Título: Fontes renováveis vão ganhar espaço no Brasil até 2020
Autor: Rockmann, Roberto
Fonte: Valor Econômico, 08/08/2011, Especial: Economia verde, p. F2

Perspectivas: O setor de energia terá de conciliar o aumento da oferta à redução da emissão de poluentes

Para o Valor, de São Paulo O desafio do setor energético no Brasil e no mundo nas próximas décadas será imenso: atender à crescente demanda por energia e reduzir as emissões de poluentes, para evitar os efeitos do aquecimento global. Até 2050, a população mundial deverá crescer 40% e chegar a 9 bilhões de pessoas. Cerca de 70% delas estarão em países que não pertencem à Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Boa parte do crescimento da demanda por energia será impulsionada pelas nações emergentes, como Brasil, Índia e China. Hoje, estima-se que cerca de 50% das emissões de poluentes se relacionam ao consumo de energia, 25% a processos industriais e os 25% restantes à área de transportes. Cerca de três quartos das emissões do setor de energia são provenientes das grandes cidades.No Brasil, o consumo per capita anual de energia elétrica está em 2.400 kWh, abaixo do apurado em países como Argentina e Chile, mas deverá crescer, impulsionado pela ascensão social. A expansão das classes C, D e E irá aumentar o consumo de eletrodomésticos. "Isso cria uma pressão extra. Para manter essa expansão sob controle, o Brasil e outros países que registram esse movimento precisam adotar políticas amplas de eficiência energética porque pode aumentar a compra de aparelhos mais baratos e menos eficientes. Ao mesmo tempo, será preciso investir em racionalização da energia e redução das emissões", diz José Luiz Alquéres, conselheiro da Fundação Brasileira de Desenvolvimento Sustentável. O Brasil convive com uma situação diferenciada. Cerca de 45% da sua matriz energética está calcada em fontes renováveis, enquanto nos países desenvolvidos esse número cai para 13%. "O Brasil vai se destacar como um grande produtor de petróleo, podendo ser um grande exportador, mas a matriz energética deverá continuar limpa, pois continuaremos a ter usinas eólicas, hidrelétricas e os carros bicombustíveis", afirma Mauricio Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Segundo o Plano Decenal 2020, elaborado pela EPE, o percentual de participação das fontes renováveis de energia (hidráulica, eólica, etanol, biomassa, entre outras) vai aumentar na matriz energética brasileira, passando dos atuais 44,8% para 46,3% em 2020. No caso do petróleo e derivados, deve haver uma diminuição da sua fatia, de 38% para 32% - a maior parte da oferta adicional será voltada para o mercado externo. No mercado interno, a expectativa é de a gasolina continuar a ser gradativamente substituída pelo etanol. Há obstáculos a serem superados para o setor de energia crescer e reduzir as emissões. Um deles está no segmento de etanol. No Brasil, há um veículo para cada 6,5 brasileiros. Em dez anos, estima-se a existência de um veículo para cada 3,5 brasileiros. "A demanda por álcool terá de quase triplicar, de 28 bilhões de litros para 73 bilhões de litros em 2020, em função do aumento da frota de carros bicombustíveis, que deve pular dos atuais 40% para 70%", diz Tolmasquim.

Em paralelo, o mercado externo deverá se abrir, com os Estados Unidos reduzindo as barreiras sobre o etanol brasileiro. Mas, para abastecer os mercados nacional e externo, será preciso destravar um novo ciclo de investimentos. Para os usineiros, o principal entrave para ampliação das usinas existentes ou construção de novas é o congelamento dos preços da gasolina. Enquanto os fabricantes de etanol têm de repassar variações de custo diariamente para as vendas, a gasolina está com o preço estabilizado nas refinarias desde 2008. Outro problema é a alta carga tributária, que inibe investimentos. Para serem sanados, esses problemas dependem da articulação entre o setor privado e o governo.

Outro desafio é a expansão da capacidade instalada de geração diante do aumento do consumo per capita com a ascensão social. O esforço envolverá agentes privados e as diversas esferas do governo - do Ministério de Minas e Energia, que define as políticas do segmento, à EPE, que planeja a expansão, à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que fiscaliza, chegando ao Ministério de Meio Ambiente, que concede o licenciamento ambiental dos projetos. Até 2020, a capacidade do sistema deve aumentar mais de 50%, chegando a 170 mil MW.

Com grande aproveitamento hidrelétrico, o Brasil ainda tem a avançar nessa fonte, que tem custo baixo de produção. Na hidrelétrica, a energia custa R$ 60 o MWh, enquanto o custo de uma eólica supera R$ 100 o MWh.

"O Ministério de Meio Ambiente, como gestor do futuro sustentável do país, tem uma posição cada vez mais complexa e que exige maior cautela com as decisões. Com o atraso no licenciamento das hidrelétricas desde o racionamento em 2001 e alguma lentidão nas eólicas e na biomassa, houve aumento da base térmica a gás ou óleo combustível, que passou de 4% de presença na matriz para 22%", diz Alquéres.