Título: Copom deve deixar porta aberta para cortar juro, diz Schwartsman
Autor: Bittencourt, Angela
Fonte: Valor Econômico, 12/08/2011, Finanças, p. C10

De São Paulo

A crise externa é grave. Não é apenas uma turbulência financeira, mas ainda não caracteriza uma crise bancária, capaz de justificar um imediato corte da taxa Selic pelo Banco Central (BC). O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, calcula que o Comitê de Política Monetária (Copom), na reunião do fim de agosto, deverá manter a taxa Selic inalterada em 12,50%, mas indicar a possibilidade de mudança na política monetária, caso a crise internacional comece a pesar na atividade interna. Em entrevista ao Valor, o economista avalia que o cenário atual certamente favorece quem não quer subir juro agora.Valor: Quais serão os próximos passos da política monetária no Brasil neste novo cenário que se formou?

Alexandre Schwartsman: Na próxima reunião, o Comitê de Política Monetária deve parar. Não deve promover nenhuma alteração na taxa Selic que permanecerá em 12,50%. E acredito que o Banco Central deve sinalizar ou dar a entender que, no cenário em que a crise internacional comece a pesar na atividade doméstica, haverá uma mudança na postura da política monetária. O BC deve abrir a possibilidade de cortar a taxa de juros.

Valor: A sinalização abriria o espaço para a queda do juro?

Schwartsman: Não acredito que seja tão imediato. Usando recursos de linguagem, o BC deverá ser genérico. Indicar que a política monetária vai estar sempre pronta para se adequar às circunstâncias. Mas desconfio que quando o Copom for para essa decisão [de corte da Selic] a diretoria do BC dará um peso grande para o cenário internacional porque é o peso do cenário externo que dará a justificativa para interromper o processo de alta do juro agora e botar um "hold" [manter] para acompanhar a evolução desse cenário.

Valor: Como podemos definir esse cenário?

Schwartsman: Temos um cenário internacional que não é só de turbulência financeira. É um cenário no qual estamos falando de economia americana praticamente parando. Não é de recessão, mas de atividade em queda importante. Em que pese o último relatório de emprego ter vindo um pouquinho melhor, o fato é que nos últimos três meses o mercado de trabalho esteve parado. O próprio Fed [Federal Reserve, o banco central americano] reconheceu a dificuldade de crescimento. O comunicado da última reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto mudou bastante. Há um novo cenário lá fora que sugere fraqueza na maior economia do mundo.

Valor: Esse cenário de fraqueza externa seria deflacionário para nós?

Schwartsman: Isso é o que o BC deve indicar. Há uma desaceleração lá fora e risco de contágio aqui. Por essa razão, não vou alterar o juro hoje, mas pode apontar que o cenário [externo] ficou ainda mais favorável. Mas acho difícil se montar um caso que justifique um corte de juro num prazo curto.

Valor: Você vê o corte do juro?

Schwartsman: Tem cenário que comporta corte. E é preciso considerar que o governo está ansioso para reduzir a taxa de juro. O BC não será tão explícito. Primeiro haverá a manutenção da taxa. Na outra reunião haverá outra discussão. E a outra reunião é só em outubro e, depois, em novembro. Então, será necessário esperar mais o final do ano para avaliar o que é possível fazer ou não. Não acredito que o BC vai se comprometer com corte de juro.

Valor: Nos últimos dias, os bancos estão apanhando lá fora. Estamos perto de uma crise bancária semelhante ao que vimos em 2008?

Schwartsman: Não, não. Com todas as complicações que este momento tem, não estamos nem perto do que ocorreu em 2008. Considerando alguns indicadores, que funcionam como termômetros, no pré-crise de 2008 esses indicadores superavam os níveis de hoje de quatro a seis vezes. Realmente, não parece que o mercado tem um problema de paralisia de crédito. Estou refletindo sobre isso, e para ter uma crise bancária é preciso ter um evento de crédito. Isto é, precisa ter alguém grande dizendo que não vai pagar. Em 2008, esse evento existiu. Aliás teve mais de um. Mas o grande evento foi o Lehman Brothers. Outras instituições não quebraram porque foram "salvas". Poderemos ter um problema num cenário em que um desses países europeus diga que não tem como pagar suas dívidas e o Banco Central Europeu afirmar que não aceitará como garantia de operações títulos que implicaram num default. Fora isso, a situação não parece tão complicada quanto 2008.

Valor: Podemos considerar que o governo brasileiro, na sua vontade de cortar juro, recebeu uma mãozinha externa?

Schwartsman: O cenário certamente favorece quem não tem vontade de subir juro agora.