Título: Comunicação dá eficiência à política monetária do BC
Autor: Bittencourt, Angela
Fonte: Valor Econômico, 02/09/2011, Finanças, p. C9

A comunicação é quesito fundamental para a eficiência da política monetária dos bancos centrais que nem sempre, ou raramente, são portadores de boas notícias para a sociedade em geral e para os consumidores em particular. Sinal claro dessa premissa foi emitido há alguns meses pelo Federal Reserve (Fed), o banco central americano, que tomou a iniciativa inédita de conceder entrevistas após a reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto - instância máxima de deliberações sobre a política de juros na maior economia do mundo. O novo modelo de comunicação do Fed - mais similar ao do Banco Central Europeu (BCE) - diz muito sobre este momento de segunda onda da crise financeira de 2008.

A crise aumentou a exposição dos bancos centrais frente aos governos, aos organismos multilaterais, aos seus pares e aos contribuintes. Os intensos estímulos monetários promovidos para evitar um baque nas grandes economias num primeiro momento e, depois, ao redor do planeta, exigiram explicações. Na prática, a crise financeira, agora em novo round desencadeado com o rebaixamento da nota de crédito dos Estados Unidos, azeitou instrumentos de comunicação de decisões e políticas [monetária, cambial e de crédito] que foram estabelecidos com a adoção do regime de metas para a inflação.

No regime de metas, a política monetária está mais focada em perspectivas. E a transmissão dessa política também depende mais das expectativas que, por sua vez, exigem maior transparência na comunicação. A autonomia operacional dos BCs; a busca de maior eficiência da política monetária; e a redução do risco de vazamento das informações, para garantir a disseminação homogênea dessas informações, são algumas das razões para o aprofundamento da comunicação, relatam as economistas Maria Claudia Gutierrez, Katherine Hennings e Alzira Rosa Morais, do Banco Central do Brasil.

Especialistas no tema, elas alertam também para os limites da comunicação da política monetária, em trabalho elaborado em 2009. Um dos limites é a formação de preço de ativos no mercado; outro, é o cuidado necessário para não comprometer decisões e ações futuras do banco central; e um terceiro limite tem a ver com a credibilidade frente à transparência da instituição. Modelos matemáticos para avaliar o grau de transparência de BCs mostram que o Banco Central do Brasil tem índice de transparência de 12,5, numa escala máxima de 15 pontos, indicam as economistas.

Fabiana Rocha, professora da FEA/USP, confirma que o BC do Brasil é bem sucedido na sua comunicação. Focada no Comitê de Política Monetária (Copom), Fabiana desenvolveu um modelo econométrico para mensurar a efetividade dos comunicados e das atas do colegiado. "O índice é construído sobre a execução da política monetária e o comportamento da taxa de juros nos períodos seguintes às reuniões do Copom. E observamos que o índice traz associações positivas entre o comunicado e a variação dos juros. O que o BC indica nesses documentos é cumprido operacionalmente", afirma.

A economista da USP avalia que a sinalização eficiente da política monetária tem consequências positivas para o país e não só para o mercado financeiro. Uma boa sinalização leva os agentes a prever melhor as variáveis econômicas mais importantes. Isso diminui incertezas e incentiva, inclusive, investimentos produtivos no país.

"A partir dos anos 1990, com a adoção do regime de metas para a inflação, a comunicação dos BCs ganhou importância. No entanto, a comunicação é instrumento importante para qualquer regime que dê a um banco central capacidade discricionária. Se os bancos centrais estivessem sujeitos a uma regra, a comunicação teria importância menor porque a comunicação mais importante seria a da própria regra a ser seguida. Mas os BCs têm margem de manobra e, nesse sentido, uma comunicação mais bem feita ou mais clara diminui o custo da política monetária porque as expectativas serão mais bem formadas", explica a economista que também alerta para a polêmica que envolve o tema comunicação dos BCs. "Claro que a comunicação é positiva. Mas comunicação demais pode trazer resultados negativos porque ocorrem mudanças na economia que não são alcançadas pelos documentos das autoridades monetárias", diz Fabiana.

Monica de Bolle, professora da PUC-RJ e diretora da Casa das Garças, pondera que a comunicação é um elemento fundamental da boa condução da política monetária em geral, e dos regimes de metas para a inflação em particular. "Nesses regimes, a influência que os BCs exercem sobre a formação de expectativas é tão importante quanto a definição dos juros. Para isso, é preciso orientar os mercados por meio de documentos e análises oficiais - comunicados, atas e relatórios de inflação -, além de declarações das autoridades. Se a população e os formadores de preços entenderem o que o BC está fazendo, este já é um meio caminho andado para o controle da inflação."

Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do BC e atual chefe do Departamento Econômico da Confederação Nacional do Comércio (CNC), concorda que a concepção de transparência na comunicação dos BCs foi fundamental para o regime de metas, via canal de expectativas. Mas ele alerta que o cenário vem mudando. E que as incertezas aumentaram muito a partir de 2008. Os BCs não têm mais condição de administrar expectativas apenas com transparência. A realidade tornou-se mais volátil. "Novos instrumentos colocam os BCs em situações inusitadas. Recentemente, por exemplo, o BC do Brasil não conseguiu administrar as expectativas do mercado ao adotar medidas macroprudenciais visando risco e pressões no crédito."