Título: G-20 estuda estímulos para dívida local em emergentes
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 28/07/2011, Finanças, p. C8

De Genebra

O G-20, grupo das principais nações industrializadas e emergentes, pretende tomar iniciativas para estimular os mercados de títulos em moeda local (local currency bonds markets) em emergentes, com a finalidade de ajudar na gestão de fluxos enormes de capital.O Valor apurou que o grupo vai, na prática, dinamizar um mecanismo que o Banco Mundial vem desenvolvendo. Para o banco, um país com mercado de títulos locais sólido pode sofrer menos impacto nas reversões dos fluxos de capitais, tanto de entradas excessivas como de saídas repentinas. A intenção é aumentar o volume e alongar os prazos de emissões dos títulos, adotar políticas de esterilização de fluxos de capital que não sejam obstáculos para a eficiência dos mercados locais, e estimular a diversificação da base de investidores com ênfase em instituições não bancárias.

A iniciativa surgiu no G-20 durante discussão sobre a gestão dos fluxos de capitais, em que um dos temas de divergências têm sido o controle de capitais. Interessa mais a alguns países de renda média. Mas o Brasil, que está impondo controle de capital e taxando o investimento externo em renda fixa com IOF - e que ontem criou um pedágio para posições vendidas em dólar no mercado de derivativos - é cauteloso.

"O desenvolvimento de mercados locais é importante, mas não é solução mágica para o problema de fluxos excessivos de capital", afirma o secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, Carlos Márcio Cozendey. "Em certos casos, pode até incentivar mais entrada de capital, porque se o país tem um mercado mais sólido e mais líquido pode atrair mais fluxos."

Na mesma linha, um importante economista de organização internacional, que prefere não ter seu nome citado, diz que a iniciativa num momento de enormes fluxos de capitais isso pode estimular o capital especulativo para os emergentes, em vez de combatê-lo.

Já o Banco Mundial, em apresentação no G-20, comparou a iniciativa a um pneu sobressalente para ajudar países contra reversão nos fluxos de capital. Avalia que um mercado sólido ajuda a reduzir a exposição dos emergentes a choques cambiais, facilitando o uso do câmbio como instrumento de gestão macroeconômica, melhorando a eficácia da política monetária e reduzindo a dependência em relação ao setor bancário.

No rastro das crises financeiras no fim de 1990, houve progressos no desenvolvimento de mercados de títulos em moedas locais em países em desenvolvimento, crescendo de US$ 1,4 trilhão em 1997 para US$ 6,5 trilhões em 2007, segundo o Banco Mundial. Os países da Ásia representam 55,4% do valor total desses mercados, mas a América Latina tem mostrado o mais forte desenvolvimento com sua fatia de títulos de títulos locais aumentando de 51% em 2001 para 72% em 2008.

No entanto, o Banco Mundial considera que, apesar desse forte crescimento, a escassez de instrumentos líquidos em mercados emergentes, incluindo os bônus em moeda local, contribuem para o desequilíbrio global. Como resultado dessa escassez, o crescimento da riqueza nos emergentes conduz a um fluxo de capital para mercados desenvolvidos, sobretudo para os EUA, ajudando na manutenção de juros baixos nesses mercados e alimentando bolhas de ativos. De outro lado, acha ser provável que a existência de mercados importantes nos emergentes possa ter tido um papel em absorver crescente poupança global e assegurar uma distribuição mais eficiente do capital global.

Pela iniciativa que os chefes de Estado e de governo vão lançar na cúpula de Cannes, em novembro, os países do G-20 vão começar apoiando serviços de assessoria para mais nações desenvolverem seus mercados de títulos em moeda local. Vão também melhorar estatísticas, fazer avaliações anuais, etc.

Serão focados dois tipos de países: os emergentes que estão recebendo os maiores fluxos e são mais vulneráveis a súbitas interrupções desses capitais. E alguns países em desenvolvimento de renda menor com condições macroeconômicas para desenvolver mercados locais de títulos.

Não está em discussão no G-20, pelo menos no momento, a criação de fundo para comprar bônus em moedas locais, como ocorre na Ásia. Em 2009, também os bancos centrais do Brasil, Argentina, México e Chile estudaram a criação do Latin American Bond Fund, com o respaldo do Banco de Compensações Internacionais (BIS). A ideia era utilizar pequena parte das reservas internacionais para montar o fundo e dar mais garantias ao investidores nos quatro mercados, ampliando a liquidez. O projeto acabou engavetado em meio a divergências entre o Brasil e a Argentina.