, que é a taxa de câmbio fora do lugar."
Hoje, o déficit em conta corrente da Grécia é de 9,5% do PIB e, para financiá-lo, o país depende de atrair capitais estrangeiros, um grande desafio em meio à atual crise de confiança. O problema foi criado depois que o país aderiu ao euro. A inflação e os salários subiram mais do que os países centrais da união monetária, reduzindo a competitividade das exportações.
Existem basicamente duas formas de corrigir o problema. Um deles é desvalorizar o câmbio, o que no caso da Grécia representaria abandonar o euro e reintroduzir a antiga moeda, a dracma. Outro caminho é deflacionar preços e salários.
A Grécia já vem fazendo isso. O Produto Interno Bruto (PIB) da Grécia encolheu 7,5% desde o pico observado em 2008, e taxa de desemprego superou 16% em março. Essa força recessiva fez com que os salários caíssem 6,8% nos 12 meses encerrados em março, embora por outro lado tenha reduzido a produtividade em 0,25%. Tudo considerado, a taxa real de câmbio se desvalorizou 6% em um ano.
Mas é muito esforço para pouco resultado. Os economistas raramente concordam sobre níveis ideais de câmbio, mas alguns deles, como Dadush, do Carnegie Endowment, arriscam dizer que a desvalorização deve ser entre 25% e 30%. "O único jeito de resolver isso é um longo período de deflação e queda de salários", afirma Dadush. "Não creio que seja factível." Ele acha que há grandes chances de a Grécia ser obrigada a deixar o euro.
Outros economistas, porém, tem-se mostrado confiantes em que a Europa vai achar uma solução para o problema cambial. Barry Eichengreen, professor da Universidade da Califórnia, em Berkeley, afirmou recentemente que o abandono do euro teria custos muitos altos para a Grécia e representaria "a mãe de todas as crises". Um dos problemas é que a dívida privada é denominada em euros.
"É algo que você não quer fazer, mas receio que a situação caminha para esse lado", afirma ao Valor o economista Desmont Lachman, do American Enterprise Institute (AEI), um centro de estudos de Washington. "Não vai ser algo agradável, será preciso um feriado bancário, e por enquanto a Europa não está se preocupando muito com esse risco."
A reunião de líderes europeus nesta semana reconhece algo que muitos economistas vinham alertando há algum tempo: a dívida pública grega é insustentável e pacotes de empréstimos com dinheiro da Europa e do Fundo Monetário Internacional (FMI) não resolvem o problema.
No ano passado, como condição para receber um pacote de socorro do FMI e da Europa, a Grécia fez um ajuste fiscal equivalente a 5% do Produto Interno Bruto. Apesar disso, o déficit nominal segue alto, em 10,5% do PIB. Os técnicos do FMI reconheceram em documento divulgado recentemente que o esforço fiscal é "impressionante" para um período recessivo.
Mesmo se a Grécia fizer todo o esforço fiscal combinado no pacote, porém, a dívida pública seguirá trajetória de alta por um bom tempo, prevê o FMI. Ela sairá dos atuais 143% do PIB para num pico de 173% do PIB em 2012, e só a partir de então recuará lentamente, chegando a 130% do PIB em 2020.
O desafio para os líderes europeus nesta semana será achar algum alívio que não seja caracterizado como default - e que passe sobretudo pelo crivo das agências de classificação de risco. Uma das opções na mesa é comprar a dívida grega em mercado com fundos de estabilidade financeira da Europa. Hoje, diante do risco de calote, os papéis são negociados com desconto.
O problema é que, quando aparecer um grande comprador no mercado, os preços tendem a subir.
Outra alternativa é fazer uma oferta pública abaixo do valor de face. É um jeito de evitar a alta dos preços no mercado, mas poderia ser caracterizado como um "default". Um terceiro grupo de alternativas envolve trocar os papéis atuais por outros, com juros menores, prazos maiores ou menor valor de face. Mas, de novo, o risco de a operação ser carimbada como default é grande.