Título: Dilma aprova 'custo x benefício' do Congresso
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 15/07/2011, Polítia, p. A10

Legislativo: Com aliados, presidente brinca que "nunca se aprovou tanto com tão pouco pagamento de emendas"

De Brasília

O elevado número de propostas que afetam diretamente interesses federativos, a proximidade das eleições municipais e as negociações sobre novas regras para a liberação de emendas parlamentares devem manter o clima de tensão entre o Legislativo e o Executivo no segundo semestre deste ano.Na pauta interna dos deputados e senadores está o debate sobre novas regras para o pagamento das emendas parlamentares. Os parlamentares não mais querem vivenciar o que consideram humilhação no primeiro semestre em torno da liberação de emendas e planejam forçar a mudança no processo.

A presidente Dilma Rousseff concorda. Em tom de brincadeira, no jantar com líderes partidários anteontem, disse, segundo um deles, que o Congresso "nunca aprovou tanto em um semestre com tão pouco pagamento de emendas".

Mas, como esperado, ela tem uma solução diferente. Enquanto o Congresso gostaria de implementar um calendário regular de liberações pré-estabelecidas, por exemplo, a cada três ou quatro meses, o Palácio gostaria de reduzi-las à metade ou estabelecer uma espécie de "cesta", pela qual o Executivo demonstra onde fará os investimentos anuais em cada Pasta e os parlamentares atrelam emendas a esses investimentos.

O problema é que hoje cada um tem direito a direcionar R$ 13 milhões a suas bases eleitorais, mas esse teto nunca é alcançado. O governo costuma fazer o empenho (compromisso de pagamento) de todo esse valor apenas para parlamentares considerados "de elite", como líderes de bancada, presidentes de comissões, relatores de medidas provisórias, articuladores do governo e dirigentes partidários. Para os demais, cria-se uma escala de pagamento de acordo com o partido, a situação (governo ou oposição) e o tempo de Casa. Ocorre que, neste ano, diante do ajuste fiscal, praticamente nada se empenhou ou foi pago, independentemente do prestígio do parlamentar. Esse cenário deflagrou um clima de ameaças e pressões que irritaram Dilma e causaram indignação dos parlamentares.

Ao final, Dilma acabou cedendo. Prorrogou os decretos dos restos a pagar e prometeu empenhar emendas a partir de setembro. Em troca, o Congresso não criou complicações de maior gravidade para o governo. Mas uma reformulação no sistema continua na pauta.

Mas é na agenda legislativa geral que reside a maior expectativa de tensão. A regulamentação da emenda constitucional 29, que trata do financiamento da saúde no país; a redistribuição dos royalties do petróleo; e a proposta de emenda constitucional nº 300, que institui um piso nacional para policiais de todo o país; e a reforma tributária são as pautas imediatas que já em agosto serão discutidas pelos parlamentares mediante a pressão de centenas de prefeitos e também dos governadores.

Em cada uma delas, há grandes divergências, tendo em vista que necessariamente envolvem remanejamento, perdas e ganhos de recursos financeiros para a União, Estados e municípios. Mais dos que isso, para as três primeiras o Planalto preferiria que sequer fossem pautados (PEC 300 e royalties) ou que a discussão se arrastasse por mais tempo (emenda 29).

"Chegou a hora de discutirmos essa questão federativa, dos recursos que devem ser alocados para a União, os Estados e os municípios. Até porque se conseguirmos uma maior municipalização dos recursos a necessidade de emendas para prefeitos diminuirá", disse ao Valor o líder do governo no Congresso, deputado Mendes Ribeiro Filho (PMDB-RS). "Talvez por esse debate cheguemos a um Orçamento mais realista", conclui.

Além desses assuntos, a agenda trabalhista também será retomada e junto dela a polêmica que trás consigo, como a redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas e o fim do fator previdenciário. A revisão deste até foi defendida ontem pelo presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS). "Precisamos chegar a um acordo para uma regra de transição do fator previdenciário. Sua simples manutenção não agrada mais a ninguém".

Sobre a perspectiva de crises entre o Executivo e o Legislativo no segundo semestre, ele entende que as mudanças na articulação política do governo aproximaram os dois poderes, além de a própria presidente ter percebido que há movimentos que é ela mesma que precisa fazer.

"Ela compreendeu que uma parcela da articulação precisa ser feita por ela, não pode delegar a ninguém". Ele cobra, porém, maior presença dos ministros no Congresso. "Isso é responsabilidade também de todo seu ministério, que precisa atuar mais politicamente, estar mais proximo das duas Casas."

No Senado, o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), disse que não colocará mais em votação medidas provisórias (MPs) que cheguem da Câmara com menos de dez dias da data do vencimento. O senador também estabeleceu o mês de agosto como prazo para o novo rito de tramitação das MPs no Congresso.

O entendimento com o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), estabelece 70 dias de apreciação de uma MP para a Câmara, 40 dias destinados ao Senado e, no caso de alteração no texto aprovado pelos deputados, a matéria retorna à Câmara para mais dez dias de análise das emendas. Hoje, a Constituição estabelece 120 dias para a análise de uma medida provisória pelo Congresso. Caso não seja aprovada nesse período, pelas duas Casas, ela perde a validade.

Quanto ao primeiro semestre de trabalhos legislativos, Sarney afirmou que houve "um período de adaptação" do Congresso ao estilo de governar de Dilma. Perguntado sobre as crises pelas quais o governo passou no primeiro semestre a partir de denúncias de corrupção, o senador destacou que "todas as crises foram no Executivo" e não passaram pelo Legislativo.